Jaqueta de plumas faz 100 anos: A história de um item icônico

A jaqueta de plumas é hoje presença comum em quase todas as lojas, principalmente para quem procura um casaco que ofereça conforto térmico em temperatura baixas. Isso porque as plumas são um isolante fantástico, pois a ‘fofura’ (do inglês loft) da penugem cria milhares de pequenas bolsas que retêm o ar quente, mantendo o calor e prolongando o conforto térmico, ajudando assim a manter o usuário muito aquecido no inverno.

O poder de preenchimento da pluma é uma medida do loft ou ‘fofo’ e suas propriedades isolantes. Quanto maior o poder de enchimento, mais bolsas de ar na penugem e mais isolante a jaqueta será para seu peso. Os valores já foram explicados no artigo “Qual é o forro mais eficiente: Plumas de pato ou plumas de ganso?”.

A jaqueta também é conhecida no mundo fashion como “jaqueta puffer” ou “down jacket”. Geralmente, mas não se tornando uma regra, a “puffer” é chamada por quem é da área de moda e alta costura, não sendo ligada a esportes, já o termo “down” se refere a jaquetas técnicas com tratamento para bloquear o vento e ser mais respirável.

Era uma vez o Duvet

A Jaqueta de plumas, assim como os sacos de dormir, foram chamadas erroneamente de duvet quando chegaram ao Brasil. Tecnicamente falando, duvet é o nome em francês que equivale ao que conhecemos popularmente como edredom, que nada mais é que uma coberta de espessura grossa usada nos dias mais frios e geralmente acolchoada com penas, lã ou algodão.

O equívoco é explicado por ser a palavra edredom vinda de “edderdun” ou “ejderdun”, de origem escandinava, que significa “penugem fina, do peito do êider” (espécie de pato comum na região da Escandinávia). Mas uma coisa é consenso entre os historiadores: não houve uma pessoa considerada como o criador, ou a criadora, do edredom.

Algumas fontes afirmam que os chineses foram os primeiros a usar edredons por volta de 3000 a.C.. No século XV, cobertas de penas eram usados ​​por monarcas ricos na Europa continental e na Inglaterra, embora não por seus cortesãos.

Na Europa é creditada ao diplomata inglês, Paul Rycaut (1629 -1700 d.C.) ser o primeiro a tentar comercializar o edredom na Inglaterra. Por volta de 1700, Rycaut enviou sacos de penugem para seus amigos com instruções, avisando que “a colcha deve ser acolchoada alta e em grandes camadas entrelaçadas, caso contrário não permanecerá quente”. Como era trabalhoso e parecia uma novidade maluca, os cidadãos do Reino Unido mantiveram a tradição de usar lençóis e cobertores.

Rycaut teve a ideia certa, mas estava à frente de seu tempo. Entretanto, os edredons aparentemente já estavam em uso na Alemanha na mesma época.

Mais 100 anos mais tarde, em 1749, o historiador irlandês Thomas Nugent, especializado em escrever sobre viagens, esteve no Grand Tour of Europe (tradicional viagem pela Europa, feita principalmente por jovens de classe média alta) e mencionou em seus escritos uma descrição do que parece ser edredons, que eram usados ​​por famílias europeias do interior. O Grand Tour of Europe, é considerado a origem histórica do turismo contemporâneo, principalmente da maneira como ele é entendido hoje.

Cobertores com penas passaram a ser usados na Inglaterra em meados do século XIX. Na Grã-Bretanha vitoriana (1837 a 1901) e no começo da Belle Époque na Europa continental, o edredom tornou-se popular e, embora possamos descrevê-lo como uma forma primitiva de edredom não substituiu os cobertores de lã usados pela população em geral.

Em algumas partes da Europa, os edredons se tornaram uma espécie de item de luxo para a classe alta. Em 1964, Sir Terence Conran tomou a decisão de importar edredons da Suécia para o Reino Unido. Eles foram comercializados como a ‘cama de 10 segundos’ e ganharam enorme popularidade devido à sua conveniência e conforto e foi vendida como ‘Continental Quilt’.

