Seguindo a série de entrevistas com as referências da escalada brasileira em termos comerciais, hoje é publicado a entrevista com os mantenedores do “Abrigo Cipó”.
A proprietária e uma das pessoas que administram o abrigo, Rafaela Discaciati gentilmente concedeu entrevista e falou um pouco sobre o abrigo, e em como é trabalhar nesta área.
O abrigo de escaladores e trekkers que vão constantemente para a Serra do Cipó é referência hoje no estado de Minas Gerias em termos de conforto, organização e até mesmo de identidade visual com o local.
Quem não conhece a Serra do Cipó, deveria conhecer.
Foram convidados a cederem entrevistas as principais marcas, revistas e escolas de escalada.
A primeira entrevista foi com o criador da Conquista Montanhismo – Edemilson Padilha
Para se ter mais informações sobre o Abrigo Cipó, funcionamento, preços e outros assuntos acesse: http://www.abrigocipo.com.br/
Leia abaixo a entrevista com Rafaela Discaciati que fala um pouco do abrigo e como foi todo o processo de criação do abrigo:
1 – O “Abrigo Cipó” é um excelente exemplo de sucesso em abrigo feito por escaladores na Serra do Cipó. Qual o segredo?
É sim um sucesso graças ao bom trabalho que fazemos sempre de receptividade e marketing!
Além disso, prezamos sempre ao conforto de nossos hóspedes e tentamos deixar as pessoas se sentindo “em casa”, já que moramos aqui e o Abrigo além de comercial tem um ar de “caseiro”.
2 – Como surgiu a idéia de criar um abrigo na Serra do Cipó?
Era um sonho antigo…
Quando eu, Rafaela, comecei a escalar tive essa idéia com uma amiga minha escaladora, a Claudinha…
na época eu era muito nova e não tinha ainda uma independência financeira…
Esse sonho ficou guardadinho e na hora certa foi concretizado.
Eu estava trabalhando em um escritório de arquitetura, era assistente de uma arquiteta renomada no Rio de Janeiro e aprendi muito nesse trabalho já que ficava por conta de obras, detalhamentos, atendimento a clientes, etc…
Depois de dois anos comecei a trabalhar pra ela em casa, ainda com obras e projetos…
Como tinha mais tempo para pensar comecei a querer ter algo meu, trabalhar pra mim mesma e na minha terra, Minas Gerais.Depois de passar um feriado com meu marido, Barão, aqui no Cipó, procuramos uma terra e comecei a projetar nossa casa e o Abrigo, que antes iria ser um restaurante de comida natural para os escaladores.
Fazendo uma pesquisa, vimos que mexer com alimentos era mais complicado do que imaginávamos…
Daí então o Abrigo Cipó, que a princípio iria ser apenas um alojamento com beliches e depois a idéia de pequenos chalés, já que gostaríamos de atender a outro público também (trekkers, bikers, e eco-turistas) não descartando a idéia de um pequeno alojamento que temos hoje aqui para cinco pessoas, além dos chalés para casais e famílias que estão em construção.
3 – Como foi o processo de construção? Houve algum estudo arquitetônico e de decoração?
O processo de construção foi em cima do que tínhamos para investir mas sem economizar em conforto e sustentabilidade.
Houve um estudo sim e priorizamos aos materiais reciclados como madeiras, marcos de portas e janelas, adobe (tijolo artesanal), dentre outros.
Tudo foi escolhido a dedo.
Como já mencionei, o projeto foi modificado e de um alojamento partiu para chalés…
Esse projeto foi todo aprovado na Prefeitura aqui da Serra do Cipó, com assinatura da arquiteta Marcella Romanelli, já que não sou arquiteta, e sim Designer de Interiores, tive que contar com a ajuda da Má por não poder assinar a um projeto construtivo…
A criação foi toda minha e do Barão, ela fez apenas os consertos necessários em telhados e outros que eu não havia estudado na faculdade e assinou por mim.4 – Como é administrar uma pousada que recebe tanto escaladores como “eco-turistas”? Há muitas histórias interessantes?
É muito gostoso trabalhar aqui no Abrigo e nosso público é o melhor que existe, são independentes, amantes da natureza, na maioria muito educados e admiram nosso trabalho sempre, o que nos motiva muito a crescer e melhorar o Abrigo a cada dia.
Histórias interessantes?
Sim, sempre conhecemos novas pessoas e nos envolvemos com as pessoas que nos dão essa liberdade, apesar de sermos muito discretos àqueles que preferem ficar mais reservados.
5 – Quais são os tipos de serviços, além da hospedagem, que o Abrigo Cipó realiza?
Graças ao nosso trabalho e dedicação o Abrigo Cipó se tornou uma empresa, e além de hospedagem, conta também com a venda de equipamentos para atividades em altura, serviços de podas de árvores, caminhadas e escaladas guiadas para turistas que se hospedam aqui com serviço de fotografia à parte.
