Grandes nomes do esporte: Walter Bonatti

Hoje completa 10 anos do falecimento do montanhista italiano Walter Bonatti, conhecido por suas muitas realizações de escalada. No seu extenso currículo de escalador e montanhista inclui uma escalada solo de uma nova rota no pilar sudoeste do Aiguille du Dru (3.754 m) em 1955, a primeira ascensão do Gasherbrum IV (7.932 m) em 1958 e a primeira escalada solo invernal da face norte do Matterhorn (4.478 m) em 1965.

Famoso por seu talento na escalada, Walter Bonatti foi pioneiro em escaladas pouco conhecidas e tecnicamente difíceis nos Alpes, Himalaia, Andes e Patagônia. Bonatti anunciou sua aposentadoria da escalada profissional aos 35 anos e após 17 anos de atividade de escalada.

A partir disso passou a ser o símbolo de um montanhista que soube evoluir seu estilo de vida e atividades com o tempo. O italiano passou a escrever e é autor de muitos livros de montanhismo, passando o resto de sua carreira viajando como repórter da revista italiana Epoca.

Reinhold Messner, em 2010, disse: “Bonatti foi um dos maiores escaladores de todos os tempos – o último verdadeiro alpinista, um especialista em todas as disciplinas. Mas o mais importante é que Walter era uma pessoa maravilhosa, tolerante e amorosa”.

Walter Bonatti chamou sua filosofia de escalada de “A busca pelo extremamente difícil”. O italiano realizou um número fantástico de escaladas audaciosas e, ainda mais notavelmente, sobreviveu a algumas escaladas horríveis que mataram alguns de seus companheiros.

O início de Walter Bonatti

Walter Bonatti nasceu em 1930 em uma família operária, era filho de Angelo Bonatti (1888-1973), um comerciante de tecidos, e Agostina Appiani (1899-1951). Bonatti teve uma irmã que faleceu muito jovem.

O italiano iniciou a sua atividade esportiva como ginasta no clube Forti e Liberi de Monza. A força física e o equilíbrio que desenvolveu nas suas atividades de ginástica provaram ser cruciais para sua carreira de escalador e montanhista.

Aos 18 anos, em 1948, Bonatti começou praticar montanhismo em Grigna (2.410 m), um maciço montanhoso na província de Lecco, no norte da Itália. No ano seguinte o italiano fez a primeira repetição da via Oppio-Colnaghi-Guidi, uma escalada considerada desafiadora na face sul do Croz dell’Altissimo.

Para se sustentar naqueles anos, Bonatti trabalhava como siderúrgico na Falck (uma holding italiana entre as mais antigas no setor siderúrgico), indo para as montanhas da Lombardia apenas aos domingos após o turno da noite de sábado. Em 1950, o italiano tentou, junto com Camillo Barzaghi, seu primeiro grande feito: abrir uma nova via na face leste do Grand Capucin (3.838 m), uma face nunca escalada antes, no maciço do Mont Blanc.

A primeira tentativa não foi bem sucedida, pois uma violenta tempestade faz com que desistissem faltando apenas algumas dezenas de metros. No ano seguinte, em 1951 Walter Bonatti tenta novamente, dessa vez com com Luciano Ghigo. Depois de três dias de escalada e três acampamentos suspensos, conseguiram finalizar o desafio.

No verão de 1953, Bonatti conseguiu a primeira escalada do Mont Blanc pela face norte do Col. Peuterey. No ano seguinte o italiano foi designado para o regimento alpino e, durante quatro dias por semana, treinou homens para escalar. Para os outros três dias restantes da semana teve permissão de seguir para as montanhas por conta própria.

A polêmica do K2

Com todas as suas conquistas, Walter Bonatti se tornou um nome imprescindível para a expedição italiana ao K2 (8.611 m). O italiano foi o mais jovem integrante da expedição 1954, organizada por Ardito Desio. Dois membros da equipe italiana, Lino Lacedelli e Achille Compagnoni, chegaram ao cume, realizando a primeira ascensão italiana ao K2.

