Escalada de competição: Quais são as principais habilidades exigidas no boulder

Praticar escalada na rocha e em academia exige diversas habilidades físicas e técnicas distintas. Embora pareça o mesmo esporte, muitas vezes alguém acostumado à escalada em rocha, não possui o mesmo rendimento em uma academia e vice-versa.

Ao longo dos anos, do ponto de vista dos campeonatos, os route setters procuravam elaborar linhas que se assemelhavam muito aos movimentos da escalada em rocha. Esta busca por “aprimorar o estilo” foi para tornar mais atraente para o público leigo e para quem transmitisse o evento. E é nesse detalhe, a atratividade de transmissão, que vive a principal motivação que aborreceu escaladores e preparadores físicos que ainda aplicavam metodologias desenvolvidas nos anos 1990.

Foto: IFSC/Eddie Fowke

Quem ainda mentalmente vive nos anos 1990, quando os campeonatos de escalada começaram a se desenvolver de maneira mais profissional, ainda insiste em criticar a evolução do estilo exigido para campeonatos. Conforme anunciado aqui, em primeira mão para América Latina, os direitos de transmissão de escalada esportiva tiveram um interesse sem precedentes. EUA, Europa e Ásia já possuem contratos milionários na compra por emissoras de TV.

Qual a vantagem disso? Simples, quanto maior exposição, maior é o número de patrocínios que um atleta pode desfrutar. Exemplos na escalda não faltam. A escaladora Janja Garnbret já possui um volume de ganhos de patrocínio considerável. O mesmo ocorre com Adam Ondra que, embora tenha uma performance acima de todos na escalada em rocha, é nas competições e sua provável ida para a Olimpíadas de Tóquio que o escalador tcheco mais recebe de patrocínio.

 

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O mesmo assédio de marcas acontece com outros escaladores como Akiyo Noguchi (Japão), Shauna Coxsey (Inglaterra) e Jain Kim (Coreia do Sul). Seus patrocinadores variam desde bebidas energéticas até montadoras de carros. Para um exemplo bem claro, a imagem acima é de Shauna Coxsey recebendo uma nova van de seu patrocinador. A exposição que Coxsey tem na mídia por conta de sua performance é o que garantiu a ela este reconhecimento.

Estes ganhos são consequência da expertise de cada um desses atletas aos desafios propostos pelos route setters e da transmissão por streaming. Portanto, resumindo muito, foi o interesse da mídia, e de seus patrocinadores, que moldaram o estilo de boulder como temos hoje. Os atletas mais bem-sucedidos neste novo estilo usufruem de bons patrocínios.

Streaming

A transmissão de streaming é a “menina dos olhos” de vários esportes de nicho. O esporte mais popular do mundo, o futebol, foi dos primeiros a apostar no streaming para a “independência” das emissoras de TV. Na verdade foi uma maneira de ampliar ainda mais o leque de emissoras interessadas em transmitir. Em território brasileiro, quem apostou nas transmissões de streaming para “peitar” emissoras de TV foi o Atlético Paranaense, com transmissões próprias no Facebook.

No Brasil, a primeira modalidade que está utilizando o streaming para tonar-se mais independente e possibilitando grandes investimentos é a Novo Basquete Brasil (NBB). Reconhecida pela FIBA é a liga oficial do Campeonato Brasileiro de Basquete seu mais valioso produto. No mercado esportivo nacional é o grande case de sucesso, tirando o basquete da cova e o transformou em um negócio sustentável e atraente. Importante lembrar que neste sucesso do basquete há habilidade administrativa e adaptação à realidade brasileira.

 

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Em todo o mundo, à medida que as competições começaram a ser transmitidas por streaming e terem seus direitos comprados por emissoras de TV a cabo dedicadas exclusivamente ao esporte, algumas exigências foram feitas. Foram exigências para tornar o esporte mais interessante e entretenido para o expectador. A lógica é que mais entretenimento ao expectador, maior é a audiência e, consequentemente, mais caro os anúncios podem ser vendidos.

Para entender o que as emissoras pediram, é importante entender que no momento que uma emissora de TV compra os direitos de transmissão de um evento, ou mesmo quem decide transmitir profissionalmente por streaming, é porque existem patrocinadores interessados em exibir a marca durante os intervalos. Para quem organiza um evento seriamente, não há sentido fazer um streaming somente pelo prazer de fazer.

Um outro ponto importante de se destacar é que transmissões de streaming que não possuem patrocinadores, somente servem para gastar o dinheiro de quem organiza. A matemática é bem simples: porque gastar dinheiro em transmitir um evento sem patrocinador, se ainda não há atrativos que um potencial patrocinador se interesse. Para esportes olímpicos, embora sejam de nicho como a escalada, os recursos devem ser investidos na preparação de atletas. Atletas bem preparados começam a ganhar destaque e, pela cobertura da mídia, começa a existir a demanda de uma transmissão de streaming.

Transmitir um evento por streaming, seja qual for o esporte, sem ter um patrocinador e somente por vaidade dos dirigentes, é desperdiçar dinheiro para dar ideia a uma megalomania que acabará por falir rapidamente qualquer organizador. Para uma transmissão de streaming o patrocinador exige, no mínimo, profissionalismo e qualidade de transmissão e não oferecer isso a ele, é cometer um erro amador e infantil.

Patrocinadores

Repare no Backdrop a quantidade de patrocinadores | Foto: Eddie Fowke

Assim como são feitas as transmissões convencionais de TV, é necessário ter apelo do público, qualidade de narrador, comentarista e de toda a técnica de câmeras e edição em um streaming. Transmissões de streaming devem ser concebidas para mostrar como “trata-se bem” o dinheiro dos patrocinadores. Neste “pequeno” detalhe é que separa as transmissões “caseiras” de streaming, das que possui qualidade: respeito ao patrocinador, público e conteúdo.

