Cordas molhadas perdem a resistência?

As atuais cordas de escalada são feitas de filamentos contínuos muito finos de poliamida-6, também conhecida como nylon.

Esta fibra sintética se caracteriza por suas propriedades mecânicas excelentes, como elevada resistencia à ruptura, grande elasticidade e boa recuperação elástica.

O que é menos conhecido é que sua resistência diminui ao estarem molhadas, e isso representa um risco para os escaladores, sobretudo para os alpinistas.

A perda de resistência em cordas molhadas ou congeladas foi estudado pela primeira vez no final dos anos sessenta pelo professor e alpinista espanhol José A. Odriozola, e após dois anos pela empresa Teufelberger e Pit Schubert (o presidente de segurança da DAV).

Os resultados que obtiveram foram similares aos apresentados aqui, e em particular os do professor Odriozola sobre resistência estática de cordas molhadas e congeladas tiveram uma redução em torno de 30% em comparação com as cordas secas.

Isto levou à empresa austríaca Teufelberger (a fabricante da Edelweiss) assim como Pit Shubert a investigar em que medida esta dita redução pode ocorrer em cordas molhadas com forças dinâmicas.

O resultado foi que as cordas aguentaram duas quedas quando estavam secas ( o número mínimo de quedas imposto pelas normas nesta época) mas molhadas somente aguentaram uma queda, ou nenhuma em alguns casos.

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Foto: http://soloboulder.com/

É assombroso que tal problema no havia sido estudado durante trinta anos, apesar da redução de resistência das cordas molhadas que pode ser igual ou ainda maior que a perda causada pelo desgaste.

Para saber mais sobre esta redução de resistência, Gini Signoretti realizou vários testes para a comissão de segurança do Club Alpino Italiano (CAI). Foram testadas cordas novas e usadas, normais e “dry” (com tratamento impermeável).

O propósito dos testes foi avaliar o rendimento dinâmico, utilizando para isso a máquina Dodero cordas molhadas, congeladas e secas comparando-as com uma outra de referência.

A máquina Dodero se fundamenta em testar as cordas sem perdas de resistência devido a nós, e somente se realiza um, no encordamento, e por utilizar diâmetro único sobre sobre o qual atua a corda.

Como foram efetuados os testes

Os testes foram executados em cordas de três marcas distintas A,B e C, com três amostras de cada uma, com as seguintes características:

  • Corda NOVA, 10,5 mm de diâmetro e versão normal.
  • Corda NOVA,, 10,5 mm de diâmetro e versão Every Dry.
  • Corda USADA, 10,5 mm de diâmetro e versão normal.

As seguintes amostras se mostraram conforme as normas UIAA em uma máquina Dodero:

  • Não tratadas.
  • Molhadas (por imersão em água durante ao menos 48 horas em temperatura normal).
  • Congeladas (molhadas com o aparato anterior e mantendo-as ao menos 48 horas em um congelador a -30ºC)
  • Molhada e logo secada (molhada como acima e logo secada em lugar bem ventilado e com sombra, já que é assim que se deve secar uma corda)
  • Molhada e Secada artificialmente (molhada como nos casos anteriores, logo centrifugada, secada a temperatura normal em um quarto ventilado e seca ao final com secador químico).

Realizaram alguns testes mais com cordas submetidas a um breve tempo deixado de molho, para simular as condições alpinas:

  • Imersão em água durante duas horas.
  • Molhada levemente em ducha.
  • Ainda o CAI estudo o efeito de numerosos ciclos de lavagem e secagem(sempre à sombra) como se recomenda normalmente, assim como em luz solar direta.

Depois de cada tratamento, revisaram as variações, peso e longitude de cada amostra a fim de investigar possíveis correlações com os ensaios dinâmicos.

Foto: http://soloboulder.com/

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Análise de Resultados

Cordas Molhadas

As cordas molhadas apresentou uma alarmante redução da resistência dinâmica das amostras, o número de quedas na máquina Dodero se reduz a aproximadamente a 1/3 do valor inicial.

Tal diminuição da resistência de observou em cordas novas e usadas e também nas cordas normais e com tratamento impermeabilizantes (DRY).

Aparentemente nestas cordas com tratamento impermeabilizante parece evitar  a àgua aderir à capa, mas não à alma da corda.

É interessante ressaltar que o efeito da água é também alarmante nos casos de imersão breve (2 horas) e no caso de breve salpico de água.

Este comportamento verifica o que já se sabia: a presença de água em nylon diminui em grande medida de sua temperatura vítrea (temperatura de transição vítrea do material).

A água atua como um plastificante real, já que modifica profundamente tanto a mobilidade da parte amorfa das macromoléculas como a temperatura caraterística de relaxamento mecânico do material.

Isso significa que “em muitos aspectos, ao adicionar água ao nylon é equivalente a elevar sua temperatura em grande medida”.

Em outras palavras: os testes com uma corda molhada à temperatura normal na máquina Dodero é mais ou menos o mesmo que testar uma corda seca a 70-80ºC, condições que causam uma grande perda de resistência.

Também se observou que a força de impacto na primeira queda com a corda molhada é significantemente maior (5 a 10%), como se a corda estivesse voltado mais rígida que uma seca. Isso poderia ser devido ao aumento de fricção entre as fibras, assim como o aumento de longitude da corda.

Uma corda que já é esta esticada é mais resistente e mais “rígida”.

Outro resultado inesperado: a quantidade de água retida pelas cordas novas é de 40 a 15% em comparação ao peso da corda seca, independente do tratamento de impermeabilização (talvez o tempo de molho, 48 horas, faça o tratamento ser ineficaz) .

