A história do Neoprene – De produto industrial às roupas de esportes

O Neoprene é uma borracha sintética vulcanizada, revestida de tecido dos dois lados, que possui grande capacidade isotérmica. O Neoprene foi o primeiro material de borracha sintética a ser produzido em massa, sendo usado esportivamente inicialmente nas roupas de mergulho, devido a sua vocação isotérmica. Com o tempo o material começou a ser adotado em diversas outros esportes, como trekking, hiking, camping, pesca, escalada, etc.

O nome Neoprene, ou Neopreno, é na verdade o nome comercial de um material a base de elastômero sintético policloropreno (polímero do cloropreno) criado pela empresa norte-americana DuPont.

Neoprene

Neoprene

Falar de equipamentos de esportes outdoor sem citar pelo menos uma vez o Neoprene, é cometer o pecado da omissão. Muitos esportes, por volta da década de 1950 e 1960, começaram a usar o material que, atualmente, tem sido questionado por seu alto teor poluente após o uso. Mesmo sendo substituído gradativamente pela indústria outdoor, o material é largamente usado.

Desde isolantes térmicos, palmilhas de botas de caminhada, casacos de softshell e até mesmo estojo de equipamentos eletrônicos. Portanto, é importante ao menos saber da sua criação e em como foi obtido e incorporado pela industria e pelo esporte outdoor.

A borracha

Neoprene

O material que conhecemos como borracha natural, látex ou borracha amazônica, consiste em polímeros do composto orgânico isopreno, com pequenas impurezas de outros compostos orgânicos, além de água. A principal fonte comercial de látex de borracha natural é a seringueira da Amazônia. Muitas outras plantas produzem formas de látex ricas em polímeros de isopreno, embora nem todas produzam formas utilizáveis ​​de polímero tão facilmente quanto a seringueira.

Assim como a batata e o tomate, a borracha também é originária das Américas. O primeiro uso de borracha foi pelas culturas indígenas da Mesoamérica. As primeiras evidências arqueológicas do uso de látex natural vêm da cultura olmeca, na qual a borracha foi usada pela primeira vez para fazer bolas. Mais tarde, a borracha foi usada pelas culturas Maia e Asteca. Nessas culturas, além de fazer bolas, os Astecas usavam borracha para outros fins, como para impermeabilizar os tecidos impregnando-os com a seiva de látex.

A partir do início do século XVIII é que o material começou a ser introduzido na Europa. É historicamente aceito que a introdução das primeiras amostras de borracha de látex, na Europa, mais espeficamente na Académie Royale des Sciences, foi feito por Charles Marie de La Condamine, um cientista e explorador francês que realizou diversas viagens de exploração no Norte de África, no Médio Oriente e na América do Sul. Foi após uma viagem a Belém do Pará, no Brasil, que teve o primeiro contato com uma bola de látex. No final do século a propriedade de apagar escritos de lápis foi descoberta e o material acabou se popularizando na Europa.

Neoprene

A América do Sul, em especial o Brasil, permaneceu como a principal fonte de borracha de látex usada no mundo durante grande parte do século XIX. O comércio de borracha era fortemente controlado por interesses comerciais, mas nenhuma lei proibia expressamente a exportação de sementes ou plantas. Por causa de interesses econômicos diversos, outros lugares de exploração de borracha látex foram buscados em todo o mundo, como o Congo, Índia, Cingapura e Malásia. Muitos destes com sementes contrabandeadas do Brasil.

Já no final do século XIX, no período da segunda Revolução Industrial, Charles Goodyear desenvolveu a vulcanização em 1839, que consistia na aplicação de calor e pressão a uma composição de borracha, para dar a forma e propriedades a um produto final. Foi uma revolução para a época e que também criou uma demanda sem precedentes para a indústria do látex. O Brasil, especialmente na região Amazônica, viveu o período conhecido como ciclo da borracha que teve seu auge entre 1879 e 1912.

O substituto sintético da borracha

Neoprene

Wallace Carothers

Os seringais plantados pelos ingleses na Malásia, no Ceilão e na África tropical durante o período de crescente valorização da borracha no cenário internacional (com sementes oriundas da própria Amazônia), passaram a produzir látex com maior eficiência e produtividade. Portanto, os ingleses começaram a dominar o comércio internacional de borracha natural. Procurando não depender do comércio com os ingleses, o governo norte-americano incentivou industrias químicas a buscar novos materiais que competissem com o látex.

