Agarras de escalada: Conheça a mulher que se destaca no Brasil na profissão de ‘shaper’

No surfe, um shaper é alguém que projeta e constrói pranchas. O processo de modelagem de pranchas de surfe evoluiu ao longo dos anos, e o modelador frequentemente adapta seu trabalho para atender aos requisitos de um cliente ou de uma determinada onda.

Na escalada esportiva, desde que a modalidade tornou-se esporte olímpico e está garantida até os Jogos Olímpicos de 2028, também há um profissional responsável por modelar as agarras de escalada para serem usadas em ginásios e campeonatos do esporte. Assim os shapers são as pessoas que desafiam os escaladores e route setters a melhorar.

Por melhor que seja o route setter, se as agarras não forem bem desenhadas os escaladores não serão desafiados em sua plenitude. Pinças, abaulados, agarrões, refletes, etc: você já parou para se perguntar quem faz as agarras de escalada presas nas paredes na sua academia de escalada? Quem as idealiza é o (a) shaper.

Tudo começa com blocos de espuma que são modelados como pequenas esculturas. Porém, você já se perguntou quantas mulheres trabalham como shaper de agarras de escalada? Nos EUA e Europa existem várias, mas e na América Latina? E no Brasil?

Mulheres na escalada

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Foto: Cortesia Maína Gonçalves

Segundo o Censo de Montanhismo 2020/2021, o maior e mais completo realizado no Brasil até hoje, existe uma fatia muito pequena de mulheres no montanhismo e escalada se a compararmos com a representatividade estatística que existe na sociedade. Esse tipo de distorção impacta diretamente e indiretamente nos empregos de pessoas que trabalham prestando serviços para atividades de escalada.

Mas essa disparidade de representatividade feminina não intimidou Maína Gonçalves que, junto de seu companheiro Felippe, é hoje proprietária da Átomo Agarras, uma empresa de Joinville que desenvolve projetos de paredes para escalada indoor, bem como as agarras para paredes já existentes.

Maína Gonçalves sempre foi envolvida em esportes e construiu seu background esportivo através de 11 anos jogando handebol, 7 anos lutando e competindo em campeonatos de Muay Thai, Jiu-jitsu e MMA. A escalada é sua paixão desde 2013, quando teve seu primeiro contato com o esporte. “Foi amor à primeira vista”, afirma Maína, e desde então a escalada se tornou muito mais do que um hobby.

Desde então a jovem começou a treinar constantemente e a sonhar em cada vez mais fazer parte do esporte. Maína afirma que “nessa época, em nossa região haviam poucas mulheres escalando, o que me deixava um pouco desconfortável, pois você acaba se tornando um dos focos de grau e evolução junto dos rapazes”. “Quando passei a viajar para outros lugares com mais mulheres escalando, já me senti mais encorajada e confortável com o esporte” completou a shaper.

O início do negócio de agarras de escalada

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Foto: Cortesia Maína Gonçalves

Foi quando junto de Felippe ela montou um muro em 2016 em sua casa, em Joinville e, segundo Maína, “ficou um pouco maior do que o planejado, e assim, não teríamos condições financeiras para custear todas as agarras necessárias”, que tudo começou. Assim surgiu a necessidade de produzirem as próprias agarras.

Nas suas primeiras produções as agarras eram feitas de madeira e em 2017 resolveram experimentar outra matéria-prima: a resina. Alguns modelos foram produzidos, mas o custo dos materiais era alto (mais alto do que comprar as agarras prontas no mercado interno), foi então que pensaram na possibilidade do negócio no ramo de agarras de escalada.

Estes foram os primeiros passos da Átomo Agarras, empresa que hoje administra com Felippe. De início deram algumas agarras modeladas para amigos e conhecidos, para que pudessem experimentar as texturas e acabamentos dos primeiros modelos.

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Foto: Cortesia Maína Gonçalves

A receptividade foi positiva e assim iniciaram as vendas, o que ajudou a custear a matéria-prima. “Quando penso nas sessões de treino no muro de casa, lembro que a sensação de escalar algo que eu produzi era muito boa” declara Maína com um sorriso no rosto. Com o tempo, e após adquirir experiência no ramo de modelagem de agarras de escalada, novos modelos foram criados e aos poucos foram ampliando o leque de possibilidades buscando melhores soluções.

Felippe e Maína foram estruturando o negócio até chegar o momento em que ela resolveu sair de seu emprego e assumir apenas a empresa, que passou a se chamar Átomo Agarras. De início apenas Felippe se dedicava mais a modelar as agarras, e Maína cuidava mais da parte administrativa e ainda não atuava efetivamente de shaper.

Mas sua intuição feminina mostrou ser um bom diferencial para a empresa. Maína percebeu que um diferencial de negócio seria não ficar restrito à comunidade local, mas também tentar entender as realidades de outros locais de escalada no Brasil. Ao visitar o estado da Bahia em 2020, foram a academias de escalada e conversaram com route setters, para ter feedback sobre as principais demandas do público-alvo e do mercado interno em si.

Assim identificaram que a maior dificuldade naquele momento era a falta de Sets, ou melhor dizendo, de agarras ‘estilo família’ (vários modelos iguais, mas com pegas diferentes).

Isso porque até aquele momento o mercado nacional produzia apenas agarras avulsas ou Sets de agarras não semelhantes. Voltaram então para Joinville com um novo desafio e se jogaram de cabeça nos estudos para criar um novo modelo de fabricação. Após meses de estudo e retrabalho, em abril de 2021, divulgaram a primeira “linha família”, a qual possui 23 agarras. Maína Gonçalves batizou a nova linha de “Lua”.

Nasce uma shaper de agarras de escalada

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Foto: Cortesia Maína Gonçalves

Na época do desenvolvimento da linha “lua”, Maína começou a se dedicar a também a modelar agarras de escalada ou, como ela mesmo gosta de falar, “shapear”. Foi quando ela sentiu a necessidade desenvolver sua própria identidade de estilo e formas nas agarras de escalda e assim se descobrir shaper.

Maína buscou várias inspirações em estilos de agarras e sentiu confiante para criar o modelo de agarras que mais se identifica: Set Slab contendo 8 agarras. Ela mesma identifica o set como “regletes sem travas”. Uma das razões para ela desenvolver o modelo foi porque percebeu que não haviam muitas opções no mercado.

“Foi uma enorme gratificação para mim, principalmente por ser a primeira mulher envolvida nesse tipo de produção, perceber que conseguimos atingir mais um patamar importante dentro desse esporte praticado em sua maioria por homens” declara a shaper.

“Sem dúvida foi um marco na minha vida e me deixa extremamente feliz ver este caminho aberto para que outras mulheres façam o mesmo”, completa Maína Gonçalves.

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