A breve história (e explicação) da evolução dos estilos nas competição de boulders

Se compararmos a história da prática de boulder com as de escalada, seria possível afirmar que a modalidade é das mais novas. Por exigir força muscular de explosão em um curto espaço de tempo, devido à alta dificuldade das linhas propostas pelos escaladores e route setters, a modalidade é das mais apreciadas por quem inicia na escalada. Por eliminar em boa parte o fator medo de altura, o boulder cresceu rapidamente de popularidade. Não há uma estatística a respeito do número de ginásios exclusivos para a modalidade, mas especula-se que para cada três ginásios de escalada inaugurados, um é dedicado exclusivamente ao boulder.

Desde o início da profissionalização dos campeonatos de boulder, desde o início da criação da International Federation of Sport Climbing (IFSC), a FIFA da escalada, o estilo das competições foram evoluindo. Inicialmente o estilo era muito parecido com o que é praticado na escalada em rocha: posições de blocagens estáticas, movimentos curtos e, para quem não conhece o esporte, um pouco parado demais. Esta falta de ação e de emoção foram as primeiras reclamações dos espectadores leigos.

Foto: IFSC/Eddie Fowke

Como o IFSC realiza a transmissão por streaming, disponibilizada gratuitamente para todo o mundo (sem a necessidade de ninguém ser assinante de qualquer pacote premium de TV a cabo) desde 2014, foi criada a necessidade de uma releitura do que deveria ser esta dificuldade estabelecida no boulder. Partindo desde linha filosófica, as agarras de escalada passaram a ficar em segundo plano e grandes módulos começaram a serem adotados. Assim a exigência de mais mobilidade, força de core, e bom uso dos pés (além de privilegiar a resolução de problemas em vez da força bruta) passou a ser o objetivo do IFSC para tornar atrativo, além de imprevisível, a transmissão de seus eventos.

Apesar de alguns analistas, muito dos quais não aprecia este novo estilo, afirmar sem qualquer embasamento de que este estilo é “apenas uma moda”, a realidade é que este é o estilo que será apresentado para o público nas Olimpíadas de Tóquio 2020. Apesar de ser uma realidade, há nos bastidores debates entre os puristas, que querem que o esporte permaneça fiel às suas raízes, e os modernos atletas e route setters que apreciam o novo estilo. A discussão se espalhou para as academias locais, especialmente com route setters que esperam o “velho estilo” volta à moda, apesar de estar bem longe disso.

Embora o IFSC não tenha estatísticas sobre o engajamento dos espectadores, as audiências responderam bem ao novo estilo.

Estilo elitista para Europeus e Asiáticos?

Para se ter uma ideia do que pode vir a ser o futuro, é necessário também entender o mercado. Fundada na França em 1985, a fabricante de paredes Entre-Prize já construiu mais de 4.000 paredes, incluindo instalações da Copa do Mundo. Apesar de não estar presente no Brasil e América do Sul, é o fabricante dos poucos fabricantes oficiais de muros em vários países do mundo. Esta ausência é uma boa explicação de porque o nível dos atletas que treinam no continente esteja tão aquém do que poderiam chegar. Os principais atletas do continente hoje, com maiores e reais chances de chegar às Olimpíadas, são do Chile e Argentina.

O Chile, que possui uma competição de boulder que, mesmo que extraoficialmente, é a mais prestigiada da América do Sul e considerada na prática a principal prova da temporada, já possui um expertise em paredes com módulos e elaboração de linhas de boulder há mais de 12 anos. A Argentina recebeu como legado dos Jogos Olímpicos da Juventude, toda a estrutura de escalada (parede, módulos, agarras, etc). Atualmente podem realizar campeonatos nas mesmas condições que as etapas da Copa do Mundo de Escalada. Por terem investido na criação de uma geração de novos atletas, ambos os países agora colhem os frutos deste trabalho a longo prazo.

Do ponto de vista do design, o evidente objetivo é tornar a parede o mais simples possível, uma espécie de tela em branco que permita ao route setter otimizar a parede criativamente. As imagens de academias com paredes encrustadas de agarras, com uma espécie de poluição visual, tende a tornar-se obsoleta. No Brasil, assim como no exterior, a noção de delimitar as vias de escalada com agarras da mesma cor (não apenas com fitas) começou apenas recentemente. Na Argentina e Chile, além de outros países latino-americanos, esta “modernização” também começou há pouco tempo.

Um bom exemplo de que o futuro das competições de boulder estão no design dos módulos, não necessariamente nas agarras, está nas diretrizes de um campeonato de boulder. Um route setter do IFSC deve usar pelo menos 500 agarras e 30 volumes para uma competição de boulder. Já para as competições de vias guiadas são 1.000 agarras e 30 volumes. Normalmente, três ou quatro marcas são representadas, com o chefe da equipe de route setters aprovando uma lista de todos as agarras e volumes fornecidos pelo organizador.

O estilo asiático

Em um vídeo recente (que pode ser assistido no topo do artigo), o escalador tcheco Adam Ondra faz uma análise fria do que é a escalada em boulder hoje, e de como foi outrora. Ondra não foi nem um pouco saudosista, ou mesmo passional, sendo bem objetivo na sua análise. A sua conclusão é: as melhores linhas de boulders elaboradas em ginásios, estão na Ásia, mais precisamente no Japão.

Este “estilo asiático” funciona como um desafio à solução mental dos problemas, privilegiando o raciocínio em detrimento da força bruta. Segundo o próprio Ondra afirma em seu vídeo, o escalador não necessita ser muito forte, mas ter um excelente controle do corpo de forma dinâmica.

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