Parque da Pedra Furada: O relato de uma conquista de duas vias

Por Juliano Pedra Chata

Relato de conquista noParque da Pedra Furada. Fazendo uma trip de escalada pela região Nordeste, na rota das 50 vias Clássicas do Brasil, eu e Adelson chegamos na cidade de Brejo Madre de Deus, Pernambuco.

Ali conhecemos Higor Souza, escalador local e um carinha gente boa, que já foi logo se enturmando e mostrando os picos, escalando e guiando a gente na camaradagem mesmo. Há muito atrás, em 2011, eu tinha comprado uma revista de aventura onde tinha uma matéria falando sobre um pico bem loco…

Esse pico se chamava Pedra Furada, e ficava em Venturosa, Pernambuco.

Então comentei com Adelson: “já estamos aqui perto de um pico bem interessante, e com os equipamentos de conquista móvel e chapeletas”, já com aquela intenção de deixar uma contribuição no Nordeste. Comentei com o Higor sobre a tal “Furada” e ele já fez contato com dois guias locais.

Logo após o contato partimos os três para lá. Encontramos Júnior na estrada, um guia e praticante de rapel que nos guiou até o local.

Chegando no Parque da Pedra Furada

Pedra Furada

Foto: Juliano Pedra Chata

Chegamos por volta das 9h da manhã no Parque da Pedra Furada, onde a rocha é predominantemente de granito. Conversamos com um ‘senhorzinho’ do restaurante que tem na entrada do parque e perguntamos se alguém já havia escalado aquela pedra.

Ele disse que não e ficamos mais animados. Passamos pela portaria e fomos dar uma conferida para ver se rolava algumas possibilidades de possíveis linhas. Subimos as escadas de pedra que chegam na base (mais de 300 degraus) e, quando cheguei, fiquei encantado com aquela rocha alucinante.

Nunca tinha visto uma formação de granito daquela forma: uma rocha com uns 200 metros de largura, formando um arco com um teto de uns 40 metros de altura por 100 metros de extensão. É como se fosse uma grande ponte.

Ali foi abrigo de várias tribos indígenas, tem várias pinturas rupestres que estão muito degradadas por outras pinturas ‘burrestres’. Ali também foi abrigo do cangaço.

Pedra Furada

Foto: Juliano Pedra Chata

Olhamos todas as possibilidades e vimos várias. Eu e Higor ficamos pirados!

Eram tantas possibilidades que a vontade era de ficar lá uns 15 dias, pois fora a Pedra Furada tem várias rochas grandes no entorno e muitos blocos para abrir vias esportivas e de boulder. Escolhi uma linha fácil para que todos possam repetir.

Voltamos para a entrada do parque, almoçamos, tomei uma dose de temperada, e sentindo aquele calor de rachar preparei os equipamentos de conquista com móveis e tudo mais e subimos carregados, com o Júnior e Marcos, amigo dele, nos ajudaram a carregar a tralha toda. A Pedra Furada tem duas faces, com a leste podendo ser escalada depois das 13h e a oeste pode ser escalada de manhã.

A conquista da Pedra Furada

Pedra Furada

Foto: Juliano Pedra Chata

Chegamos na base pedra por volta das 13h, atravessamos para a face leste a esquerda e descansamos um pouco. Me equipei e fomos analisar a linha que escolhi.

Com Adelson fazendo a segurança, me encordei no meio da corda de 60 metros, metade para a minha segurança e outra metade de retinida. Esse foi um ‘beta’ do nosso amigo Higor, escalador, conquistador e guia de Brejo Madre de Deus, e achei bem interessante.

Comecei a conquista e protegi com um TCU metolios a uns dois metros do chão, só para dar uma proteção psicológica e me lancei na parede. Toda conquista é adrenante!

Quando em livre, sem uso de cliffs é muito mais interessante e particularmente eu gosto muito. É onde entrego meus medos e fico com a cabeça feita…

Comecei a subir e estava bem pesado, com uma Makita 18w, marreta de meio kg, oito chapeletas já nas costuras, equipo móvel e tudo mais. Passei um lance fácil de IIIº brasileiro, depois fui trabalhando o lance já a uns quatro metros do chão. Peguei a marretinha e dei umas batidas na pedra para ver se a rocha era sólida para bater uma chapa.

Rocha boa!

Pedra Furada

Foto: Juliano Pedra Chata

Então saquei a furadeira e fiz o furo, guardei a furadeira já com a broca, peguei o soprador, soprei o furo e então peguei a costura já com a chapa e o bolt e coloquei até o final. Todo esse processo com 3 pontos de apoio: dois pés, uma mão e muita concentração.

Costurei a corda do segue e fiquei atento pois quando a corda são de duas cores diferentes, com metade de cada cor é tranquilo pois não se misturam, mas com uma corda de uma cor só tem que estar ligado para não costurar a corda errada. Costurei e ‘chamei no batman’ até pertinho da costura, com o Adelson retesando bem. Aaí peguei a chave 14 e expandi o bolt apertando a porca.

Fui novamente atento, com muita coisa quebrando escalei mais dois metros e bati outra chapa. Fui subindo adrenado e o lance foi ficando mais encardido. Entrei no lance de IVsup/V° brasileiro, passei o lance e bati a terceira. Subi mais um lance de IV e III° e cheguei num corte horizontal e uma moita.

Estava cheio de espinhos e bati uma chapa para direcionar. Fui tocando uma travessia na horizontal para a esquerda protegendo em móvel com dois camalots, de #1 e #3, um cruxzinho
de travessia, aí bati a parada P1, a 30 metros.

