Livro da semana: “My Keys to Route Setting” – Jacky Godoffe

A importância de um route setter para a evolução da escalada de competição, assim como revelação de escaladores em rocha, pode ser comparável aos dos técnicos de futebol. Estes dois profissionais, cada um em seu esporte, são quem determinam uma evolução, ou involução, da maneira que os atletas se comportam.

Os técnicos de futebol do Brasil, todos sabem, ficaram parados no tempo, com pensamento “resultadista” (com objetivos pragmáticos) e um discutível saudosismo de um “estilo brasileiro” de praticar o esporte. O resultado disso pode ser visto nos resultados pífios em campeonatos, torneios e amistosos não somente da seleção brasileira, mas também de tradicionais clubes.

Estes profissionais do futebol, que deveriam estar buscando estar cada vez mais atualizados, foram contaminados pela visão míope de grande parte da imprensa esportiva brasileira, que possui uma sensação injustificada de superioridade ilusória. Ainda perde-se tempo discutindo o passado, quando, no momento, deveríamos estar discutindo como chegar ao futuro.

Pois na América do Sul, sobretudo no Brasil, a escalada de competição parece querer espelhar-se nos mesmos erros do esporte mais popular do continente.

A Revista Blog de Escalada teve o privilégio, e a honra, de ser o único veículo outdoor sul-americano a ir cobrir os Jogos Olímpicos da Juventude, realizados em setembro do ano passado em Buenos Aires, e também conversar com os técnicos de todas as delegações envolvidas.

Na competição haviam duas atletas sul-americanas: Valentina Aguado e Alejandra Contreras. Os técnicos de ambas, além dos organizadores e voluntários, concordaram em um ponto: o estilo dos muros e das vias para as competições, estão muito diferentes do que praticamos na América do Sul.

Algumas mensagens deixadas, tanto nos vídeos realizados quanto em mensagens ao site, durante a cobertura sobre as competições internacionais, que fizemos no decorrer do ano passado, algumas externaram uma estranheza com relação à aparência dos muros (poucas agarras e muitos módulos, privilegiando a estratégia e nem tando a força bruta) e a filosofia das vias.

Muitos afirmaram que parecia se tratar de outro esporte. Na verdade esta percepção acontece por que na América do Sul ainda estamos pensando as vias (assim como os treinamentos) de campeonatos como há 15 anos. Da mesma maneira que os técnicos de futebol não se alinharam com as tendências do esporte praticado no mundo, na América do Sul este equívoco se repetiu também na escalada de competição.

Para exemplificar este tipo de desinteresse, há no continente pouquíssimos route setters certificados pelo IFSC.

Fazendo uma rápida pesquisa entre os principais ginásios de escalada no Brasil, poucos sabiam da existência de uma literatura que servisse de base, para um maior estudo sobre como ser route setter.

Entretanto, existe sim uma fonte de grande qualidade e que é considerado um verdadeiro tratado sobre o assunto: “My Keys to Route Setting“. A obra de Jacky Godoffe aborda os principais temas sobre como pensar as vias de route setter, a partir de sua visão.

Godoffe é um dos mais importantes route setters do IFSC, sendo grande fonte de inspiração para suas linhas, que estão sempre presentes nas principais competições do mundo, os boulders que escalou por décadas em Fontainebleau. Jacky Godoffe é o chefe de route setters de boulder no IFSC.

Lendo o livro “My Keys to Route Setting“, uma coisa que transparece ao longo de cada página, é que Jacky adora a configuração de vias e se diverte fazendo isso. A todo tempo diz que não se deve ter medo de arriscar algo novo, mas sem confundir escalada com circo.

Portanto, trampolins, paredes móveis, agarras babadas e outras excentricidades que apenas servem para irritar competidores e técnicos, estão fora de cogitação. Este tipo de recurso apenas reflete um pensamento pobre de um route setter.

A obra, entretanto, traz mais reflexões do que respostas propriamente ditas, mas é o que é bonito sobre a definição de vias é que não há uma verdade absoluta. Há diretrizes, obviamente, mas principalmente ideias para discutir e experimentar para tornar a escalada cada vez mais interessante.

No livro, o conceito de desafiar corpo e mente do escalador, mas não o preparo físico, é bem consolidado. “My Keys to Route Setting” não é um livro grande, tendo somente 256 páginas, mas é uma fonte de conhecimento imprescindível no criado mudo não somente de route setters, mas de técnicos, atletas e, principalmente, proprietários de academias e muros de escalada.

Ficha Técnica

  • Título: My Keys to Route Setting
  • Autor: Jacky Godoffe
  • Edição:
  • Ano: 2017
  • Número de páginas: 256
  • Editora: Editoria própria do autor

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