Etiqueta e educação: Escaladores esqueceram como se comportar?

Note como muitas pessoas não tem etiqueta e educação nos locais de escalada ou locais de prática do montanhismo. Antes que pessoas que possuem raciocínio binário tirem suas conclusões simplistas a respeito de como a sociedade funciona, lembremos que educação e ética, nesses locais, tem a ver com o que muitos parecem desconhecer nos dias de hoje: o respeito.

O respeito permite que a sociedade viva em paz, numa convivência saudável, assentada em consideração, solicitude e civilidade. Isso implica em reconhecer em si, e nos demais, os direitos e as obrigações. Portanto, a falta de respeito vêm criando o que recorrentemente acontece nesses locais: violência, conflitos, desconforto e confrontos.

Acha exagero? Verifique o tipo de mentalidade, diálogo e, principalmente, filosofia propagada em grupos de WhatsApp ou Telegram e pelos “valentões” existentes neles. Por trás de toda “lacração”, existe alguém que quer esconder seu desconhecimento em etiqueta e educação.

Escaladores e montanhistas não possuem mais inteligência social?

Existem diversos tipos de inteligência: lingüística, lógico-matemática, espacial, cinestésico-corporal, musical, social, emocional, ambiental, espiritual e prática. Ao analisar o comportamento de escaladores e montanhistas com outros praticantes dessas atividades e nos locais que frequentam, a Inteligência Emocional e Inteligência Social são inexistentes nesses indivíduos.

Inteligência Social significa a capacidade de um indivíduo reagir de forma adequada nos mais variados contextos sociais, para que consiga manter relações saudáveis e frutíferas com outras pessoas (inclusive aquelas inseridas em uma cultura diferente). Possuir autoconhecimento, empatia e saber se comunicar são fundamentais para que desenvolva inteligência social.

O conhecimento das regras de etiqueta é tão importante que é confundido com a inteligência social e elas são um trunfo que diferenciam e qualificam as pessoas. Ao refletir um pouco, qualquer escalador (a) ou montanhista reconhecerá o quanto é agradável conviver com quem respeita e leva em consideração os que o rodeiam.

Sim, a boa educação de um indivíduo é um treinamento contínuo que se inicia na infância e continua por toda a sua vida, desenvolvendo a comunicação entre as pessoas, promovendo bem-estar, além de fazer aflorar virtudes que constituem a base para o bom convívio social.

Por ter os esportes de montanha serem erroneamentes batizados de “esportes radicais”, muitos que entraram no esporte acreditaram que deveriam “honrar” este adjetivo com atitudes rebeldes e niilistas. Niilismo é uma filosofia caracterizada pelo pessimismo e ceticismo extremo perante a realidade ou valores humanos.

Assim criou-se a atitude dos “valentões da escalada e montanhismo”, com comportamento de adolescência eterna, completa falta de empatia com quem inicia, com quem não conhece e, quase que essencialmente, de aversão ao que existe de diferente de seu local de origem.

Portanto, a atitude niilista de pessoas que, por algum motivo, não tiveram uma boa educação e se revoltam pelo que existe na sociedade atual (mesmo que, por algum motivo, se beneficiem de algum aspecto), acabaram por ignorar qualquer tipo de etiqueta. O que, para o niilista autointitulado escalador (a) ou montanhista, existir uma etiqueta a seguir nos locais que visita implica em ter de despir da maneira reativa, e irracional, que trata o próprio esporte.

Porque desconhece, por própria limitação intelectual mesmo, que regras de etiqueta podem e devem nos ajudar a a sermos cidadãos mais civilizados e, acima de tudo, cientes da existência e da importância do outro.

De onde vem a etiqueta social?

Acima de tudo, é importante estabelecer que etiqueta não é “frescura”. Pensar assim demonstra um nível de ignorância e debilidade intelectual gigantesca, pois cultivar hábitos que vão nos tornar mais disciplinados, discretos, afáveis, tolerantes e prudentes, dentre muitas outras virtudes que, além de favorecer uma convivência mais benigna e elevada com os nossos semelhantes, nos tornam seres melhores, mais evoluídos e mais felizes.