Na véspera de Lacedelli e Compagnoni chegarem ao cume, Walter Bonatti desceu do oitavo acampamento em direção ao sétimo, para recuperar os cilindros de oxigênio deixados na noite anterior por outros companheiros. Com esta carga sobre os ombros, junto com o paquistanês Hunza Amir Mehdi, subiu ao oitavo acampamento e de lá, após um intervalo, ao local onde Compagnoni e Lacedelli deveriam ter montado o nono acampamento.

Por escolha de Compagnoni, os dois não montaram o acampamento onde havia sido planejado na noite anterior com Bonatti e o colocou aproximadamente 250 metros mais alto. Bonatti e Mahdi conseguem chegar perto do local combinado pouco antes do por do sol, mas não são ajudados por Compagnoni e Lacedelli. A dupla, em vez de mostrar o caminho para as barracas, se limitou a sugerir, de longe, deixarem o oxigênio e voltar.

A volta de Bonatti era considerada é impossível, dada a escuridão que se aproximava e a fadiga do esforço que os dois fizeram desde as primeiras horas do dia. O anoitecer torna impossível para Bonatti e Mahdi encontrarem as barracas.

Assim, Bonatti e Mahdi ficam sozinhos para enfrentar uma noite em um bivac a céu aberto na “zona da morte” (altitude de 8.000 metros acima do nível do mar) com temperaturas estimadas em torno de -50°C, sem barraca e saco de dormir, ou outro meio de abrigo. Somente ao amanhecer os dois podem retornar ao acampamento oito, onde chegaram pela manhã.

Ao contrário de seus colegas italianos, Mehdi não tinha recebido botas adequadas para neve de alta altitude. Ele estava usando botas normais do exército e, de acordo com alguns relatos, eram dois tamanhos menores.

Mahdi sofreu congelamento severo nas mãos e pés, e mais tarde sofre a amputação de alguns dedos. Bonatti teve sorte de sobreviver ileso à noite. O italiano ficou tão decepcionado com a atitude de seus companheiros que a partir de então preferiu as atividades de montanhismo realizadas principalmente sozinho. Quando finalmente voltou para sua aldeia em Hunza, Mehdi guardou sua piqueta e disse à família que nunca mais queria vê-lo novamente.

Compagnoni explicou que sua decisão de mudar o local do acampamento foi para evitar um serac (grande bloco de gelo fragmentado por rachaduras em uma geleira). Os seracs são perigosos para os montanhistas, pois podem quebrar ou virar sem prévio aviso.

Bonatti acusou ambos de terem deliberadamente mudado o local para tornar impossível, para ele e Mehdi, passar a noite naquela altura, de modo que não haveria como eles próprios tentarem chegar ao cume. Por muito tempo Bonatti foi acusado e difamado por parte da comunidade de montanhismo, mas a crescente quantidade de evidências em apoio à sua versão dos fatos provou sua honestidade.

Apenas 53 anos depois, em 2004, apenas após a morte de Ardito Desio, que Clube Alpino Italiano (CAI) reconheceu oficialmente que Lacedelli e Compagnoni mentiram em seu relato de ascensão e que a versão de Bonatti era verdadeira. O italiano tentou organizar uma subida solo ao K2 sem oxigênio no ano seguinte, mas não conseguiu o apoio, então mudou-se para Courmayeur, onde se tornou um guia de montanha em 1954.

Patagônia, Andes, Karakorum e outros picos

Em janeiro de 1958 Walter Bonatti segue para a Patagônia argentina, para participar de uma expedição organizada pelo ítalo-argentino Folco Doro Altan, com a intenção de chegar ao cume, ainda intocado, do Cerro Torre (3.128 m ). Como companheiro de escalada, Bonatti recruta Carlo Mauri de Lecco.