A peça como a conhecemos hoje como edredom se popularizou e tornou-se um item de produção industrial somente na década de 1970. Nos dias modernos, edredons agora são vendidos em todas as formas e tamanhos e existem muitos “recheios” e espessuras para escolher, dependendo da sua preferência.

A pré-história da jaqueta de plumas

O uso de plumas no corpo é antiga. Tribos norte-americanas têm usado penas de pássaros como parte de cerimônias religiosas que datam de milhares de anos. Imagens de toucas de guerra de índios norte-americanos nos mostram a importância dada às aves e sua integração em várias culturas.

O nome Caribou Inuit originou-se de europeus que participaram da Quinta Expedição Dinamarquesa de Thule (1921-1924) e observaram que os Kivallirmiut dependiam do caribu para comida, roupas e abrigo. Os Caribou Innuit (Kivallirmiut) já usavam parkas de penugem por inúmeras gerações.

Os rudimentares sobretudos pesados ​​foram projetados para manter os caçadores aquecidos durante o clima mais severo. Traçar as origens da parka é difícil, mas os pesquisadores acreditam que essa forma de roupa de frio tem sido usada pelos Innuit por muitos milhares de anos.

A partir do ano de 1600, como descrito acima, foi quando as plumas tornaram-se um componente chave na construção de roupas usadas em ambientes frios. Nesta época, os comerciantes holandeses compravam regularmente penas da Rússia.

A centenária de plumas

Muitos montanhistas creditaram a Eddie Bauer (inclusive é alardeado pela sua empresa de mesmo nome), que foi ele o inventor das jaquetas de plumas. Entretanto, esta é uma maneira muito particular de ver a história e tudo começou com a primeira expedição de montanhismo ao Monte Everest.

Na década de 1890, oficiais do exército britânico que estavam trabalhando na Índia começaram a discutir a possibilidade de uma expedição ao Monte Everest. Os oficiais consultaram duas organizações exploradoras britânicas: Royal Geographical Society e a Alpine Club.

Embora o Tibet estivesse fechado para os ocidentais, o oficial britânico John Noel se disfarçou e entrou em 1913 no país. Noel chegou a 65 km do Everest e conseguiu ver o cume. Mas somente quase 10 anos depois que a expedição britânica ao Monte Everest de 1922 tornou-se a primeira expedição com o objetivo expresso de fazer a primeira subida do Monte Everest e tentar escalá-lo pela face norte (Tibet).

O australiano George Finch, em 1922, foi convidado para esta primeira expedição britânica ao Everest. Finch foi uma escolha controversa, pois “era colonial, tinha cabelo comprido, o que naquela época significava que ia até os ombros, e ele havia se divorciado”, disse Robert Wainwright, autor de Maverick Mountaineer, uma biografia de Finch.

Na época, escalar montanhas era um jogo de cavalheiros e o grande rival de Finch na expedição era o “garoto de ouro” aristocrático chamado George Mallory.

Foi nessa expedição que Finch, que também era químico, inventou a jaqueta forrada com plumas em 1922. Muitos exploradores e montanhistas do início do século XX, incluindo George Mallory, zombaram da criação de Finch. Detalhe: Com esta jaqueta Finch tornou-se a primeira pessoa conhecida a subir a uma altura superior a 8.000 metros (ele atingiu a altitude recorde de 8.321 metros).

O australiano não é conhecido apenas por seu trabalho na confecção de roupas que protegeriam os montanhistas das temperaturas frias mortais no pico do Everest. Ele também foi a primeira pessoa a propor o uso de oxigênio engarrafado como forma de prevenir a falta de oxigênio em altitudes extremas.

Entre os aristocratas que lideravam a expedição, o oxigênio engarrafado era duplamente contestado, pois era considerado uma forma de assistência “injusta” e, portanto, “antibritânica” (seja lá o que isso pode significar) e, o que é pior, foi inventado por um “colonial”.

