Moeses Fiamoncini fala sobre o Annapurna e divulga detalhes de sua tentativa ao Daulaghiri

Moeses Fiamoncini é um dos grandes nomes do montanhismo brasileiro na atualidade. O paranaense, iniciado em alta montanha há relativamente pouco tempo, já possui em seu currículo de montanhista uma série de recordes.

Em pouco mais de um ano, Moeses foi de sua primeira tentativa em montanha acima dos 8.000 metros, o Manaslu (8.156 m), para uma sequência de outras cinco das montanhas. Todas acima de 8.000 metro mais altas do mundo.

Fiamoncini já está entre os montanhistas brasileiros com mais cumes entre as 14 montanhas acima dos 8.000 metros de altitude. Mas há um detalhe que abrilhanta ainda mais sua conquista: Moeses faz as expedições praticamente sem equipe, carregando boa parte de seus equipamentos e com custos mínimos.

Moeses Fiamoncini agora está no Nepal, depois de uma tentativa, não completada, de chegar ao cume do Annapurna (8.091 m). Mesmo com os lábios rachados por causa do frio, o montanhista brasileiro já entrou em processo de aclimatação para tentar subir o Daulaghiri (8.167 m).

O montanhista falou com exclusividade à Revista Blog de Escalada e deu detalhes que permaneciam em segredo até então.

Moeses, onde você está agora? está seguro e a salvo?

Eu estou em Pokhara, capital da região oeste do Nepal.

Estou bem, descansando.

Como foi a sua tentativa de cume ao Annapurna?

Moeses Fiamoncini

Foto: Cortesia Moeses Fiamoncini

Eu tinha consciência de que não seria fácil escalar o Annapurna.

É uma das montanhas mais técnicas das 14/8.000’s e escalá-la em solo e sem oxigênio foi algo que tornou tudo mais complexo. Tarefas simples, como encher o colchão de ar, preparar comida ou derreter gelo para beber algo quente, demandam muita força de vontade e energia quando se está em altitude.

Nessa expedição, algo que também influenciou minha performance foi que cheguei ao campo base do Annapurna depois do restante do grupo, pois estava guiando um brasileiros até o acampamento base do Everest na região do Vale do Khumbu.

Os outros montanhistas fizeram duas rotações de aclimatação enquanto eu pude fazer somente uma.
Outra questão bastante relevante é que o clima no Annapurna é muito instável. As janelas de bom tempo são muito curtas.

Após a segunda rodada de aclimatação do grupo haveria uma janela com uns 3 dias de tempo bom para tentar cume e na sequência a previsão informava vários dias com nevasca. Uma escolha equivocada pode ser fatal.

Ficar mais tempo na montanha me ajudaria com a aclimatação, mas também me deixaria mais vulnerável a ser soterrado por uma avalanche em uma das rotações de um campo para o outro.

Para completar a sucessão de dificuldades, no dia de ataque ao cume faltou cordas fixas e todo o grupo precisou voltar.

A empresa responsável trouxe as cordas de helicóptero até o campo 4 e os Sherpas as usaram no segundo dia de ataque ao cume, pois só tínhamos mais um dia de tempo bom. Tentei cume novamente no dia seguinte, mas o cansaço da tentativa do dia anterior acabou se somando.

E quando digo cansaço, quero dizer todas as alterações que ocorrem no corpo, pois já estava há cinco noites acima dos 6.500 metros, quando estamos há tantas horas em altitude e com temperaturas extremas. Várias montanhistas sofreram frosbite e infelizmente algumas sofrerão amputações, nunca tinha visto isso antes, pessoas com oxigênio sofrendo congelamento nos dedos!

Para mim foi a montanha mais fria que já enfrentei, nem mesmo o K2 sem oxigênio suplementar foi tão fria como o Annapurna!

Quais os motivos de você ter tido de abortar o cume?

Moeses Fiamoncini

Foto: cortesia Moeses Fiamoncini

Eu tomei a decisão de descer porque meus pés estavam congelando literalmente, algo que não ocorreu na tentativa do dia anterior.

Estava em 7.600 e já fazia muitas horas que caminhava com uma dor horrível nos pés. Quem faz alta montanha está acostumado a lidar com a dor, portanto, não seria a dor em si que me impediria de chegar ao fim.

Mas eu sabia que esse cume poderia custar os meus pés. Eu ainda quero escalar muitas montanhas, meus dedos certamente fariam falta. Preferi não arriscar, embora tenha sido uma decisão bastante difícil.

Como está você fisicamente após a tentativa?

Eu estou bem no geral, apenas com sensibilidade na ponta dos dedos das mãos e dos pés, que mantenho na água quente várias vezes por dia.

Você irá tentar uma outra montanha no Himalaia, como está sua preparação?

Sim, dentro de poucos dias partirei para o Daulaghiri, montanha que já tentei uma vez e que também é muito técnica.

A aclimatação do Annapurna me dará a vantagem de ter que ficar menos tempo na montanha. Estou otimista.

Como estão as coisas no Nepal em tempos de pandemia?

O fato de o Nepal ter aberto para essa temporada já é um indicativo de que a pandemia está razoavelmente controlada por aqui.

O número de infecções e de mortes é baixo e quando cheguei em março, além do PCR negativo para entrar no país, e a quarentena de 7 dias que fizemos, exigiram mais um PCR para acessar as montanhas.

Que recado gostaria de deixar para as pessoas do Brasil que está acompanhando suas escaladas?

Que elas busquem sua essência e vivam de acordo com essa essência, claro, desde que isso não prejudique aos outros ou a elas mesmas.

Eu amo natureza, rochas e gelo então escalo montanhas

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