Tendência: Roupas outdoor com tecidos de cânhamo começam a aparecer como alternativa ao algodão

Roupas de cânhamo cada vez mais são comercializadas. Você saber por que? Um exemplo: A empresa italiana (mas fundada em Munique em 1935, mas atualmente com sede em Bolzano) de equipamentos de escalada Salewa anunciou esta semana que estará lançando sua linha de roupas para a escalada esportiva.

Como atrativo, a empresa irá apostar em fibras vegetais, como o cânhamo, para fazer suas roupas. A escolha foi o cânhamo. O nome da empresa é derivado de tecidos de couro ou outros estofados: “Sattler” (em alemão seleiro), “Leder” (couro) e “Waren” (artigos), que compõem a palavra SaLeWa. Portanto, no momento, é como uma espécie de volta às origens.

Ambientalistas estão cada vez mais preocupados com o papel que o algodão está desempenhando na destruição do planeta. O cânhamo é considerado um dos tecidos de roupas mais ecológicos que uma pessoa pode obter. Junto do algodão orgânico, é a aposta das empresas outdoor para linhas de roupas que ofereçam um consumo mais responsável e eco-friendly.

Conhecendo o algodão e o cânhamo

O cânhamo e o algodão são cultivados há milhares de anos como fibras e alimentos. O cultivo de algodão já tem mais de 7 mil anos e tem suas origens no sul da Arábia, Egito, Sudão e parte da Ásia. Já o cânhamo já era cultivado desde 8.000 a.C. no Oriente Médio e na China.

Atualmente o algodão é considerado o rei da indústria da moda. Mas ser a fibra mais usada em roupas no mundo todo a torna a melhor opção?

• Características do algodão

O algodão é o tecido de fibra natural mais utilizado para roupas. Por ser tão difundido, o algodão tende a ser mais barato do que o cânhamo.

O algodão é usado na fabricação de uma ampla variedade de produtos, incluindo roupas, lençóis, toalhas, lonas, tendas, óleo de cozinha, gorduras e temperos para salada. A farinha e as cascas são utilizadas como ração para gado, aves e peixes e como fertilizante.

A China é atualmente o maior produtor de algodão do mundo, a Índia aparece em segundo e os EUA (O Texas é o principal estado produtor) em terceiro.

• Características do cânhamo

A primeira planta usada para têxteis foi provavelmente o cânhamo. Restos de tecido de cânhamo foram descobertos em vários sítios arqueológicos. As cordas feitas de cânhamo surgiram nos barcos da Grécia por volta do ano 200 a.C..

No final do século XV, quando o Reino Unido passou a expandir sua potência naval, um de seus maiores desafios foi garantir a disponibilidade de cânhamo para equipar seus navios.

Cânhamo refere-se a uma variedade da planta cannabis que são cultivadas para fins industriais e comerciais, como roupas e alimentos saudáveis. É semelhante ao linho, juta ou rami.

Outras variedades de cannabis contêm um composto psicoativo conhecido como tetra-hidrocanabinol (THC), o ingrediente ativo da maconha. No entanto, o cânhamo industrial contém apenas vestígios de THC.

A planta de canabis é alta e fina e cresce de 5 a 15 pés de altura. É cultivado principalmente na China, bem como na Europa, América do Sul e Coreia do Norte.

Cânhamo é melhor que algodão?

Para comparar duas fibras diferentes, é necessário compará-las em igualdade de condições de uso. Ou seja, para saber qual é a ‘melhor’ ou a ‘pior’ é importante saber qual o impacto ambiental que cada peça de roupa, feita com as duas fibras, pode causar.

O algodão é natural, biodegradável e resulta em um ótimo tecido para roupas, pois é macio, respirável e leve. Mas é uma planta de cultivo muito intensivo em água e pesticidas. Tem um custo ambiental muito mais alto do que o cânhamo, que requer menos pesticidas ou fertilizantes e nenhum herbicida.

A quantidade de água necessária para o cultivo do um algodoeiro é enorme quando comparada à quantidade de algodão utilizável produzido pela planta: 2.700 litros de água para cultivar algodão suficiente para fazer uma camiseta simples. Quase 10% de todos os produtos químicos agrícolas e 25% dos inseticidas no mundo vêm da indústria do algodão .

O algodão orgânico é cultivado a partir de sementes não transgênicas e sem o uso de fertilizantes. Sistema que necessita aproximadamente de 85% menos água do que o cultivo tradicional, mas leva mais tempo do que o algodão tradicional para crescer, colher e fabricar.

O cânhamo é na verdade uma das plantas com crescimento mais rápido no mundo. Leva de 3 a 4 meses para atingir a maturidade. Uma única planta de cânhamo rende 220% mais fibra do que uma planta de algodão e precisa de muito pouca água, se comparada ao algodão, para crescer e, segundo especialistas, é naturalmente resistente a pragas.

A cannabis por necessitar muito menos água, cresce mais rapidamente (70 a 110 dias) e usa o mínimo de nutrientes do solo. As raízes das plantas de cânhamo arejam o solo, deixando-o rico para futuras colheitas. O cânhamo produz 680 kg de fibra por acre, enquanto o algodão produz 227 kg por acre.

