Crítica do filme “Jumbo Wild”

jumbo-wild-cartazToda história, qualquer que ela seja, possui dois lados com dois pontos de vistas distintos e, às vezes, totalmente antagônicos. Cabe ao documentarista ter a sensibilidade de mostrá-los e, caso esteja concordando com um dos lados, buscar os argumentos dos quais esteja favorável. Desde que publicitários acreditaram que filmes outdoor poderiam ser convertidos em longos anúncios de marcas e pessoas, o gênero regrediu alguns passos no aspecto que se refere à qualidade.

Exemplos da visão distorcida da realidade que profissionais de publicidade carregaram para dentro do gênero pode ser visto na baixa qualidade de histórias em festivais de filmes outdoor. Isso porque as marcas, que procuram patrocinar filmes para enaltecer seus produtos, contrataram pessoas do mercado publicitário para dirigir, e até mesmo escrever roteiros que parecem saídos da gaveta de Don Draper(personagem da série televisiva Mad Men),  produções com uma diferença abismal da realidade dos apreciadores do gênero.

A marca Patagonia já tinha bancado alguns filmes com espírito conservacionista, mas esbarrou nos erros comum das outras marcas: deixar na mão de publicitários soberbos e/ou roteiristas ativistas panfletários. Acostumada a posicionar-se diante de questões conservacionistas de maneira diferente de seus concorrentes, a marca de Yvon Chouinard não conseguia ter o mesmo comportamento quando era para produzir filmes outdoor. Assim como pessoas adultas, que aprendem e amadurecem com o tempo, a marca demonstra em “Jumbo Wild” que está aprendendo com os erros das últimas produções que patrocinou.

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O filme “Jumbo Wild” documenta a luta conservacionista de canadenses para impedir que um grande resort de ski seja construído em um paraíso ecológico as montanhas rochosas do país. O local, conhecido como Glaciar Jumbo (Jumbo Glacier) é um local descrito por vários personagens como “no meio do nada” e é frequentado por esquiadores que dormem em cabanas de montanha que servem de refúgio.

Fosse possível traçar um paralelo com alguma coisa que temos parecido no Brasil seria como o Pico Itaguaré, que somente praticantes de trekking o visitam e não há praticamente nada a seu redor. Imagine agora o local tendo um resort de europeus endinheirados que desejam aproveitar o local e apreciar a natureza com grandes janelas de vidro e lareiras alimentadas com a madeira da região.

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A produção procura colocar no centro das discussões o fato de que no Glaciar Jumbo está planejado para ser construído um resort de ski que custará “modestos” US$ 450 milhões e que é alvo de controvérsia por questões políticas, econômicas e ambientais. No meio desta discussão toda são discutidos o custo orçamentário de um local que vivem zero pessoas, criação de empregos com a construção do resort, preocupações sobre a qualidade de vida que os animais locais sofrerão e, como não poderia deixar de ser, a força e debilidade política que possui a população das redondezas em impedir empreendimentos desta natureza.

O diretor Nick Waggoner teve a habilidade de na produção colocar a opinião de todos os envolvidos, inclusive do arquiteto italiano que idealizou o projeto e o considera a sua obra de vida. O filme a partir da apresentação do problema começa, de forma mais neutra, a evidenciar que não se trata de apenas uma história de um super-rico que quer devastar um lugar e pessoas interessadas em preservar. A construção de um local como este passa por questões muito mais complexas e que envolve muitos interesses, alguns escusos outros pueris, de todas os envolvidos no debate.

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O filme “Jumbo Wild” mostra, de uma maneira mais madura que o panfletário e de pouco horizonte “DamNation“, que o progresso da civilização e a cultura narcisista de empresários ambiciosos merecem ser discutidos em níveis muito maiores que apenas na esfera do orçamento governamental. Os produtores elegantemente evidenciam a visão tosca e binária que políticos possuem a respeito de temas delicados, e que merecem um maior entendimento de cada fator do problema envolvido, do que somente números em uma planilha e criação de empregos para, novamente, voltarem a ser mais dados nesta mesma planilha. No filme também é mostrado de forma sutil, mas bem documentada, como muitos moradores locais estão lutando pelo conservadorismo do local mas por motivos egoístas e de visão provinciana. A passagem que mostra um caçador preocupado com o sumiço de potenciais troféus em sua sala poderem sumir e virem a modificar seu estilo de vida ilustra bem a complexidade de cada ativista.

Não resta dúvida de que “Jumbo Wild” é um amadurecimento na maneira de observar filmes outdoor, especialmente os produzidos com a chancela da marca Patagonia, e que a intenção de trazer a reflexão sobre temas espinhosos de conservadorismo substitui obras panfletárias e vazias como “180º South” e “DawNation“. Tirar das mãos de amadores, sobretudo de publicitários que acham que sabem fazer filmes (mas na verdade não sabem), é o primeiro passo para as produções bancadas pela marca Patagonia seguir a mesma linha de “cool” que já possui frente ao seu público.

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Ao final da produção o gosto amargo de estarmos vivendo em tempos que problemas como o que é documentado em “Jumbo Wild” é inevitável e, de maneira bem crua, nos mostra como estamos em um mundo frágil do ponto de vista de conservação de locais exuberantes como o Glaciar Jumbo. A habilidade do diretor, durante toda a produção, de fazer refletir sobre a realidade de se conservar um local o mais intocável possível ser utopia ou um objetivo a alcançar é o grande mérito do filme.

Fica a torcida de  que a marca tenha escutado os lamentos de ecologistas no Brasil diante da tragédia de Mariana (quando uma represa de lama acabou com vários ecossistemas e vida de pessoas) e a motive de produzir o mesmo pelo Brasil.

Nota Revista Blog de Escalada: 

Jumbo Wild está disponível para visualização On-Demand no Vimeo

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