A questão de ter uma etiqueta social, é também uma questão moral e ética, que fala muito do valor interno dos indivíduos que a seguem (ou que a ignora) e aos aspectos externos que se revelam nas relações do indivíduo com os outros. As regras de etiqueta nada mais são do que um código ético que delineia os comportamentos sociais esperados e aceitos e que estão de acordo com as convenções e normas observadas por uma sociedade, classe social ou grupo social.

Este tipo de “tratado de convivência social” data desde o Egito antigo, quando já existia um livro didático de preceitos exaltando virtudes civis, como veracidade, autocontrole e bondade para com outras pessoas. O livro foi escrito por Ptaotepe, um vizir egípcio que viveu entre 2375 a 2350 a.C.

O filósofo chinês Confúcio tinha várias obras que tratavam da moralidade pessoal e governamental, a correção das relações sociais, a busca da justiça nas relações pessoais e a sinceridade em todas as relações pessoais. Seus textos foram escritos entre 552 a.C e 489 a.C, o que comprova que desde o início das civilizações existem regras de convívio para que o respeito interpessoal impere.

As “boas maneiras” foram objeto da filosofia grega e integravam o universo de interesse dos pensadores da Grécia Antiga. Platão, segundo os historiadores, preocupava-se, sobretudo com a atitude em relação aos mais velhos e orientava seus parentes que ensinassem seus filhos a respeitarem os idosos.

Portanto, a função básica da etiqueta social, que é possibilitar um convívio social agradável, é mantida em toda sua essência até os dias de hoje. Se se perguntar o por que de termos uma etiqueta social para a escalada e montanhismo, a resposta é simples: preservar bons hábitos e costumes pode ser relevante e possibilita que a vida em sociedade seja mais harmônica.

Etiqueta e educação na escalada e montanhismo

À medida que a escalada e o montanhismo se populariza, seu impacto ambiental piora. Individualmente, ações como andar fora da trilha, posicionar crash pads indiscriminadamente, gritar para incentivar como se tivesse em estádios de futebol, colocar música alta como se estivesse em um churrasco no quintal de casa, não enterrar as fezes (ou defecar em local frequentado), deixar lixo por onde passa (mesmo orgânico, como restos de comida) são corriqueiros.

Agora, se uma pessoa somente faz um estrago gigantesco quando tem este comportamento isolado, imagina quando isso se multiplica por 100 escaladores por dia. Como o número de praticantes de escalada e montanhismo cresce exponencialmente sem uma etiqueta social de comportamento, pode ser desastroso para o planeta e em especial nos locais de prática de escalada e montanhismo.

Não é uma questão de ser um “ecochato”, pois não existir uma etiqueta social em locais de prática de escalada e montanhismo não é uma questão somente de meio ambiente, mas sobre o respeito por outros escaladores e montanhistas. Pois estamos dividindo espaço com outras pessoas, portanto ter a etiqueta adequada é mostrar respeito mútuo por pessoas que compartilham a mesma paixão pelo esporte em questão.

Além disso, se escaladores e montanhistas não começarem a se comportar melhor (sendo educados sempre), isso causará problemas com os gestores de parques, proprietários de terras e uns com os outros.

Indiscutivelmente na escalada existem os autointitulados xerifões, que são verdadeiros “bedéis” dos locais de escalada e montanhismo. Estes mesmos “inspetores” se esquivam de sua responsabilidade quando deveriam criar sinalizações que perpetuem a etiqueta social do lugar e de evangelizar quem visitar o local pela primeira vez.

Isso porque se alguém vai falar com os outros sobre etiqueta, a pessoa deve ter também uma etiqueta decente e ser reconhecido por isso. Não significa que ela seja uma “autoridade” ou que seja “o representante do dono”, como é propagado em muitos locais de escalada e montanhismo. Na verdade, qualquer pessoa deve sair de casa para praticar a sua atividade com a vontade de ser o exemplo de etiqueta, que é a obrigação social de todos.