Durante a década de 1920, a crescente demanda por borracha natural levou o preço do produto a valores cada vez mais altos, desencadeando uma busca por uma borracha sintética equivalente. Tudo começou quando em 1927 Elmer K. Bolton, funcionário da DuPont à época, assistiu a uma palestra de Julius Arthur Nieuwland, professor de química da Universidade de Notre Dame.

A pesquisa de Nieuwland concentrou-se na química do acetileno e, durante o curso de seu trabalho, produziu divinil acetileno, uma geleia que se transformava em um composto elástico, semelhante à borracha, quando passado sobre o dicloreto de enxofre. A DuPont viu potencial no produto e comprou os direitos de patente da Universidade de Notre Dame e Wallace Carothers assumiu o desenvolvimento comercial da descoberta de Nieuwland. Em colaboração com o próprio professor Julius Nieuwland, juntamente com os químicos da DuPont Arnold Collins, Ira Williams e James Kirby, o produto foi desenvolvido no ano de 1930.

A DuPont comercializou sua recente descoberta no final de 1931, sob o nome comercial Duprene. Como o Neoprene era mais resistente à água, óleos, calor e solventes do que a borracha natural, era ideal para usos industriais, como fios telefônicos, isolamento e juntas e material de mangueira para motores de automóveis. A DuPont melhorou o processo de fabricação e o produto final ao longo da década de 1930. O processo de fabricação original deixava o produto com um odor desagradável. Mais tarde foi desenvolvido um novo processo, o qual eliminou os subprodutos causadores de odor e reduziu pela metade os custos de produção. A empresa começou a vender o material para fabricantes de produtos finais acabados.

O nome comercial Duprene foi descontinuado em 1937 para o termo genérico “Neoprene”, para deixar a entender que o material era um ingrediente e não um produto final para o consumidor. A partir disso, foi usado em bens de consumo, como luvas e solas de sapatos. A DuPont então trabalhou extensivamente para gerar demanda para seu produto, implementando uma estratégia de marketing que incluía a publicação de sua própria revista técnica, que divulgava amplamente os usos do neoprene e também anunciava os produtos à base de neoprene de outras empresas.

Neoprene

Durante a Segunda Guerra Mundial o Neoprene foi removido do mercado comercial, pois mesmo com a produção aumentando, tudo foi reivindicado pelos militares norte-americanos como política de esforço de guerra. Como a Segunda Guerra Mundial durou de 1939 a 1945, o produto sequer foi usado por indústrias e sociedade neste período.

A política norte-americana de esforço de guerra foi uma mobilização social coordenada de recursos industriais e humanos visando o suporte da força militar. O esforço de guerra norte-americano também tinha em larga escala a tarefa de abastecer a Grã-Bretanha com armas e matérias-primas, fornecer material bélico para a União Soviética (aliada na guerra contra a Alemanha) e fornecer navios, artilharia, tanques e munição a países aliados como o Brasil.

Após a Segunda Guerra Mundial, a Dupont comprou a fábrica de Neoprene de propriedade do governo, para acompanhar a crescente demanda pelo material que aparecia após o término da guerra. Praticamente inalterado desde 1950, o neoprene continuou sendo essencial na fabricação de adesivos, selantes, correias de transmissão de energia, mangueiras e tubos.

Neoprene e esportes outdoor

Neoprene

Até a década de 1950 o neoprene era usado somente nas indústrias. Tudo mudou quando um cara chamado Hugh Bradner resolveu usá-lo pela primeira vez em uma roupa de mergulho. Naquela época, várias pessoas ao redor do mundo começaram a experimentar o neoprene como indumentária isolante do frio. O físico da Universidade da Califórnia, Hugh Bradner é frequentemente considerado o inventor original e “pai do traje de mergulho moderno”.

Após a Segunda Guerra Mundial, Bradner assumiu uma posição para estudar física na Universidade da Califórnia e investigava os problemas encontrados pelos mergulhadores que ficavam na água fria por longos períodos de tempo. No ano de 1951, Bradner concluiu que uma fina camada de água podia ser tolerada entre o tecido da roupa de mergulho e a pele, desde que houvesse isolamento no tecido na forma de bolhas de ar. Um outro detalhe facilitou a pesquisa de Hugh Bradner, foi que a patente do Neoprene já tinha vencido, existindo outras empresas que fabricavam o material, o que barateou a sua pesquisa e invenção.

