Crítica do filme “Up to Speed”

Quando a escalada esportiva foi promovida a esporte olímpico (ao menos para os Jogos de Tóquio 2020), todos pularam de emoção quando escutaram a notícia. Mas poucos prestaram atenção que, no momento do anúncio, foi dito que seria em um formato de três modalidades. Muitos pensaram que seria uma brincadeira a inclusão de velocidade, que é a modalidade mais odiada por todos os competidores das disciplinas, digamos, mais conhecidas. A modalidade sequer era levada a sério que, até bem pouco atrás, sequer tinha paredes para a prática na América e em vários lugares do mundo.

Quando foi anunciada que a modalidade teria um peso considerável na classificação dos “escaladores olímpicos”, reclamações invadiram as redes sociais e as mídias tradicionais. Especialmente por parte de atletas que eram cotados como favoritos a ganhar medalhas em Tóquio. Como poderia uma modalidade, que aos olhos de todos que praticam a escalada, nada teria a ver com o espírito do esporte participar da Olimpíada? Esta e outras perguntas ainda são feitas diariamente. Mas, da mesma maneira que se obtém uma nota baixa na escola, é necessário engolir o choro e treinar duro para que a deficiência nesta modalidade seja minimizada. Assim pensam os verdadeiros atletas.

Mas, olhando por um outro prisma, como se sentiram os que se dedicam a esta modalidade tão odiada? Alguém pensou na excitação por parte desta minoria que era, ao menos nos bastidores, ridicularizada por competir em algo que parecia, segundo os críticos, muito mais circo do que propriamente escalada. Não deveria ser a escalada, um esporte agregador, democrático, puro e livre de preconceitos? Sim, criticar a escalada de velocidade como algo “menor”, é possuir opinião ou sentimento concebido sem exame crítico. Ou seja, a definição pura e cristalina de preconceito.

Dando o primeiro passo, o diretor Zachary Barr, que trabalha para a Sender Films como produtor, resolveu dar o primeiro passo para entender melhor o esporte. Este primeiro passo foi realizar o filme “Up to Speed”, com o objetivo de acalmar a comunidade de escalada de sentimentos hostis, assumidos em consequência da generalização apressada. O filme é um retrato divertido e bem direto do que é a escalada de velocidade e quem são as pessoas que dedicam a sua vida de atleta a ela. Apesar de não ser abordado no filme, muitos jornalistas (alguns brasileiros, inclusive) criticaram a inclusão da escalada, além dos outros esportes que irão estrear em 2020. No Brasil a crítica foi dura, intitulando a escolha como uma “bizarrice”.

A produção inicia de maneira bem-humorada, mas bastante neutra a respeito da escalada esportiva. O desejo do diretor é claramente despir o expectador de preconceito e convocar a um melhor entendimento. Claramente partindo do ponto de que todos temos preconceitos, em maior ou menor grau, Zachary Barr começa bem didático e, inclusive, confessa ele mesmo ser resistente com a modalidade. Desta maneira, vai mostrando os detalhes, as regras, os detalhes que permeiam a modalidade.

Ao mostrar os primeiros atletas, as dificuldades de quem possui a escalada de velocidade como desafio, como é o caso de Adam Ondra, qualquer expectador começa a entender que a modalidade é também entretenimento. Parte de um esporte fazer parte de uma Olimpíada é ele ser visto como entretenimento. E é neste detalhe que o filme engole o expectador.

Após construído todo o cenário e personagens são apresentados, e é neste ponto que o diretor apela para a empatia. Pois os personagens retratados, são escaladores como todos os outros que praticam a modalidade. Portanto, assim como alguns escolhem boulder, outros vias guiadas, por que não escolher velocidade? Afinal, estas mesmas pessoas que escolhem velocidade, como sua modalidade de competição, possuem sonhos, desenhos e rotinas de treinamento rígidas. Atletas como Claire Buhrfeind, Reza Alipour, John Brosler, Aries Susanti Rahayu, Max Hammer e Stanislav Kokorin, também sonham com medalhas olímpicas.

Todos estes atletas são, de certo modo, estrelas nesta disciplina. Todos, mesmo que à sua maneira particular, querem brilhar como um Adam Ondra ou Janja Garnbret. Inegavelmente esta abordagem mais madura, com um tom bastante conciliador, faz de “Up to Speed” um filme de escalada com um tom muito diplomático. Pois, deixa entender a produção, este período pré-olimpíada seria o momento de todos os escaladores pararem com as críticas e aceitarem o formato olímpico. Afinal, com o esporte tento o devido sucesso e aceitação com o público, é a própria comunidade que sairia ganhando.

“Up to Speed” é talvez a produção com o tom mais conciliatório da historia da Sender Filmes, que é a produtora do filme, e um dos mais simpáticos sobre a escalada olímpica já realizado. Apesar de ter esquecido de mencionar no filme, a própria modalidade de escalada em ginásios sofreu resistência da comunidade, quando ganhou popularidade e tornou-se um esporte propriamente dito.

Até os dias de hoje, há quem condene, com todas as forças, a escalada de competição, amaldiçoando os ginásios e quem os frequenta. Mas em uma época que existe grande visibilidade, com filmes sobre o esporte ganhando indicações para o Oscar, experimentando a iminência de um interesse sem precedentes pela modalidade e todas as disciplinas, não seria o momento de largarmos os purismos, despir-nos do preconceito e aceitar o fato de que a escalada de velocidade faz parte do esporte?

É exatamente esta postura que Zachary Barr, um fanático escalador de vias tradicionais, tenta introduzir em seu filme, com um olhar que se destaca pela maturidade e pela sobriedade que tratou um tema recente, mas não menos espinhoso. “Up to Speed” é, antes de ser apenas um filme sobre escalada de competição, um convite à perda de preconceito e imaturidade. Se irá conseguir, é bem difícil de dizer, mas ao menos é um primeiro passo.

Nota Revista Blog de Escalada:

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