George Finch encomendou sua “jaqueta de edredom” feita sob medida nas encostas do Monte Everest quando se juntou À expedição britânica ao Monte Everest de 1922. A jaqueta chegava na altura do joelho e se revelou uma das revoluções do montanhismo da época.

Assim, em vez de um terno de Norfolk Tweed tradicional da época, o qual era usado sobre várias camadas de seda, algodão ou lã e coberto com jaquetas de gabardine à prova de vento, Finch usava a jaqueta forrada de tecido verde brilhante usado em balonismo. A jaqueta o distinguiu entre os outros montanhistas e podia ser vista à distância.

Depois de algumas semanas, no entanto, não estamos mais rindo. As temperaturas caíram e apenas Finch não estava sofrendo com o frio, diferentemente dos outros da sua expedição. Dois anos depois, Finch não é mais convidado para a expedição ao Everest e Mallory se recusa a usar essa jaqueta.

Foto: Christopher Burns on Unsplash

No Monte Everest, o aquecimento da jaqueta de Finch acabou provando seu valor: ele e seu companheiro Geoffrey Bruce atingiram 8.000 metros de altitude. Um recorde para a época.

Como o fotógrafo da expedição escreveu mais tarde, Finch havia “inventado um maravilhoso edredom verde acolchoado de tecido de balonismo. Nem uma partícula de vento poderia passar”. Até mesmo Finch notou a mudança de opinião das pessoas à sua volta em seu diário, escrevendo: “Todo mundo agora inveja meu casaco de edredom, e não é mais motivo de riso”.

O papel de Finch no desenvolvimento de equipamentos para atividades outdoor foi fundamental. Sir Edmund Hilary, neozelandês e o primeiro homem a chegar ao cume do Monte Everest sem oxigênio, trabalhou com o cientista australiano para fabricar roupas para a expedição. Para a expedição de 1953, por outro lado, uma versão aprimorada da jaqueta pioneira foi desenvolvida e usada por Edmund Hillary até o cume.

Anos mais tarde da inovação de Finch, em 1936, que Eddie Bauer, o criador da marca que levava seu nome, projetou a jaqueta Skyliner. Usando penugem como acolchoamento e costurada em bolsas isoladas (para que toda a penugem não se amontoasse na parte inferior do casaco), o equipamento rapidamente se popularizou e tornou-se item obrigatório entre os montanhistas de todo o mundo.

A criação, entretanto, não foi motivada por uma expedição ao Everes. Eddie Bauer teve a motivação para criá-la depois de quase morrer de hipotermia em uma caminhada em uma viagem de pesca no meio do inverno no estado norte-americano de Washington.

Mas porque ele é considerado o inventor? Por que Bauer foi o primeiro a criar e vender um projeto de jaqueta de plumas em 1939 (mas patenteada em 1940), mas é importante lembrar que designer Charles James desenvolveu uma jaqueta com design semelhante para alta costura que era feita de cetim branco, mas mantinha um design semelhante e acolchoado na mesma época.

James chamou sua criação de ‘jaqueta pneumática’. Mas o design de James provou ser difícil de replicar e o preenchimento espesso em todo o interior do casaco dificultava a mobilidade superior. Em contrapartida o Skyliner era leve e quente, dando início a uma tendência em roupas para atividades outdoor.

Como é recorrente em quase todas as histórias de equipamentos outdoor, a Segunda Guerra Mundial teve papel preponderante. A tendência de jaquetas de plumas explodiu quando soldados voltando para casa da Segunda Guerra Mundial começaram a encomendar produtos Eddie Bauer para suas aventuras porque foram equipados com essas roupas durante a guerra.

Entre as patentes e o apelo gerado pela guerra, Eddie Bauer permaneceu sinônimo de qualidade pelos próximos 20 anos, criando uma popularidade só aumentou quando a empresa criou jaquetas e roupas especializadas para expedições norte-americanas ao Himalaia na década de 1950.

Atualmente a jaqueta Skyliner original está em exibição no Museum of History & Industry na cidade norte-americana de Seattle.

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