Todos esses trabalhos são feitos por nós mesmos, além de limpeza, manutenção, café da manhã, parte burocrática e financeira do Abrigo Cipó.
6 – Vocês recentemente saíram de férias, como ficou o Abrigo Cipó durante a ausência dos proprietários?
Tiramos férias de um mês e achamos melhor deixar o Abrigo fechado, apenas com uma pessoa morando aqui cuidando da casa, cães e plantas…
Preferimos assim, pois, já que íamos tirar férias não queríamos ter preocupação…
Acho que não conseguiríamos treinar alguém para fazer tudo que fazemos e manter o padrão e conceito que tanto prezamos…
7 – Em algumas localidades do Brasil (e até mesmo no Exterior, como na Argentina) há escaladores brasileiros que por péssimo comportamento contribuem para o fechamento de alguns locais de escalada. Como vocês visualizam este problema? Há incidentes assim na Serra do Cipó?
Mau comportamento é um péssimo hábito da natureza do ser humano, independente de classe social, cultura, região, etc…
Conhecemos vários montanhistas que dão um show de comportamento ético em qualquer lugar que freqüentem.
Cabe a nós orientar e sempre ensinar e divulgar regras locais de comportamento de mínimo impacto e educação em trilhas e setores de escalada para aqueles que não às conhecem ou negligenciam…
Divulgar e sempre respeitar locais que estejam fechados para escalada ou outras atividades, para não atrasar e atrapalhar o processo de reabertura dos mesmos.
Isso é o mínimo que podemos fazer.8 – Comparando a Serra do Cipó há 10 anos, com o que há hoje, mudou-se e urbanizou-se muito. Qual a sua previsão de que esteja o local daqui mais 10 anos?
Achamos que está acontecendo um crescimento organizado.
Hoje podemos contar com o ICMbio (antigo IBAMA) que rege todo esse lado de regras ambientais da região, tanto da área que abrange o Parque Nacional da Serra do Cipó, bem como a área do entorno do Parque, em que estamos situados, e também a APA Morro da Pedreira (onde ficam os principais setores de escalada).
E o mais importante é que todas as legislações ambientais e de urbanização são respeitadas, quase sempre, um exemplo disso, é o controle às remoções de árvores quando se vai construir, principalmente as nativas, distanciamento de rios, etc…
Isso é fiscalizado pela prefeitura em parceria com o ICMbio, e se essas regras não são respeitadas pode-se até embargar uma obra (residencial ou comercial).
Se depender das pessoas que estão trabalhando para essa organização o crescimento continuará organizado, apesar de mais urbanizado, o que é inevitável…
9 – A Serra do Cipó é considerada, com toda a justiça, a Meca da escalada brasileira, porém não há um grande evento de escalada ocorrendo por aí (Como Ubatubouler, ou a ATM do RJ). Você acredita que seria possível realizar um encontro aí, ou seria inviável por causa da quantidade de escaladores que iria visitar o local?
Qualquer tipo de evento, se for bem organizado com um estudo da quantidade de visitantes que comparecerão ao evento, o impacto gerado e as atividades que serão feitas e os mesmos forem apresentados aos órgãos ambientais responsáveis isso seria com certeza viável sim…
10 – Um visitante interessado em ir ao Abrigo Cipó, o que ele poderia, e deveria esperar de sua hospedagem e do local?
Recebemos pessoas de todo mundo aqui no Abrigo Cipó e achamos que estamos bem preparados pra isso mas sempre pensando em melhorar…
Viajar para conhecer outros abrigos e refúgios é muito importante, ver como funciona tudo, desde hospedagem a manutenção do local.
Observamos que os Abrigos devem ter um conceito diferente das pousadas, sendo que o próprio nome já diz Abrigo= proteção da chuva, do perigo, do frio, etc…
Buscamos isso, sempre proporcionar o conforto aos nossos visitantes.
Aqui é nossa fábrica de fazer amigos e de trocar conhecimentos.
O Abrigo Cipó conta o apoio das empresas Verticale www.verticale.com.br (representante da La Sportiva, Edelweiss, Camp e Cassin) e Proativa WWW.proativa21.com.br (representante da Deuter)
Formado em Engenharia Civil e Ciências da Computação, começou a escalar em 2001 e escalou no Brasil, Áustria, EUA, Espanha, Argentina e Chile. Já viajou de mochilão pelo Brasil, EUA, Áustria, República Tcheca, República Eslovaca, Hungria, Eslovênia, Itália, Argentina, Chile, Espanha, Uruguai, Paraguai, Holanda, Alemanha, México e Canadá. Realizou o Caminho de Santiago, percorrendo seus 777 km em 28 dias. Em 2018 foi o único latino-americano a cobrir a estreia da escalada nos Jogos Olímpicos da Juventude e tornou-se o primeiro cronista esportivo sobre escalada do Jornal esportivo Lance! e Rádio Poliesportiva.