Eu estava escalando em uma academia recentemente e notei um escalador ficando muito frustrado porque ele não conseguia passar o crux de uma via.
Ele escalava até o crux usando as mesmas sequências cada vê, caia e se frustrava. Esse incidente me fez pensar em como a mente pode nos deixar cegos para realizar um treinamento mental efetivo.
Sócrates disse:
“A vida não examinada não vale a pena ser vivida”.
Para organizar nossas vidas, precisamos examinar a mente, para ter certeza que ela pode suportar examinação. A palavra “examinar” significa observar, averiguar ou investigar.
A mente tem inteligência que suporta examinação e ignorância que a impede.
Precisamos encontrar formas de usar a inteligência da mente e evitar sua ignorância. A inteligência da mente é a sua habilidade de resolver problemas.
A mente recebe nova informação e modifica seu conhecimento atual com esta nova informação. Modificar nos ajuda a ver uma perspectiva mais ampla. Vemos nosso nível atual de conhecimento e uma versão modificada dele.
A ignorância da mente é sua tendência de validar o seu conhecimento atual. Ela procura informação velha para validar sua perspectiva atual. Validar mantem nossa perspectiva restrita. Somos cegados por nosso nível atual de conhecimento e ignoramos outras alternativas.
A resolução de problemas é uma progressão para frente: temos um nível atual de conhecimento, procuramos nova informações e as mesclamos com nosso nível atual de conhecimento para resolver o problema.
Esta progressão para frente suporta a inteligência da mente que modifica. Estamos nos movendo para frente desde a zona de conforto (o conhecido) para a zona de estresse (o desconhecido), que nos move na direção do aprendizado.
A ignorância da mente tem uma progressão para trás: sabemos nosso nível atual de conhecimento, buscamos informações velhas que o sustenta, eliminamos as informações novas que não as sustentam e mantemos uma perspectiva limitada de conhecimento.
Esta progressão para trás não resolverá o problema e vai sustentar a ignorância da mente de validar. Estamos retrocedendo desde a zona de estresse (o desconhecido) para a zona de conforto (o conhecido), o que nos move para longe do aprendizado.
Se estamos em uma via desafiadora, então precisamos solucionar o problema do desafio. A resolução de problemas requer que nós modifiquemos nosso nível atual de conhecimento misturando-o à nova informação que está contida no do desafio.
Precisamos experimentar com novas sequências para modificar nosso nível atual de conhecimento. Se validamos o que fizemos no passado, fazendo a mesma sequência de movimentos uma e outra vez, então estaremos trabalhando apenas com informação velha. Vamos nos frustrar, estar cegos para novas informações e não resolveremos o problema.
O mestre Zen Takuan Doho (1573-1645) disse:
“É a própria mente que faz a mente se perder”.
Para poder utilizar a habilidade inteligente de “modificar” e evitar a sua tendência ignorante de “validar”, precisamos realizar um treinamento mental desde uma perspectiva de fora da própria mente. De outra forma, vamos nos perder em sua ignorância e ficaremos desnorteados.
Essa perspectiva de fora é chamada de observador. Nós observamos a mente pensar. A perspectiva do observador nos permite dar um passo trás da atividade de pensamento dentro da mente.
Desde a perspectiva do observador, nós vemos que temos uma mente que pensa por nós. A mente pensante não é nossa essência. Então, podemos pensar para utilizar a inteligência modificante da mente. Podemos reconhecer também quando a mente estiver nos cegando, quando estamos sendo vítimas de sua tendência a validar.
Uma das maiores limitações da mente é que, mesmo quando estamos lendo sobre a ignorância da mente, como estamos fazendo agora, nós pensamos que não ela se aplica a nós mesmos. Esta é uma medida protetora da mente. Portanto, é importante entender que somos vítimas da ignorância da mente.
Nunca terminamos de melhorar a habilidade inteligente de modificar.Portanto, a tarefa aqui é reconhecer que está acontecendo conosco, agora, e fazer algo tangível cada momento para lidar com isso. O simples mantra “modificar, não validar” pode ajudar.
Ao operar da perspectiva do observador, somos efetivos ao examinar a mente. Conseguimos observar, pesquisar e investigar seu nível atual de conhecimento e resolver os problemas que encaramos na escalada e na vida. Apenas da perspectiva do observador é que podemos realizar um treinamento mental eficiente.
Dica Pratica: Leitura Modificada
Quando lemos um livro, tendemos a “ler para concordar”. Nós buscamos informações com as quais concordamos conforme o autor expressa as idéias. Ou, “lemos para discordar”. Buscamos informações com as quais discordamos.
Temos uma abordagem de validar na leitura. O pensamento da mente é: se o autor está dizendo algo que eu concorde, é valioso; se eu discordo, não tem valor.
Em vez disso, devemos “ler para observar”. Começamos de uma perspectiva que não conhecemos. Isto nos mantem abertos para novas informações. E então, conforme lemos, percebemos informações com as quais a mente concorda ou discorda.
Desde a perspectiva do observador conseguimos examinar a tendência ignorante da mente de validar, e muda-la para o usar sua habilidade inteligente de modificar. Somente depois poderemos utilizar as idéias que o autor expressa.
O livro “The Rock Warrior Way – Mental Training for Climbing” está à venda traduzido para a língua portuguesa no Brasil em: http://www.companhiadaescalada.com.br/
Tradução do original em inglês: Gabriel Veloso
Foto no topo: https://interpretartistmama.wordpress.com
Arno Ilgner distinguiu-se como um escalador pioneiro nos anos 1970 e 80, quando as principais ascenções foram as primeiras fortes e perigosas. Essas façanhas pessoais são a base para Ilgner desenvolver o programa de treinamento físico e mental – Rock Warrior Way ®. Em 1995, após uma pesquisa aprofundada da literatura e prática de treinamento mental e as grandes tradições guerreiras, Ilgner formalizado seus métodos, fundou o Instituto Desiderata, e começou a ensinar seu programa de tempo integral. Desde então, ele tem ajudado centenas de estudantes aguçar a sua consciência, o foco de atenção, e entender seus desafios de atletismo (e de vida) dentro de uma filosofia coerente, baseada em aprendizado de tomada de risco inteligente. Ilgner considera a alegria e satisfação no esforço – a “viagem” – intimamente ligada à realização bem sucedida das metas.