Alex Honnold: Como uma pessoa saiu de morar em um furgão a ganhador do Oscar 2019

O escalador Alex Honnold, ao subir o palco da entrega do Oscar 2019 de melhor documentário por “Free Solo”, teve a dimensão exata do que é ser um rock star. No discurso de vitória, a diretora Elizabeth Chai Vasarhelyi enalteceu sua bravura e agradeceu por ser uma fonte de inspiração. Alex já era ídolo dentro da comunidade de montanhismo mundial e, mesmo assim, optava por ficar tendo uma vida discreta e sem glamour. Uma prova disso é que, Alex Honnold sempre parece estar trabalhando e treinando e raramente posta fotos em praias no estilo “atleta ostentação”.

Mas como um garoto tímido que viveu 14 anos em um furgão, transformado artesanalmente em motorhome, chegou a ser destaque na premiação do Oscar?

 

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Depois de escalar quase mil metros em estilo solo na via “Free Rider”, no El Capitan, Alex Honnold ganhou aclamação internacional. Desde o lançamento do filme, apareceu em diversos canais dando entrevistas e chegou ser capa do prestigiado jornal The New York Times com a manchete “uma das maiores façanhas atléticas de qualquer esporte”. Alex Honnold no meio disso tudo tem se tornado orador em palestras em colônia de férias, eventos comerciais, escolas e diversos tipos de instituições e reuniões corporativas.

Não faz muito tempo, desde a primeira nomeação ao Oscar, BAFTA e PGA, Honnold nunca tinha vestido um smoking, o qual foi emprestado pelo escalador Jared Leto. Leto também é escalador (não com o desempenho de alto nível Honnold, claro) e chegou a produzir uma websérie que documentou os destaques deste esporte nos EUA.

Não é nenhum exagero falar que Alex Honnold é um dos melhores escaladores em rocha do mundo e, provavelmente, o mais famoso da atualidade. Fotografias, autógrafos, matérias em meios de comunicação (que erroneamente insistem de chamá-lo de alpinista, mesmo sem nunca ter ido aos Alpes) e marcas de todos os tipos.

 

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O início humilde de Honnold

Grande parte da vida de Alex Honnold “pré fama” é contada com riqueza de detalhes no filme “Free Solo”. Mas alguns detalhes foram omitidos. Após um contato direto com o escalador norte-americano, conseguimos juntar os pontos de várias partes que ainda não eram conhecidas de Alex.

Honnold, como todo atleta de destaque, começou de maneira humilde e bastante discreta. Ele começou a escalar em uma academia aos 5 anos de idade e, segundo ele mesmo descreve, estava escalando “muitas vezes por semana” aos 10 anos de idade. Aos 14 anos, quando descobriu a escalada, começou limpando muros de escalada em uma academia para pagar sua mensalidade. Como era pouco afeito a conversar com pessoas, era uma pessoa discreta e pouco chamou a atenção de quem frequentava o lugar.

Logo que terminou o ensino médio na Mira Loma High School em 2003, Alex Honnold foi à Universidade da Califórnia (instituição de ensino superior dos EUA mantida pelo Estado da Califórnia) estudar engenharia. Mas um incidente modificou sua vida para sempre. Aos 19 anos, seu pai morre. De acordo com suas próprias palavras, a vontade de estudar acabou. Por uma sorte do destino, seu pai tinha um seguro de vida, e Honnold pode usufruir deste dinheiro.

O montante, entretanto, não foi revelado. Mas o escalador norte-americano descreveu como “o suficiente para eu viver como um dirtbag e escalar todo o tempo”. O lugar escolhido por Honnold era Indian Rock, um local de escalada na cidade de Berkeley, próximo de onde estava fazendo faculdade.