No caso de uma corda já usada, a quantidade de água retida é muito maior, aproximadamente 60% do que é devido provavelmente à absorção da água pela grande quantidade de filamentos rompidos na superfície da corda

Cordas Congeladas

Aqui devemos fazer uma observação a respeito dos testes: é impossível manter a corda congelada durante todos os testes, devido sobretudo ao tempo necessário para montar a corda na máquina Dodero e ao tempo de espera requerido pelo procedimento padrão do teste UIAA (uma sucessão de quedas em intervalos de 5 minutos).

Isso porque a corda se aquece pelo calor gerado pela queda e temperatura ambiente.

Como consequência disso somente durante as fases iniciais de testes estavam as cordas congeladas.

Portanto, os resultados devem ser lidos de maneira crítica, tratando de extrapolar os resultados do efeito do gelo nos testes.

Apesar destas incertezas, pode-se afirmar que os testes demonstram que as cordas congeladas se comportam melhor que as molhadas, pois há uma menor redução de resistência dinâmica, em torno de 50%, incluso uma redução de 10% da força de choque na primeira queda.

Como conclusão podemos concluir que se somos capazes de manter a corda congelada durante toda o teste poderia ser inclusive melhor, talvez ate melhor que com cordas secas.

A baixa temperatura, a estrutura cristalina de uma corda molhada em particular, a mobilidade de sua parte amorfa seria a mesma que uma corda seca à temperatura normal.

Cordas Molhadas e logo secadas

Aqui devemos ressaltar uma boa notícia aos alpinistas: Depois de ser molhada e secada, as cordas parecem recuperar suas características originais.

O número de quedas chega a seus valores originais, enquanto a força de impacto se reduz um pouco, já que a corda é um puco mais curta (cerca de 4%)

Também é interessante que a volta das propriedades originais se produz inclusive depois de vários ciclos de molhado/seco, sempre e quando as cordas sejam secas em lugar fresco, bem ventilado e com sombra.

Entretanto se ficam com luz direta do sol se produz uma diminuição da resistência de acordo com os testes realizados na máquina Dodero, devido ao efeito negativo da radiação UV.

Neste caso as cordas se mantiveram sob luz solar direta durante 4 semanas, tempo suficiente para ver estes efeitos.

Cordas molhadas e secas artificialmente

Estes testes confirmam os resultados apresentados anteriormente.

A secagem completa da corda reduz seu peso de aproximadamente 3% em comparação com a amostra de referência.

Este minucioso processo de secagem conduz a uma recuperação quase completa da resistência dinâmica da corda, seja nova ou usada e normal ou com tratamento de impermeabilização.

Alem disso há uma redução da força de choque na primeira queda em torno de 10 a 12% e uma redução de longitude entre 4 e 8%.

Conclusões

A presença de água ou gelo nas cordas de escalada produz modificações importantes em sua resistência como:

A resistência dinâmica das corda, assim como o número de quedas, diminui enormemente até 30% em relação ao valor inicial quando estão molhadas, independentemente do estado ou tratamento da corda.

Depois de molhar a corda, esta se faz 4 a 5% maior, e isso pode estar relacionado com o aumento da força de impacto na primeira queda entre 5 a 10%

Os efeitos negativos da água sobre o rendimento dinâmico das cordas são notados inclusive com imersão breve, como no caso da corda molhada em ducha nas provas.

Este comportamento parece ser devido à interação da água com a estrutura cristalina das macromoléculas de nylon.

Este comportamento dura enquanto a corda está molhada, mas depois de seca em lugar fresco e bem ventilado com sombra, a corda recupera quase por completo seu comportamento dinâmico original, incluso depois de vários ciclos de molhado/seco.

Dependendo do grau de secura (normal ou exaustivo) da corda, ela pode ser ficar mais curta de 5 a 8%, o que pode estar relacionado com a diminuição entre 6 a 12% da força de impacto na primeira queda.

Inclusive em caso de cordas congeladas a resistência dinâmica diminui, mas menos que em cordas molhadas.

Concluindo, uma corda usada mas em boas condições , por exemplo uma corda que pode aguentar 4 a 5 quedas de teste UIAA realizadas em máquina Dodero, quando está seca, somente poderia aguentar uma ou duas quedas molhada depois de uma chuva repentina, como deve ocorrer na montanha.

Os montanhistas devem exigir máxima segurança em nossas cordas, incluindo quando está molhada, já que pode-se apoiar em uma aresta durante uma queda, com o que sua resistência reduz ainda mais.

Este risco é menor quando a corda está em boas condições. o problema menos crítico em um glaciar ou em uma cascata de gelo, já que as cordas estão congeladas, mas neste caso a temperatura é muito importante, ao ultrapassar o 0° a corda se descongela, ou seja, está molhada.

Agradecimentos

O autor agradece a colaboração do diretor do laboratório do departamento de construção da Universidade de Padua, onde foram realizados os testes.

Obrigado também ao professor Lorenzo Contri, coordenador dos testes; Sandro Bavaresco quem executou os teses em máquina Dodero; Gianni Bavaresco que informou as temperatudas durane a escalada em gelo.

Agradecemos também aos membros do CAI – CMT Vittorio Bedogni, Giuliano Bressan, Carlo Zanantoni, e em  particular ao  professor Luigi Costa, pelos seus valiosos conselhos e sugestões sobre este artigo.

Tradução autorizada de: http://soloboulder.com/

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