Como medimos o progresso na escalada

Heather Weidner é uma escaladora profissional que mora em Boulder, Colorado. No dia 25 de junho ela encadenou China Doll, uma via de 10º grau tradicional perto de Boulder, e se tornou uma das poucas mulheres a escalar esse grau em vias tradicionais. A ascensão levou cerca de 70 tentativas. Ocasionalmente Heather se perguntava se estava progredindo. Após uma visita, ela disse: “Eu pensava que estava progredindo em um dia, e no dia seguinte eu não conseguia fazer os movimentos”.

Todos queremos saber que estamos progredindo, que nossos esforços estão produzindo resultados tangíveis. Normalmente medimos o progresso de forma quantitativa: conseguir uma cadena, escalar um grau mais difícil ou atingir uma meta intermediária como conseguir passar de um crux. As metas intermediárias nos levam à nossa meta final da cadena.

Foto: Celin Serbo | https://heatherclimbs.com

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Podemos sentir que não estamos progredindo se não tivermos melhoras quantitativas. Às vezes não conseguimos fazer um movimento sequer de um crux. Isto pode causar frustração e perda de motivação.

Inicialmente, Heather teve dificuldade em saber se estava progredindo em “China Doll”. Ela estabeleceu metas intermediárias como passar o crux de 9c. Abaixo estão suas observações durante os quatro primeiros dias na via:

  • Dia 1:  “Eu me sinto como se nunca tivesse escalado na rocha antes. Os pés ‘sambando’, sem agarras de mão- não sei que diabos estou fazendo”.
  • Dia 2: “Eu tenho conceitos do que fazer, mas ainda não tenho uma ideia real. O crux é ridículo. Eu sou muito baixa e fraca”.
  • Dia 3: “Eu tentei escalar o crux por horas sem sucesso, no entanto eu fiz metade de um dos movimentos- progresso”.
  • Dia 4: “Grande avanço hoje. Consegui passar o crux do 9c pela primeira vez”.

Podemos ver que Heather conseguiu progresso quantitativo durante esses quatro dias. No primeiro dia ela não conseguia sequer fazer os movimentos; no quarto dia ela passou o crux do 9c. Porém, quase não houve progresso quantitativo nos três primeiros dias, apenas “metade de um dos movimentos”. O progresso quantitativo ocorreu no quarto dia: conseguir passar o crux do 9c.

Foto: Jon Glassberg | https://heatherclimbs.com

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Isto é típico para todos nós. Se nos esforçamos, eventualmente iremos produzir alguns resultados quantitativos. Heather atingiu sua meta intermediaria, no entanto ela sentiu dúvida de si e frustração até atingi-la. Todos nós já nos sentimos assim quando nosso progresso é menor do que nossas expectativas. Qual poderia ser a mudança de foco de Heather, e o resto de nós, para reduzirmos a dúvida e frustração e possamos continuar motivados mesmo quando não estivermos tendo progresso quantitativo?

Podemos mudar a forma como medimos o progresso. Em vez de apenas medi-lo com resultados finais quantitativos, podemos medi-lo com processos qualitativos. Os processos, no entanto, são mais sutis que os resultados finais. É fácil medir um resultado final, como um crux de 9c ou até mesmo conseguir realizar um movimento; não é fácil medir um processo, tal como uma movimentação eficiente, um descanso efetivo, ou pensar de forma útil. Os processos são mais sutis e requerem uma maior atenção de nossa parte, para saber se estamos progredindo.

Nós realizamos vários processos enquanto escalamos, tais como: movimentação, descanso e o pensar. A movimentação engaja o corpo, mas a forma como nós o engajamos determina a qualidade de como usamos nossa energia. Descansar é importante, mas a forma como descansamos e a qualidade das posições de descanso determinam quão efetivamente recuperaremos nossa energia. Pensar é necessário, mas a forma como pensamos determina as ações que faremos.

Os processos enfatizam como fazemos algo. Focar nossa atenção na qualidade se torna mais importante do que na quantidade. Medimos o progresso dos processos ao focar na qualidade ao realiza-los.