 

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Foi assim que Alex Honnold adotou a minivan de sua mãe, modificou-o artesanalmente e começou a viver aí. Quando a vida útil deste carro acabou, ele comprou uma bicicleta e uma barraca. Estas duas coisas, além dos equipamentos de escalada, foram tudo o que Honnold teve durante um bom tempo. Entre 2004 e 2009, segundo suas próprias palavras “vivia com menos de mil dólares por mês“. Em 2007, ele comprou um furgão Ford Econoline E150 2002, o que lhe deu mais mobilidade e autonomia para escalar.

Até o ano de 2006, ninguém na escalada tinha ouvido falar dele. Mas já apaixonado pelo estilo mais perigoso de escalada, o “free solo”, começou a chamar a atenção de quem estava na capital da escalada norte-americana: Yosemite. Honnold na época tinha pavor de conversar com desconhecidos e, por isso, começou a escalar sozinho e escalar em estilo solo foi uma evolução natural de sua escalada. Totalmente dedicado, em 2007, ele escalou em estilo solo a via “Astroman” (5.11c americano / 7c brasileiro) e “Rostrum” (5.11c americano / 7c brasileiro) em um dia, igualando o legendário feito de 1987 de Peter Croft. “Astroman” possui altura de 305 metros e “Rostrum” 245 metros.

A partir de então Honnold era bem conhecido na comunidade de escalada norte-americana. Um ano depois, ele solou a fenda graduada em 5.12d (9a brasileiro) “Moonlight Buttress”, de 365 metros, no parque de Zion, nos EUA. A ascensão foi relatada em 1º de abril e, por isso, durante dias, as pessoas acreditavam que a notícia era uma piada. Cinco meses depois, Honnold deu um passo sem precedentes de solar a Face Noroeste do Half Dome, de 610 metros de altura. Croft, um escalador considerado ídolo de quem pratica escalada em estilo solo, chamou essa escalada de “a mais impressionante já feita”.

Mas Alex Honnold ainda era conhecido somente da comunidade norte-americana de escalada. Seu nome tinha sido citado vagamente em alguns veículos de mídia fora de seu país. Foi aí que entra em cena a figura de Peter Mortimer. O diretor de filmes de escalada e proprietário da Sender Films aceitou o desafio de filmar a escalada de Alex Honnold no Half Dome, em um filme que até os dias de hoje garante fama a Honnold. Logo que foi lançado “Alone in the wall”, em 2012, a produção ganhou todos os prêmios que concorreu e Honnold foi lançado ao estrelato mundial no universo da escalada. O escalador ganhou também reconhecimento no mainstream, que lhe rendeu uma longa entrevista ao programa 60 Minutes, a mais antiga revista eletrônica do mundo e que discute os assuntos mais relevantes dos EUA.

Mas não somente com escalada em estilo solo fez a carreira de Alex Honnold. Nos anos posteriores dedicou-se a fazer a acensão mais rápida do El Capitan. Em novembro de 2011, Honnold e Hans Florine estabeleceram um novo recorde de ascensão na via “The Nose”, com o tempo de 2:37. A dupla voltou em junho de 2012, estabelecendo um novo recorde de 2:23:46.

Mas nem tudo é felicidade para a carreira de Honnold. No ano de 2014, a Clif Bar, empresa que produz alimentos e bebidas orgânicas, anunciou que não mais patrocinaria Honnold, juntamente com outros quatro escaladores. Todos se dedicavam a praticar escalada em estilo solo. “Concluímos que essas formas do esporte estão ultrapassando barreiras e levando o elemento de risco a um lugar onde nós, como empresa, não estamos mais dispostos a ir”, escreveu a empresa em uma carta aberta. Honnold também publicou uma carta aberta contestando a decisão da empresa e defendendo o esporte e estilo que prefere.

A história com o Oscar começou em 3 de junho de 2017, quando Alex Honnold fez a primeira escalada em estilo solo do El Capitan da história. Honnold escalou a via “Freerider”, de 915 metros, em 3 horas e 56 minutos. O feito, descrito como “um dos grandes feitos atléticos de todos os tipos, sempre” foi documentado pelo escalador e fotógrafo Jimmy Chin e pela documentarista E. Chai Vasarhelyi. As filmagens da conquista de Honnold foram transformadas no filme “Free Solo”. A parte desta história todos sabem: “Free Solo” foi o grande vencedor dos prêmios BAFTA e OSCAR de melhor documentário.

