Crítica do filme ’14 montanhas: nada é impossível’

Se você pedir a alguém que diga o nome de algum montanhista nepalês famoso, ela poderá se lembrar de Tenzing Norgay, um dos dois montanhistas (o outro foi o neozelandês Sir Edmund Hillary) que subiu pela primeira vez para atingir o cume do Monte Everest (8.849 m) em 1953. Mas desde então os nepaleses, em sua maioria, permaneceram na sombra, enquanto montanhistas de todo o mundo marcharam em direção ao Himalaia para deixar sua marca e estabelecer novos recordes.

Vários desses montanhistas, os quais são carregados por nepaleses em situação análoga à escravidão, agradece somente usando o termo genérico ‘sherpa’, sem sequer nominá-los. Isso tudo muda com 14 montanhas: nada é impossível graças ao montanhista Nirmal Purja, com um documentário, no mínimo, impactante e de cair o queixo de leigos e entendidos, além de ser inspirador.

Procurando focar não somente na conquista, que parece ser o cacoete de todo documentarista de montanhismo, o diretor procura focar mais na jornada e do quão importante é essa conquista. Uma estratégia de roteiro que também foi usada no igualmente excelente Dawn Wall, na qual é mais relevante humanizar o protagonista do que torná-lo em mito.

Dirigido pelo cineasta Torquil Jones, 14 montanhas: nada é impossível é um documentário emocionante e revigorante sobre Nirmal Purja, também conhecido por Nimsdai (ou apenas “Nims”, como o chamam ao longo do filme). Depois de crescer em Katmandu, Purja se juntou às Forças Especiais Britânicas e passou anos treinando e trabalhando para elas.

Após um incidente que quase lhe tirou a vida, decidiu pedir baixa e voltar para casa para concentrar em seu país. Depois de passar anos aprimorando suas habilidades de montanhismo, Nirmal decide realizar algo tido como impossível e monta uma equipe para escalar todas as 14 montanhas de 8.000 metros em apenas 7 meses.

A primeira pessoa a conseguir isso foi o montanhista italiano Reinhold Messner, que levou 16 anos para fazer isso. Após ser chamado de louco e que o objetivo era impossível, Nims batizou o sonho de “Projeto Possível”, como uma forma de mostrar que tudo o que os humanos pensam ser impossível, pode ser possível com a mentalidade e o treinamento certos.

Assistir Nirmal Purja e seus companheiros nessa tentativa é surpreendente, pois apesar de uso excessivo de música heroica como pano de fundo, o que se vê em termos de montanha é muito mais perto da realidade do montanhismo de alta montanha do que relatos patéticos de sherpas lambendo os olhos de montanhistas amadores. Mais do que fabricar palestrantes que vendem sonhos abstratos, o documentário estabelece um legado extremamente importante e icônico para o Nepal e da forma mais deslumbrante.

Purja, agora com 38 anos, e sua equipe de sherpas nepaleses filmaram as imagens impressionantes, incluindo fotos de drones, enquanto conquistavam cada local. Lembrando que sua missão começou no Nepal, continuou até o Paquistão e o Tibete e incluiu escalar picos famosos e traiçoeiros como K2 e Annapurna.

O diretor combinou com as tomadas da equipe de Purja com clipes de arquivo de escaladas anteriores de alta montanha, pedaços de animação de extrema qualidade e entrevistas recentes com outros montanhistas profissionais. Entre eles: Jimmy Chin (também produtor executivo aqui e co-diretor de Free Solo), Reinhold Messner e o montanhista Don Bowie. Conversas com o irmão, a irmã e a esposa de Purja, bem como muitas filmagens ​​de Purja com sua mãe, a qual é doente e profundamente devotada, também são efetivamente combinados com as filmagens.

Em termos de montanhismo, o que Purja consegue é uma conquista absolutamente extraordinária na história do esporte, sendo que é ainda mais impressionante que tudo foi capturado pela câmera com cinematografias de montanha de qualidade pouco vistas em produções independentes. Há momentos que são de cair o queixo e estabelecem um novo padrão em termos de produção de filmes de montanha, junto com a realização de escalar todas as 14 montanhas em menos de 7 meses.

Há na produção o debate sobre o uso de oxigênio: os montanhistas devem confiar em tanques de oxigênio que transportam consigo para a “Zona da Morte” ou o peso adicionado e a possível dependência excessiva do ar portátil superam os benefícios?

Apesar de toda a ação, o filme é um pouco leve em termos de conflito e tensão. Talvez porque já sabemos de antemão que Purja não apenas sobreviveu, mas também fez história. O filme é mais sobre sucesso do que processo e, além disso, há tanto território geográfico para cobrir em 100 minutos que os picos e suas ascendências podem parecer um tanto fugazes e intercambiáveis.

A ambição de Purja não se limita à escalada. “Trata-se de inspirar a raça humana”, diz ele sobre o projeto. Os obstáculos que ele enfrenta não são apenas os óbvios físicos e geográficos. Eles também são financeiros, familiares e diplomáticos.

Mas honestamente falando, esta é a segunda conquista mais importante no montanhismo no Nepal depois do cume do Everest original de Tenzing Norgay, e o documentário é completamente correto em compará-los e conectá-los. Purja poderia morrer a qualquer momento (e como apresentado no filme quase morreu), mas continuou e ainda ajudou outros escaladores à beira da morte.

Obviamente, Purja é o herói de 14 montanhas: nada é impossível. Mas, no entanto, ele não é a estrela. Essas seriam as vistas surpreendentes que o documentário tem a oferecer. “Olhe para aquela vista”, um colega montanhista diz no topo do Annapurna. Essas palavras se aplicam a todo o filme. Se Deus tem filmes caseiros, muitos “14 montanhas: nada é impossível” devem ser parecidos com cenas tiradas deles.

O filme 14 montanhas: nada é impossível estabelece de forma irrefutável o legado épico de Nirmal Purja e de seus colegas escaladores, ao mostrar ao mundo que os nepaleses, nascidos no Himalaia, merecem ser tão conhecidos e reverenciados quanto qualquer outro

Nota Revista Blog de Escalada:

O filme ’14 montanhas: nada é impossível’ está disponível na Netflix

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