Universo de vaidosos: Como o ego afeta a sua escalada e a sua personalidade?

O ego inflado: dentro do universo da escalada é inegável que há muitos, mas muitos mesmo, com esta característica. Exemplos não faltam e são perceptíveis pela postura de arrogância, insolência e presunção em relação aos outros praticantes e ao próprio esporte. É tão explícito este tipo de empáfia, que ela exacerba em grande parte dos praticantes o efeito Dunning-Kruger (também conhecido como síndrome de superioridade ilusória).

Mas, afinal, o que é ego? Voltando a 1923, o psiquiatra Sigmund Freud (1856-1939) mostrou no artigo “O Ego e o Id”, que explicava a teoria das três estruturas do aparelho mental (Id, Ego e Superego), as chamadas estruturas psíquicas. Consideradas inovadoras, suas teorias chocaram a sociedade da época. Há quase 100 anos atrás a sociedade foi instigada a pensar mais sobre si mesma e sobre o modo que pensa.

O que é ego?

Ego

Sigmund Freud

Por definição o Ego designa na teoria psicanalítica uma das três estruturas do modelo triádico do aparelho psíquico do ser humano: Id, Ego e Superego.

  • Id: Abrange todas as vontades mais primitivas do ser humano. Nesse setor, a pessoa pode vivencia emoções relacionadas à libido, paixão e agressividade.
  • Superego: Espécie de escudo contra os desejos construídos pelo Id. Setor associado à ética e à moral, que vai lembrar ao indivíduo qual é o tipo de sociedade em que está inserido, determinando se a ação é adequada ou não.
  • Ego: É o meio termo entre o Id e o Superego, é o setor da estrutura psíquica que funciona como um momento de profunda reflexão individual. O ego diz respeito ao princípio da realidade, funcionando como o centro da consciência. Cumpre a função de lidar com a realidade externa e fazer o meio campo entre o mundo interno e externo.

Na estrutura formulada por Sigmund Freud, o ego é também reconhecido popularmente como a imagem que formamos de nós mesmos. Quando nos referimos a alguém como egocêntrico, identificamos uma pessoa que supervaloriza o seu próprio ego, criando uma imagem de si mesma, que beira o exagero.

Ego

Nosso ego é, portanto, uma falsa identidade que criamos para nós mesmos e que depende de como as outras pessoas nos veem. O principal problema com o ego é que, por ser uma identidade falsa que criamos para nós mesmos, tememos que essa identidade seja desafiada.

O ego está tão preocupado com a forma como é percebido, que ele teme qualquer coisa que possa provar que é algo ‘menor’ do que a identidade que criou. O medo do fracasso, medo do desconhecimento, medo da ignorância e o medo do julgamento são as raízes de nossos egos.

Como reação instintiva, principalmente quando não possui argumentos, o ego desafiado apela para a falácia ad hominem, que é atacar o interlocutor, em vez de refutar suas ideias com argumentos. O termo em latim pode parecer complicado, mas é a tática mais comum de pessoas com o ego ferido quando comentam em redes sociais, especialmente em grupos de WhatsApp.

Como afeta sua escalada?

Ego

Na escalada, assim como no montanhismo em geral, o indivíduo é desafiado todo o tempo. Para cada tarefa realizada, já há uma cobrança, interna e externa, de que a próxima tenha de ser mais difícil, mais longa e mais rápida. Este tipo de pressão faz com que alguém que acabe de cumprir um desafio, acabe tomando a defesa agressiva de proteger seu feito.

É esse medo de ser desafiado e questionado que permite ao ego afetar negativamente a escalada de qualquer atleta. Pois é perceptível que todo (a) escalador (a) não gosta de ter a percepção idealizada de si mesmo desafiada. Em última análise, é fácil não sair de sua zona de conforto por temer o fracasso. Nesse ponto nascem os sedentários culturais e esportivos.

  • Sedentário cultural: É a pessoa que possui resistência a provar de tudo que esteja fora de seu círculo social e cultural. Comidas, músicas, locais, filmes, análises e pessoas que pensam diferente daquilo que ele idealizou como o normal. Alguém que só consegue comer arroz com feijão, não assiste filmes em outros idiomas, não gosta de escalar em outros lugares, possuem resistência em visitar outros países, etc, são exemplos clássicos de sedentários culturais.
  • Sedentário esportivo: É o praticante que somente acredita que seu esporte, ou sua modalidade e estilo, é aquele que deva ser praticado e que todos os outros são inferiores ou ruins. Alguém que acredita que um praticante de uma modalidade diferente, ou que possui técnica diferente ou mesmo um equipamento diferente, que denigre quem realiza algo ‘fácil’, etc, são exemplos clássicos de sedentários esportivos.

Permitir que o ego afete a si mesmo dessa forma é extremamente limitante, tanto no presente quanto em termos do desenvolvimento futuro como montanhista e escalador. Mas, infelizmente, este comportamento é visto recorrentemente em uma grande parcela dos praticantes de esportes de montanha.

Gerenciando o ego

Ego

Foto: http://dailymail.co.uk

Observando o comportamento por meio das redes sociais é possível ver que poucas pessoas que praticam atividades na montanha, especialmente aqueles que possui uma certa experiência (ou mesmo relativo destaque na sua bolha social) não sabem gerenciar o ego e em como ele se manifesta.

O ego do escalador e montanhista se manifesta dar formas mais tóxicas, ainda mais porque na internet é o lugar mais fácil para espalhar sobre conhecimento e realizações (ou criticar os outros por sua falta). Especialmente quando há o tribunal dos “especialistas a respeito de assuntos que sabem apenas superficialmente”.

A este ponto é necessário que a cada explosão de ódio, ou faniquito por alguém que pensa diferente, deve servir de reflexão: Por que escaladores e montanhistas se comportam dessa maneira, quando é claramente contraproducente? Por causa do medo e resistência à mudança.

Como a escalada e montanhismo é um esporte individualista, essas explosões de ego tendem a ser comuns. Com muita frequência, cada escalador (a) vincula seu valor próprio às suas realizações e quando outras pessoas desafiam seu conhecimento ou competência, suas mais profundas inseguranças aparecem com tudo.

Mas convenhamos, gerenciar seu ego não é fácil. Como a maioria das mudanças mentais na escalada, este gerenciamento exige um trabalho consistente e deliberado. Mas para isso, é preciso um desejo do escalador parar com o círculo vicioso que existe no esporte de que cada maior dificuldade um (a) praticante realiza, mais inflado e sensível fica seu ego.

O primeiro passo é ter humildade e parar de se comparar com os outros, além, claro, de achar que é melhor que qualquer outro por causa de seus feitos ou capacidades esportivas. O ideal é se tornar mais confortável com o (a) escalador (a) que você atualmente é, em vez de se fixar no (a) escalador (a) que deseja ser. Essa atitude permite o indivíduo reconhecer suas fraquezas e, em seguida, abordá-las saindo de sua zona de conforto.

Em resumo: em vez de ficar pensando em como as outras pessoas o veem, trabalhe e treine para se tornar o escalador, ou montanhista, que deseja ser. Melhorar o jogo mental é uma das melhores maneiras de aumentar o seu nível de escalada e trabalhar para atingir o potencial máximo.

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