O motivo que uma marca anunciar em um evento esportivo, seja de escalada ou qualquer outro esporte, é simples: exposição, divulgação e vendas. Eventos esportivos podem ser uma excelente ferramenta estratégica para as empresas. Independentes do segmento de atuação da empresa (serviço, varejo ou indústria), os eventos esportivos atingem o público-alvo em seus momentos de lazer e de descontração, tornando mais efetiva e natural a fixação da mensagem passada pelo evento.

 

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Quaisquer que sejam os eventos esportivos, principalmente se abertos à comunidade, eles geram mídia espontânea, pois são motivo de notícias relacionadas a acontecimentos no local em que acontecem. Portanto, possuir uma transmissão de streaming que ninguém vê, ou que sequer é comentada em outras mídias, ela “não existiu” ou “não aconteceu”. Ignorar as mídias é erro fatal e amador, pois os patrocinadores, a partir do “minuto um”, avaliam o esforço de patrocinar um evento, atleta ou entidade, por meio de índices de retorno.

Nestes índices estão a percepção do público em relação à marca da empresa associada ao esporte em questão, a exposição da marca em todas as mídias antes, durante e após o evento e os números de negócios gerados direta e indiretamente por meio do evento esportivo. Portanto, qualquer associação ou federação depende, e muito, de ter um bom relacionamento com as mídias, pois são elas que irão fazer a exposição prometida ao patrocinador.

Portanto, quem organiza um campeonato, deve ter interesse em divulgar em todas as mídias, não somente as mídias sociais. Associações, ou mesmo ligas independentes, que não possuem este tipo de visão sobre o negócio que é o esporte, está fadada a falir ou, na pior das hipóteses, deixar de existir e ninguém sentir falta.

Pode parecer cruel, mas quando se trata de negócio nos esportes, o amadorismo e incompetência, seja de dirigentes ou atletas, não possui vida longa.

Habilidades exigidas no boulder

 

Por tantos interesses envolvidos em uma transmissão e profissionalização de competições de escalada, inevitavelmente impactou o estilo de competições. Sobretudo no boulder, uma modalidade bastante popular. Os detratores afirmam que virou circo ou parkour, o que evidentemente é uma visão equivocada.

Tornando a modalidade mais dinâmica, priorizando mais o equilíbrio do que necessariamente a força os route setters estabeleceram um rompimento de paradigma que existia na escalada. Especificamente no boulder, os atletas tinham de ser muito fortes muito leves.

Consequentemente o biotipo dos atletas que se destacam eram de pessoas muito magras. Aqueles que não seguiam este biotipo, eventualmente faziam dietas bizarras e modificavam os seus corpos. Atualmente, observando os atletas vê-se que isso não é mais assim.

Para isso começou a ser exigido mais habilidades mentais, para decifrar os movimentos e manter a calma em momentos chave. Portanto, o que é exigido agora dos atletas é a capacidade de resolver a abordagem de uma linha pela maneira mais técnica e criativa possível.

Como medir isso? Por três fatores essenciais: R (risco) + I (intensidade) + C (complexidade). Dá-se o nome desta medida de “escala RIC”. A escala RIC ajuda as equipes a criar linhas e etapas mais equilibradas, nas quais os problemas de boulder premiam os vencedores mais completos e versáteis possíveis.

  • Risco: Não significa necessariamente o risco físico (do atleta se machucar), mas a necessidade de decisão, ou confiança, que um escalador deve assumir ao arriscar um movimento. Portanto, refere-se à insegurança que o conjunto de movimentos pode criar. Pois quando o movimento começa, não pode mais ser retrocedido, obrigando ao escalador arriscar perder a tentativa.
  • Intensidade: Refere-se à força física exigida da linha ao escalador.
  • Complexidade: A simplicidade, obviedade e complexidade de linhas de boulder e suas sequências de movimentos necessários. Neste quesito a capacidade de leitura e projeção mental dos movimentos de cada escalador é testada.

Foto: IFSC/Eddie Fowke

Entendendo a escala RIC, fica mais fácil de compreender porque às vezes algumas linhas são mais difíceis para alguns escaladores, mas para outros não.

Diferentemente da escalada em rocha, que é necessário uma força impressionante de polias de dedo, tendões de reglete e força isométrica muscular, as habilidades mais exigidas dentro da escala RIC são:

  • Risco: Dinâmicos, botes e precisão.
    • Nestes movimentos de “fator risco”, é imprescindível ter força de core. Nas competições o “fator risco” em dinâmicos são projetados para chegar em agarras grandes, mas com margem de erro nula.
    • Nestes movimentos é necessário excelente coordenação motora. Portanto, este tipo de habilidade física deve ser treinado, até mesmo acima de movimentos de força.
  • Intensidade: Negativos, tetos e agarras pequenas com movimentos largos
    • Nesses movimentos há uma correlação entre força e tensão isométrica com a presença da força física não somente nos braços, mas em todo o corpo.
    • Para a boa desenvoltura do “fator intensidade”, é necessário treinamento de força isométrica e tensão corporal.
    • Talvez seja o fator que escaladores mais fortes se sobressaiam mais que outros
  • Complexidade: Leitura de movimentos e capacidade de implementar habilidades próprias.
    • Exige consciência corporal, bom domínio de leitura de ângulos e posicionamento
    • Quando mais complexa a linha, maior volume de módulos.
    • Quando mais repertório de movimentos, melhor o treinamento para o “fator complexidade”
    • Exigência de trabalho de pés excelente e com margem de erro nula.

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