Para evitar a competição gerada pela presença inesperada e simultânea de trinta expedições, bem como a falta de verbas prometidas por diversas instituições devido às polêmicas atitudes assumidas pelos organizadores ítalo-argentinos de ambos os lados, grupo ao qual Bonatti fazia parte decide se mudar para o Hielo Continental, para atacar Cerro Torre do lado oeste.

A escalada começou a partir do lado oeste da montanha no dia 2 de fevereiro com bom tempo, mas o percurso se mostrou difícil e o equipamento de escalada (cordas e pitons) insuficiente. Muito provavelmente, a escalada em si estava acima de suas habilidades A primeira escalada indiscutível e justa do Cerro Torre seria realizada apenas em 1974, por outra expedição italiana.

Em 1958 Walter Bonatti participou da expedição à região do Karakorum dirigida por Riccardo Cassin. Junto com Mauri chegou ao cume do Gasherbrum IV (7.925 m) sem usar cilindros de oxigênio, traçando uma rota de grande dificuldade. Apesar do sucesso, a relação de Bonatti com o CAI se deteriora cada vez mais e o italiano critica o funcionamento e a legitimidade da organização, que considera burocrática e estéril.

Em 1961 mudou-se para os Andes peruanos, na cordilheira Huayhuash, onde completou a primeira ascensão ao Nevado Rondoy Norte com Andrea Oggioni, Giancarlo Frigieri e Bruno Ferrario. Bonati ao longo dos anos seguiu fazendo primeiras ascensões notáveis.

No verão de 1961, Walter Bonatti, Andrea Oggioni e Roberto Gallieni decidiram escalar o Pilar Central de Freney, um pico não escalado do maciço do Mont Blanc. Uma tempestade de neve, que durou mais de uma semana, bloqueou as duas partes a apenas 100 metros do cume do pilar.

Apenas três escaladores (Bonatti, Gallieni e Mazeaud) conseguiram retornar com segurança, os outros quatro morreram de exaustão ou acidente. O episódio ficou conhecido como “tragédia do Pilar Central de Frêney”.

Matterhorn e aposentadoria

Walter Bonatti, em fevereiro de 1965, tentou com dois companheiros, Gigi Panei e Alberto Tassotti ,escalar uma nova via na face norte do Matterhorn, mas tentativa falhou devido ao mau tempo. A equipe foi forçada a um acampamento dramático na parede por 24 horas, com rajadas de poeira congelada a 100 km/h. Se salvaram graças a um recuo ousado: 400 metros de rapel na tempestade.

De volta ao vale, seus dois amigos tiveram que partir. Bonatti considerou suas opções e partiu para uma segunda tentativa sozinho. Cinco dias depois, ele chegou ao cume, tendo completado uma escalada exigente de 1.200 metros.

A façanha Matterhorn lhe rendeu a Medalha de Ouro da Presidência da República. Foi quando aos 35 anos Bonatti se aposentou do montanhismo extremo. Bonatti trabalhou por mais de 20 anos como repórter do semanário italiano Época, viajando para lugares inóspitos. De 1965 a 1986 viajou para Alasca, Kilimanjaro, Aconcágua, Austrália, vulcão Nyiragongo, rio Amazonas, campos de gelos patagônicos no Sul da Patagônia, entre outros lugares.

É somente após a revisão final do CAI, publicado em 2008, para esclarecer o caso K2 com a validação da versão de Bonatti, que o italiano aceita participar de programas de televisão. No passado sempre se limitou a entrevistas relativas a seus negócios e viagens, sempre tomando cuidado para evitar comentários sobre os acontecimentos do K2, aos quais dedicou grandes espaços em seus livros, por considerá-los longos e complexos demais para se esgotarem no curto espaço de uma entrevista.

Walter Bonatti, de 81 anos, morreu sozinho em uma clínica particular onde a direção do hospital não permitia que sua companheira de mais de 30 anos passasse os últimos minutos de sua vida juntos, porque os dois não eram casados. Seu funeral teve lugar em Lecco em 18 de setembro de 2011, onde foi cremado e as cinzas enterradas no cemitério de Porto Venere.

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