O ar no tecido significava que a água alcançaria rapidamente a temperatura da pele e continuaria a atuar como isolamento térmico para mantê-la assim. O traje não precisava estar seco para ser isolante. O Dr. Bradner entendeu claramente que o ar no tecido da roupa de mergulho fornecia melhor isolamento térmico.

Jack O'Neill

Jack O’Neill

Hugh Bradner frequentava a mesma região que um outro norte-americano chamado Jack O’Neill e tinha acabado de abrir uma loja de surge na garagem da casa. Na época Jack começou a experimentar diferentes materiais que o impediriam, literalmente, de congelar. Ele experimentou PVC enfiado nos trajes, mas não dava muito certo. Nos anos 1950, Jack O’Neill costumava surfar em Kelly’s Cove, no extremo norte de OceanBeach, na Califórnia (EUA). Lá, O’Neill conheceu Harry Hind e se tornaram bons amigos, surfando juntos e ocasionalmente colaborando em vários projetos.

Harry Hind foi quem apoiou financeiramente a ideia de Jack de construir uma loja de surf no porto de Santa Cruz. Pouco depois Hind, mostrou a Jack uma amostra de espuma de neoprene. Como a patente do material já tinha vencido, poderia ser encontrado a um preço bastante razoável. Hind sabia que o neoprene era um material isolante graças ao seu próprio trabalho de laboratório.

Jack O'Neill

Jack O’Neill

Depois de experimentar o neoprene e considerá-lo superior a outras espumas isolantes, poucos meses depois Jack O’Neill concebeu o primeiro colete feito com o material, ainda muito básico e diferente do que conhecemos hoje como “wetsuit”. A pequena loja fundada na garagem era nada menos que a O’Neill, a maior marca de surf do mundo da atualidade.

Paralelamente a isso, Bob e Bill Meistrell, ambos da Califórnia, também começaram a experimentar o Neoprene por volta de 1953, quando fundaram uma empresa que mais tarde seria chamada Body Glove.

No entanto, o neoprene não era o único material usado em roupas de surfe, principalmente na Europa. O Pêche-Sport Suit, de fabricação francesa, e o Siebe Gorman Swimsuit, de fabricação britânica, foram feitos de borracha de esponja. O Heinke Dolphin Suit do mesmo período, também fabricado na Inglaterra, veio em uma versão verde masculina e uma branca feminina.

Originalmente, as roupas de neoprene eram feitas com folhas de borracha-espuma que não tinham nenhum material de suporte. Esse tipo de traje exigia cautela extra ao colocá-lo, porque a espuma de borracha por si só é frágil e pegajosa contra a pele. Esticar e puxar excessivamente facilmente fez com que esses trajes fossem rasgados ao meio. Isso foi um pouco remediado, pulverizando completamente o traje e o corpo com talco para ajudar a borracha a deslizar mais facilmente, mas estava longe de ser o ideal.

Alternativas ao neoprene

Neoprene

Créditos: www.patagonia.com

Ao longo dos anos foi descobrindo-se que o Neoprene, pode causar reações alérgicas em algumas pessoas. Além disso, por ser um tecido sintético, não é biodegradável quando descartado no lixo. Ao longo do tempo, com uma maior conscientização sobre ecologia de praticantes de esportes outdoor o Neoprene começou a ganhar ares de vilão por contribuir com a poluição.

Há muitos estudos a respeito do assunto, mas um dos mais conhecidos é estudo recente intitulado “A poluição da microfibra e a Indústria de Vestuário”, realizado pela Patricia Holden, microbiologista ambiental da Universidade da Califórnia. O estudo foi encomendado pela marca norte-americana Patagonia, para entender melhor o impacto ambiental das microfibras de materiais sintéticos.

Neoprene

Créditos: www.patagonia.com

Existem algumas alternativas para o neoprene que fornecem os mesmos benefícios. Uma delas chama-se Neogreen, desenvolvido recentemente por uma empresa chamada GreenSmart. A própria Patagonia desenvolveu um neoprene feito à base de plantas. Para o desenvolvimento do novo traje a empresa fez uma parceria com a Yulex, empresa especializada em bioprocessamento e pesquisa de materiais orgânicos.

O resultado da parceria foi a produção de um traje com uma espécie de borracha feita de Hevea brasiliensis, popularmente conhecida como seringueira (amplamente conhecida no Brasil). Este novo traje de “borracha natural” é composto de 85% de borracha natural da seringueira e 15% de borracha sintética (mas sem a adição de neoprene nesta porcentagem).

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