A perfeição do funcionamento do organismo humano em todas as suas facetas é fascinante e notável é nossa habilidade para executar um número sem fim de tarefas, que vão desde o manuseio de uma agulha a pilotagem de um ônibus espacial.
A evolução humana é incessante em todos os seus aspectos e diariamente podemos testemunhar essas transformações através dos avanços tecnológicos, o aumento na capacidade de aprendizado e cada vez mais pessoas trabalhando em prol da coletividade.
Como ocorre nas demais áreas do conhecimento, frequentemente também são descobertas novas variações de movimento, que acompanham o aumento da capacidade física dos atletas bem como a inclusão de novas modalidades e práticas corporais.
Na minha visão pessoal, uma das características mais fantásticas do nosso corpo é a sua capacidade de adaptação.
Graças a ela hoje conseguimos testemunhar feitos antes considerados impossíveis, como homens correndo 100 m abaixo de 10 segundos, ou uma mulher permanecendo por mais de 18 minutos sem respirar em apneia estática numa piscina, ou mesmo escalar picos acima de 8000 m sem auxílio de oxigênio.
Todas essas conquistas só puderam ser concretizadas após muito treino e muitas tentativas ao longo do tempo por intrépidos visionários que acreditaram nos seus sonhos, e foram acima de tudo notáveis.
Para entender como tudo isso foi possível e como funciona esse mecanismo é preciso compreender um pouco sobre o princípio da supercompensação.
De maneira muito simplificada, a supercompensação seria definida como a capacidade do organismo em aumentar a sua capacidade de trabalho, graças a uma adaptação gradativa a cargas mais elevadas de acordo com a progressão de treinamento.
Independente da natureza do treino, a cada sessão de treino o organismo é submetido a um determinado estímulo, que eleva o nível de estresse e “quebra” a nossa homeostasia (capacidade de autorregulação dos seres vivos para manutenção do equilíbrio das suas funções internas).
Se a periodização do treino e a recuperação estiverem adequadas, a linha homeostática e a capacidade de trabalho irão se alterar para suportar cargas mais elevadas, como mostrada de forma simplificada no gráfico abaixo.
Como ocorre em todas as outras modalidades esportivas, sejam elas recreativas ou de alto rendimento, a preparação física na escalada é fundamental, independente do estilo do escalador (indoor, bolder, esportiva, alta montanha, etc).
A especificidade do trabalho de preparação garantirá os melhores resultados, pois aprimora as habilidades específicas de cada modalidade, ajudando o atleta a atingir seus objetivos com maior segurança, diminuindo o risco de lesões e aumentando as chances de sucesso.
Se pegarmos o exemplo de um escalador de alta montanha, além dos inúmeros preparativos para a expedição e o tempo dedicado na concretização do projeto, muitos podem pensar que apenas uma adaptação adequada à altitude garante o sucesso do cume, quando a capacidade de continuar gerando contração muscular em altitudes onde a absorção de oxigênio é comprometida é tão ou mais importante do que a própria adaptação.
Já um atleta de boulder não vivencia os contratempos da altitude e permanece menos tempo na via, porém permanece em contração muscular constante quase 100% do tempo que está na rocha, necessitando de muito mais preparo para gerar força em isometria (contração muscular sem movimento da articulação) do que um atleta de alta montanha.
Portanto, para o preparador físico, é imprescindível entender as predominâncias fisiológicas de cada modalidade para traçar um programa de treino adequado.
Já para o atleta, não basta apenas executar o treino proposto, mas também respeitar os períodos de descanso, se nutrir de forma adequada e principalmente estar muito atento aos sinais do corpo, como dor, fadiga ou exaustão precoce constante, pois esses fatores podem ser indicadores de um quadro de supertreinamento e são fundamentais para uma boa continuidade da periodização de treino.
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Leonardo Oshiro, é educador físico e profissional certificado no NOLS (National Outdoors Leadership School) , professor de pilates, personal trainer e é mochileiro desde os 17 anos.