Uma movimentação melhor pode ser medida pela forma como engajamos o corpo. Estamos escalando lento demais, fazendo um movimento de cada vez, de maneira tensa? Ou estamos escalando continuamente, conectando os movimentos individuais para criar fluxo e ritmo, e permanecendo o mais relaxado possível? Esta última opção cria uma experiência com maior qualidade para engajar o corpo ao movimentar-se.

Um descanso melhor pode ser medido pela forma como engajamos o corpo. Estamos apertando as agarras com força demais, ficando nas pontas dos pés e respirando superficialmente? Ou estamos relaxando nossa pegada, abaixando os calcanhares e respirando mais profundamente? Esta última opção cria uma experiência com maior qualidade para recuperar energia.

Melhorar a forma como pensamos pode ser medido pela forma como pensamos. Nosso comprometimento com a ação diminui se estivermos pensando negativamente. Dissecar nosso processo de pensamento é sutil. Tendemos a pensar que devemos transformar o pensamento negativo em positivo. No entanto, o pensamento positivo tende a conflitar com a realidade por causa das expectativas que criamos. O que precisamos é de clareza: ver a situação tal como ela é. Fazemos isso com um pensamento neutro; descrevemos uma situação objetivamente, buscamos a informação real que está lá, sem colori-la de forma negativa ou positiva. O pensamento neutro nos ajuda a focar no que é possível, de acordo com nossas habilidades e com a situação real na qual queremos engajar.

Há muitos benefícios em focar na melhora dos processos. Os resultados finais ocorrem no futuro, enquanto os processos ocorrem no momento presente. Não conseguimos controlar a conquista de uma meta futura. Podemos controlar os processos que realizamos no momento presente. Estes processos nos levarão às metas futuras que queremos atingir.

Foto: Celin Serbo | https://heatherclimbs.com

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Focar nos processos nos ajuda a ficar atentos às sutilezas que precisamos mudar. Melhoramos nossa consciência em relação a como pegar em uma agarra com mais confiança, encontrar um posicionamento de pé melhor, ou perceber se estamos levemente mais fortes em um movimento. Todos estes são processos que somados nos levam às metas finais, embora sejam pequenos. No entanto, estes ganhos sutis e pequenos se somam. É importante permanecermos motivados para melhorar estes processos sutis. Se mantivermos nossa atenção na qualidade de como movemos e descansamos o corpo, e da forma como pensamos, então faremos um progresso quantitativo.

Além disso, ao focar nos processos nós aproveitamos a experiência de maneira mais completa, com menos frustração e uma motivação consistente. Não aproveitamos a realização da meta apenas; aproveitamos as dificuldades, as coisas sutis que aprendemos pelo caminho. Medimos ambos os processos qualitativos e os resultados finais quantitativos, mas é importante focar nos processos qualitativos porque é o que conseguimos controlar. Ficamos engajados (motivados) mesmo quando não tivermos progresso quantitativo. Incluir os processos para medir o progresso traz qualidade para a forma como escalamos, como lidamos com os desafios, e como vivemos nossas vidas.

Dica Prática: Processo progresso

A escalada inclui processos para descansar, pensar, tomar decisões, movimentar, cair e redirecionar nossa atenção. Cada processo inclui coisas específicas que fazemos com nossa atenção. Todos estão descritos no livro Lições Expressas que será publicado em breve no Brasil.

Duas das coisas mais importantes que fazemos na maioria destes processos são respirar e relaxar. Pratique ambas durante o seu aquecimento.

Perceba as sutilezas de sua respiração. É uma respiração que te da energia ou acalma? Ela deveria ser energética durante o esforço e calmante durante o descanso.

Perceba as sutilezas do seu relaxamento. Você está segurando com força excessiva nas agarras (over-gripping) enquanto escala ou descansa?

Lembre-se de relaxar continuamente sua pegada quando estiver realizando esforço ou descansando… Esteja sempre relaxando.

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O livro “The Rock Warrior Way – Mental Training for Climbing” está à venda traduzido para a língua portuguesa no Brasil em: http://www.companhiadaescalada.com.br/

Tradução do original em inglês: Gabriel Veloso

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