O filme foi produzido pela National Geografic, sendo exibido nos cinemas dos EUA, México e Europa. Infelizmente a produção não foi exibido nos cinemas do Brasil. No exterior, todas as sessões de “Free Solo” foram com salas lotadas, com o público exigindo novas sessões extras. Ao todo “Free Solo” arrecadou US$ 18,7 milhões, tornando-se o documentário mais bem-sucedido do ano de 2018. O filme já está à venda por streaming e em plataformas como iTunes e Amazon. O filme também será exibido na TV no próximo mês, sem sequer ter uma exibição no cinema em terras brasileiras.

Os feitos de Alex Honnold não pararam com a impressionante escalada em estilo solo do El Capitan. Junto de Tommy Caldwell em junho de 2018, se prepararam para quebrar o recorde de velocidade na via “The Nose” completando os 915 metros em 1:58:07. A dupla torou-se os primeiros escaladores a completar a via em menos de duas horas.

Honnold viveu em um furgão por 14 anos. O seu veículo de 2002 foi substituído por uma RAM ProMaster, doada por um patrocinador e totalmente equipada com o que há de mais moderno em termos de motorhome. Mas Alex Honnold mostra também sinais de cansaço da vanlife (vida de morar em um furão) e, talvez por isso, adquiriu uma casa em Las Vegas, além de ter adquirido e reformado uma cabana da família no Lago Tahoe. O lago é uma das principais atrações turísticas dos estados da Califórnia e Nevada. Após possuir relativa fama e patrocínios, criou a Honnold Fundation e em 2017 doou, de seu próprio bolso, um montante aproximado de US$ 80.000 para projetos de energia solar.

Qual o segredo?

Grande parte das entrevistas que Alex Honnold concedeu nos últimos meses, falando quase que sempre a mesma coisa, era perguntado sobre qual o segredo do sucesso? Como viver em um furgão por 14 anos e agora ser o escalador mais famoso do mundo?

A resposta é até bem simples: Alex se converteu no escalador que é hoje, em grande parte, porque se dedicou sua vida a isso. Viveu a sua paixão. Mas, para que fique entendido, é melhor entrarmos em mais detalhes nesta afirmação.

Existe uma certa pressão social para que cada um de nós siga nossa paixão. Mas, e se não sabemos qual a nossa paixão? O segredo, talvez, possui Alex Honnold que afirmou “não seja você mesmo, faça a si mesmo”. Dormir, comer, escalar, repetir. Este tem sido o caminho para Alex Honnold para chegar a ser quem é nos dias de hoje. Ou seja, a fórmula é mais ou menos assim: não temos uma paixão, por isso não a seguimos.

Entretanto a lógica de que “A única maneira de ser feliz, é seguir a sua paixão”, significa entender a vida sob um prisma simplista, o qual é necessário identificar a paixão preexistente e segui-la é, na verdade, uma estratégia ruim. Alex Honnold nunca a encarou deste jeito. Porque para Honnold, a felicidade não existe sem um prévio caminho à excelência, até o aperfeiçoamento, disciplina e dedicação.

A felicidade, para Alex Honnold, não é algo central em sua vida, nem um meio de obter algo em troca. Para ele “é ser feliz então estou bem”. Alex afirma que as coisas mais significativas, que engrandecem o espírito humano, muitas vezes estão do outro lado, em um mundo do “inútil”: dormir, comer, escalar e repetir. E neste detalhe é que existe o sacrifício. Alex Honnold decidiu escalar em estilo solo porque tinha vergonha de falar com as pessoas. Assim, a partir desta limitação, Honnold hoje em dia é um dos escaladores mais famosos e melhor pagos do mundo quase que por acidente. Não porque esta foi a sua meta, mas porque o fez com absoluta entrega.

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