Puxei toda corda e Adelson entrou guiando com o Higor na segue. Adelson chegou na P1 e chamou o Higor que chegou e separamos o equipamento para a segunda investida. Higor pegou a ponta da corda e assumiu a conquista. O Adelson não estava preparado e também não teve a moral de conquistar.

Pedra Furada

Foto: Juliano Pedra Chata

Conquista é uma escalada a parte, outro universo dentro do esporte, quem é conquistador sabe do que estou falando…

Higor então se lançou, saiu para a diagonal no máximo uns dois metros, adrenou e voltou para a parada. Assumi a ponta da corda novamente e deu no que eu queria mesmo (rsrs). Fui
saindo na travessia horizontal, uma quase canaleta com pé bom de lado e um cagaço conquistando em livre.

Bati três chapas e subi uma perto de uma vertical em um lance de VI°, bati uma chapa na roubada, costurei, expandi o bolt e toquei para cima onde acessei outra linha de canaleta horizontal, protegi com camalot #1. Dominei o lance e estiquei passando por um bico de pedra chegando em uns blocos encaixados no cume, onde bati a parada P2, a 25 metros.

Puxei a corda e Higor entrou escalando e sentindo os movimentos da via, deu uma adrenada na travessia, mas tirou de letra o crux de VI grau chegando na
parada e chamando o Adelson na segurança, que veio limpando. Chegando todos na parada P2 comemoramos nós três, pois era exatamente 16h.

Pedra Furada

Foto: Juliano Pedra Chata

Júnior e Marcos com sua filha, de Peixeira-PE, ficaram muito interessados na escalada, e fizeram várias fotos e vídeos. Saímos do cume, onde deixei uma parada escondida só
para escaladores acharem a uns dois metros abaixo do cume. Descemos a trilha com a galera na frente e eu com o Higor fomos atrás trocando ideias.

Sol fritando na face oeste, chegamos embaixo do grande teto e separamos e organizamos os equipamentos enquanto conversamos com uns turistas que estavam por lá. Era por volta das 17h30 quando começamos a descer apreciando aquele lindo por do sol, chegamos ao restaurante na base da entrada do parque.

Tomamos duas ‘Temperada’ (cachaça com raiz e casca de planta regional) com carne tiragosto, preparada por uma senhorinha gente boa que me disse que seu avô era cangaceiro, dos homens
de Lampião. Conversamos com o proprietário do restaurante e ajeitamos para ficar de barracas na parte externa do restaurante por R$ 10 por pessoa, com direito a banheiro, banho de caneca, tomadas para carregar celular e wifi.

Umas 19h o senhorzinho fechou o restaurante, empilhou as mesas e cadeiras e foi embora para a cidade de Venturosa, então fomos montar nossas barracas e Higor instalou sua rede para dormir. Quando olhei no meu celular vi que o Eliseu Frechou tinha me adicionado em um grupo de whatsapp para falar sobre um acidente fatal que tinha acontecido na Pedra da Divisa, São Bento do Sapucaí. Ficamos apreensivos e acompanhando pelo grupo!

Tivemos a notícia de que estava rolando uma conquista e uma pedra se soltou do nada e caiu na cabeça de uma jovem da cidade de Pouso Alegre, Minas Gerais, que se chamava Cecília. Ficamos chocados e conversando sobre o assunto. Resolvi fazer uma homenagem para a jovem, batizando a nossa via com o nome “Eternamente Cecília” e todos concordaram.

Cada um tomou seu banho de canequinha e Adelson, ótimo cozinheiro, fez o rango. Jantamos e tomamos uma cachaça Pernambucana e depois eu e Higor caminhamos até o cume da Pedra Furada, onde ficamos por um tempo apreciando a noite ali no sertão e lá pelas 22h30 fomos dormir.

Segundo dia de conquista

Foto: Juliano Pedra Chata

Levantamos cedo e Adelson fez um café que tomamos para logo ajeitarmos as tralhas e subirmos para mais um dia de conquista, dessa vez na face oeste com sombra pela manhã. Eu e Higor partimos para mais uma missão.

Higor se equipou com os móveis e entrou para mais uma conquista por volta das 9h da manhã. Em uma fenda linda foi colocando peças e artificializando na fifi, voltando para trás para recuperar peças e ir tocando para cima. Por volta das 10h30 chegou no final da fenda e coloquei a furadeira na corda retinida, duas chapas de argola, marreta e soprador.

Ele puxou para cima e bateu uma parada. Adelson chegou do cume e Higor desceu e limpou a via deixando o tope rope montado. Deixei eles escalando e experimentando a
via e fui na outra face fazer o rascunho da conquista do dia anterior.

Voltei logo em seguida e escalei a via, limpando tudo. Adelson batizou a via: Fenda da Bobônica, graduada como 6°sup /7a, com extensão de 25 metros.

Arrumamos a tralha assim que chegou o Júnior, de Peixeira, que nos ajudou a carregar até o carro na entrada do parque pois estávamos com tempo limitado. Higor e Júnior partiram para Brejo de motinha, eu e Adelson também pegamos a estrada. Dessa vez para dar uma passada no Parque Nacional do Catimbau, que estava bem próximo a cerca de 60 km de onde estávamos, outro
lugar que vale super a pena conhecer.

Dicas e contatos

  • Marcos Antonio Xavier dos Santos, Peixeira-PE (guia local)
  • Heraldo Higor Oliveira de Souza, Brejo Madre de Deus-PE (guia e escalador local)
  • Jailson Fernandes da Silva/ Júnior (guia local)
  • Camping e Restaurante Pedra Furada (Senhor Valmiro)
    • Telefone: (87) 991329361 ou (87) 981113353

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