A história (pouco conhecida) do Grigri

A história do grigri se confunde com a da própria escalada. Desde que a escalada esportiva se consolidou como modalidade popular, o equipamento da empresa francesa Petzl se tornou praticamente onipresente em academias de escalada e mochila de escaladores.

Não há um escalador na face da terra que não saiba da existência desse equipamento e, com raras exceções, não o tenha usado. O grigri é cercado de muita controvérsia, preconceito (especialmente de quem não sabe usá-lo) e críticas. Até mesmo o seu nome é cercado de desinformação por parte dos escaladores.

Mas apesar da gritaria dos críticos, a empresa que o criou aproveita até os dias de hoje as glórias e lucros de ter desenvolvido um equipamento que mudou a história do próprio esporte. Sem nenhum exagero, a criação do grigri impactou a escalada na mesma proporção de que a Adidas impactou o futebol com uma bola com gomos hexagonais em preto e branco.

Não somente o grigri, mas a empresa francesa é a mais influente dos esportes de montanha. Sim, porque poucos sabem, mas a Petzl foi quem inventou a chapeleta, o grigri e as headlamps. Atualmente é impossível imaginar o esporte outdoor sem estas três invenções.

A origem do nome possui versões bizarras que foram propagadas por escaladores. Algumas afirmavam que cabaças de pênis dos nativos da Papua Indonésia Ocidental e da Nova Guiné e das práticas masturbatórias daí decorrentes (o que obviamente não é verdade).

Petzl e a escalada

A história da empresa Petzl foi contada em detalhes no artigo “História das marcas: Petzl“. Fundada por Fernand Petzl no início do século XX, originalmente era uma empresa focada principalmente em equipamentos de espeleologia, mas na década de 1960, mudou sua atenção para outras áreas.

Por volta de 1977, a empresa começou a olhar mais para a escalada. Nesta época adaptou alguns equipamentos de espeleologia e produziu a primeira cadeirinha para escalada da história. Antes, eram usadas adaptações com cordas e fitas.

Para ajudar na transição, Petzl recrutou o montanhista e inventor Jean Louis Rocourt como consultor técnico e, em 1985, o renomado alpinista Michel Suhubiette se juntou à equipe como seu representante em Verdon Gorge.

Já fabricando equipamentos para escaladores, a Petzl começou a vislumbrar que para ser líder de mercado deveria também inovar e criar algo revolucionário. Na época a equipe da empresa estava tentando descobrir como fornecer aos escaladores um dispositivo de segurança tão confiável quanto um cinto de segurança.

Paul, Fernand, Peter e Michel Suhubiette estavam trabalhando na solução de um freio autoblocante, com a ajuda do primeiro engenheiro já contratado pela empresa: Alain Maurice, que mal tinha 25 anos de idade. A ideia vinha de um projeto do próprio Ferdinand Petzl, que era o descensor auto-blocante que criou dez anos antes.

Reunir todas as suas grandes ideias rendeu frutos. Paul, brincando com o STOP, um descensor com freio automático e descobriu que o dispositivo travou na corda durante quedas simuladas. Fernand, por sua vez, lembrou-se do SOLO, dispositivo inventado alguns anos antes por Jean-Louis Rocourt para autossegurar escaladas m solitário. Eles só precisaram usar os pontos fortes de cada um desses projetos.

Aos poucos, o dispositivo foi tomando forma. O plástico foi escolhido para o cabo, apresentando um desafio técnico, mas garantindo um manuseio mais confortável pelos usuários. A equipe também precisava garantir que a corda seria passada corretamente pelo dispositivo: pictogramas foram gravados no dispositivo explicando como fazer isso e uma placa giratória cobriu-o uma vez no lugar. Eles até trabalharam com um designer para garantir que o objeto fosse amigável aos dedos.

Assim, a única coisa que faltava, depois de vários protótipos, já chegaram na versão final do ‘dispositivo de segurança com freio assistido’, pronto para ser lançado no final de 1991. Durante uma reunião, Michel Suhubiette apareceu e perguntou: “Então, chegaram a algum lugar com o seu grigri?”. Assim foi batizado o Grigri, em 1991.

O equipamento foi projetado para uma corda de 10 a 11 mm, mas com a evolução da escalada esportiva, também evoluiu a preferência pelas cordas de 9 mm. O Grigri2 foi lançado em 2011, e com ele vieram várias modificações funcionais.

Mas por que ‘grigri’?

O termo ‘grigri’ tem origem na religião Vudu, que tem as suas origens em África e que se foi desenvolvendo a partir do contato com o cristianismo dos escravos que eram trasladados para a Europa e para a América. A religião confere alma a objetos e conta com divindades.

Dentre o conjunto de objetos que possuíam alma, existe o gris-gris, que eram talismãs mantidos para a boa sorte ou para afastar o mal. Originalmente eram bonecos ou imagens dos deuses. Atualmente a maioria dos gris-gris são pequenos sacos de tecido contendo ervas, óleos, pedras, pequenos ossos, cabelos e unhas, pedaços de tecido encharcados de suor e/ou outros itens pessoais recolhidos sob as instruções de um deus para a proteção do proprietário.

Levado por escravos para a América, faz parte do imaginário mágico africano originário dos iorubás (uma das maiores etnias do continente africano em termos populacionais) e hauçás (povo do Sael africano ocidental). O objeto acinzentado possui o jùjú, a propriedade mágica e o encantamento.

O gris-gris teve origem no Dagomba, no Gana, e foi associado às tradições islâmicas. Originalmente eram adornados com escrituras islâmicas e usados para afastar espíritos malignos ou má sorte. Os historiadores da época notaram que eram frequentemente usados por não-crentes e crentes, e também encontrados presos a prédios.

A origem da palavra gris-gris não é clara. Mas alguns estudiosos atribuem a isso à propriedade mágica jùjú, o nome da África Ocidental para fetiche, ou objeto sagrado. Jùjú pode ser uma tradução europeia para a expressão grou-grou (daí gis-gris). Ou pode se referir à palavra francesa joujou, que significa “boneca” ou “brinquedo”.

É bem possível que o viajante pelo Sahel e pelo Golfo da Guiné receba um gris-gris para protegê-lo do azar, já que na África ainda faz parte das tradições. É uma pequena bolsa de tecido ou couro que se deve levar consigo, na qual há uma mistura de ervas, óleos, pedras, ossos, cabelos, unhas e outros elementos pessoais, reunidos com a bênção de um deus.

De acordo com uma pesquisa de 1982, os gris-gris eram um dos três principais métodos de contracepção conhecidos pelas mulheres no Senegal.

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