Assim, cada indivíduo deve se sentir na obrigação de dar o exemplo para a pessoa do lado. Repare que nos locais com maior número de incidentes, como fechamento de acesso, brigas com proprietários, lixo nas trilhas, sinalização destruída, etc, são justamente aqueles com maior número de pessoas despreocupadas em dar o exemplo em seguir regras de etiqueta.

Abaixo estão algumas regras de etiquetas sociais que montanhistas e escaladores DEVEM seguir ao visitar os locais de prática de suas atividades:

  • Cumprimento e apresentações: Quando chegar a um local, cumprimente, na medida do possível, todos os demais presentes. Diga sempre “por favor” e “obrigado (a)”.
  • Ser simpático e bem-educado: Peça licença para entrar em vias, ou passar na frente que quem estiver mais lento em uma trilha.
  • Postura: Mantenha uma postura respeitosa e adequada com os gestos, movimentos e a linguagem corporal. Não saia criticando o local, o clima e sinalização. Não saia decotando os graus das vias ou rebaixando a dificuldade de uma trilha.
  • Cumpra suas obrigações: Respeite o tempo e habilidade de quem quer que seja. Não deixe equipamentos espalhados, nem fique pedindo emprestado equipamentos a quem não conhece ou não esteja em seu grupo.
  • Cuidado com o tom de voz: Falar alto demais ou o tempo inteiro são atitudes bastante mal vistas em qualquer lugar, então fale o mínimo e em tom baixo.
  • Mantenha o respeito: O bom e velho ‘trate os outros como gostaria de ser tratado’ já resolve o problema. Portanto, NUNCA, mas NUNCA MESMO, coloque música para “dar a vibe”, ou “alegrar o ambiente”.
  • Tenha boa vontade: Ser solícito e ajudar seus colegas pode render muitos pontos para a sua imagem como montanhista e escalador.
  • Tenha bom senso ao se vestir: Roupas adequadas e próprias para a escalada e montanhismo são as melhores escolhas para o ambiente montanha. Há pessoas que usam vestimentas mais descontraídas (como micro shorts, ou ficar sem camisa), mas não se deve abusar e manter o bom senso é sempre a melhor pedida.
  • Brincadeiras devem ter limites: Palavrões e piadas obscenas podem agredir as pessoas à sua volta, e brincadeiras desse tipo devem ficar da porta de sua casa para dentro.
  • Respeite a privacidade alheia: Não invada ou force sua entrada na privacidade de pessoas que estão à sua volta. Não se intrometa na conversa alheia, ou dê palpite em algum assunto que não lhe diz respeito.
  • Cuidado ao dar apelidos aos colegas: Nem todos encaram bem esse tipo de brincadeira. Portanto, se a própria pessoa não se dá um apelido, você também não deve inventar um.

There is one comment

  1. Leonardo Pawlak Raimundo

    Mas em todo lugar há pessoas bem educadas e mal educadas.
    Achei que o texto generaliza todos os escaladores.
    E o que tem a ver o Niilismo com falta de educação? E de qual Niilismo está falando? Ativo ou passivo? Acho que usou esse termo sem ter a real noção do conceito em si. Acredito que um niilista nem se daria ao trabalho de ir escalar, já que a falta de sentido na vida o impede se se mover. Ou ainda negaria a vida para sonhar com a eternidade no paraíso, assim negaria os prazeres “terrenos”.

    Colocar Platão como exemplo de etiqueta? Usa Aristóteles então que escreveu uma Ética, faz muito mais sentido. Ele ainda criou a regra de ouro da Ética: “Nunca faça ao outro aquilo que não quer para si mesmo”.

    Eu concordo que tem gente mal educada e sem etiqueta, na escalada como em todo o lugar! Mas os conceitos filosóficos do texto não estão bem encaixados não.

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