Os tecidos de cânhamo são mais resistentes, mais absorventes, mais duráveis ​​e melhor isolantes do que o algodão. Além disso, eles não deformam na mesma proporção que o algodão, característica que torna o cânhamo um tecido de forramento perfeito, porque pode ser esticado e permanecer esticado durante toda a vida útil.

Por outro lado, o algodão é ideal para camisetas, jeans e outras roupas em que um pouco de elasticidade seja desejável. Inegavelmente tecido de algodão é mais macio e confortável em contato com a pele do que o de cânhamo. A fibra de cânhamo tem um toque áspero em seu estado natural de fiação e é suscetível a desfiar e tem um odor natural pronunciado que algumas pessoas não gostam.

Portanto, em resumo, as vantagens do cânhamo em relação ao algodão é:

1. Cânhamo utiliza menos água no cultivo que o algodão
2. As raízes do cânhamo enriquece o solo (o algodão não)
3. O cânhamo não precisa de pesticidas (o algodão de uma tonelada)
4. O cânhamo exige metade de uma área de terra que o algodão para produzir uma tonelada de tecidos acabados
5. O cânhamo é mais resistente e durável que o algodão

Por que a indústria não adotou o cânhamo?

O pais mais rico do mundo, por enquanto, são os EUA. Pela sua grande força econômica, todas as tendências e escolhas econômicas feitas pela indústria de lá, impacta na indústria de grande parte do mundo. As suas opiniões são fortemente consideradas por outras nações antes de empreender uma ação diplomática ou militar.

Por séculos, a cannabis se espalhou pela Europa e, na época das colonizações, chegou até o continente americano. Por séculos as duas fibras, o cânhamo e algodão, rivalizaram na escolha de fibras para vestimentas. O algodão, por causa da tecnologia da época, como um tecido mais agradável ao toque e foi adotado pela nobreza.

Até 1920, o cânhamo, extraído da maconha, que já era cultivado havia séculos pelo mundo, dominava a indústria de tecidos, enquanto quase toda indústria do papel também estava baseada nessa matéria-prima. Mas, como foi citado no início do artigo, o cânhamo é uma espécie de cannabis, mas que não contém o princípio psicoativo.

Na década de 1920 entrou em vigor a A Lei Seca nos EUA. Com o consumo de álcool proibido, o consumo de cannabis disparou chamando a atenção do recém-criado Comitê de Proibição. A partir disso o governo dos EUA começou a espalhar boatos sobre crimes praticados sob a influência da planta.

.Nessa época, a indústria de fibras sintéticas começou a crescer nos EUA. Então, a indústria petroleira e de tecidos sintéticos usou de lobby pesado para a criminalização da planta cannabis. A DuPont foi uma das maiores responsáveis por orquestrar a destruição da indústria do cânhamo. Assim todas as espécies de canabis se tornaram ilegais no século XXI com a criminalização da planta da maconha.

A criminalização da maconha teve várias causas. Foi apoiado pelas indústrias de algodão e madeira, por razões bastante óbvias. À medida que o uso do cânhamo diminuía, as empresas de algodão se lançaram para “salvar o mundo” com roupas de algodão. Durante décadas, a lei federal dos EUA não diferenciou o cânhamo de outras plantas de cannabis, todas as quais foram efetivamente tornadas ilegais em 1937.

A título de referência, no Brasil a primeira lei de controle de drogas foi decretada em 1921 e em 1964, já na ditadura militar, a simples posse de canabis em qualquer forma passou a ser crime. Assim, em vários lugares do mundo sem a planta cannabis, a produção de cânhamo foi sufocada e passou a ser praticamente inexistente.

O futuro do cânhamo

Desde 2018, o cânhamo teve seu uso legalizado nos EUA, fazendo com que a indústria norte-americana (além de outros países adotar o mesmo caminho) comece a usar a fibra novamente. A mudança de comportamento foi uma mudança na legislação norte-americana que afirmou que para cultivo o cânhamo não pode conter mais de 0,3% de THC (o composto da planta mais comumente associado com deixar uma pessoa chapada).

Assim, com a a Farm Bill de 2018, o cânhamo agora é tratado como outras commodities agrícolas de vários tipos e fez com que muitas pessoas (tanto dentro como fora do setor agrícola) corressem para descobrir, e explorar, o mercado potencial para este produto agrícola. Nos EUA, a cannabis já é uma commodity de alto valor, com expectativa que os negócios ultrapassem US$ 30 bilhões por ano em 2025.

Assim, várias empresas de tecidos e papel já estão correndo atrás de também contar com linhas de produtos com fibras de cannabis para duas futuras coleções. No Brasil, empresários de agronegócio enxergam o cultivo de cânhamo como uma estratégia para a acelerar a saída da recessão econômica pós-pandemia, para gerar empregos e divisas, pois áreas subutilizadas pela agricultura poderão dar espaço a uma nova cadeia produtiva.

Mas, ao contrário dos EUA, o cultivo de cannabis é proibido no Brasil, apesar de poder ser comercializado seus insumos. No momento, o debate gira em torno de uma oportunidade que é desperdiçada pela falta de uma nova legislação. Uma nova regulamentação que separasse a espécie de cannabis que possui efeitos psicoativos, daquela com baixo teor de THC (que não interessa ao uso adulto) poderia abrir várias oportunidades em diversas áreas da economia.