Como fazer prevenção de morte súbita em escaladores e montanhistas

Como todos já devem ter escutado falar alguma vez, já acontece frequentemente casos de jogadores de futebol que faleceram em plena partida, no próprio estádio, gravado com cenas ao vivo com audiência considerável. Este tipo de incidente ganha as primeiras páginas de jornais e da mídia tradicional, mas ninguém consegue explicar como um atleta de alto nível pode morrer do coração e, mais ainda, realizando o esporte que parece ser apaixonado.

Não faz muito tempo, a escalada uniu-se à lista negra de falecimentos de pessoas em plena juventude e com “excelente” estado de saúde. Como pode ser que um indivíduo, que realiza exercícios e pratica esportes de maneira contínua, possa ter um problema cardíaco “ocultos” que pode o levar à morte. Ainda mais se pensarmos que foi exatamente seu coração que o levou a ser o atleta que é.

Eu, como cardiologista, decidi então falar sobre este tema que, diga-se a verdade, é muito pouco frequente este tipo de situação. Mesmo assim é muito lembrada pela comunidade, que mesmo sendo em uma porcentagem mínima, poderiam ter sido evitadas em exames muito simples e de baixo custo.

O primeiro que deve saber é desmistificar alguns conceitos errados, que aparecem nestas situações e que nos levam a provocar e difundir mais paranoia a respeito do assunto. Esta paranoia não resolve de maneira objetiva e elucidadora o problema. Para isso existem algumas perguntas frequentes para que isso não aconteça.

Pode o esporte “gerar” um problema cardíaco?

CLARO QUE NÃO… O esporte não cria problemas cardíacos, e não existe nenhuma evidência médica que demonstre o contrário, mas… O esporte pode desmascarar uma anomalia cardíaca que já havia anteriormente.

Um exemplo claro é a miocardiopatia hipertrófica (não se esqueçam deste termo, pois é o inimigo principal e fácil de diagnosticar, mas somente com exames).

Este tipo de problema somente sofre os atletas de elite?

Afirmação falsa. As estatísticas de disfunção em morte súbita em atletas, são precisamente em número de pessoas que praticam de maneira amadora.

A definição de atleta de “elite” está nas conquistas em competições, não pelo seu treinamento.

Quantos de nós já treinaram tanto quanto escaladores de alto grau (acima de 11º brasileiro). Portanto, estamos falando de indivíduos que treinam de maneira sistêmica, sem importar com suas conquistas.

Basta uma avaliação médica para descartar alguma enfermidade cardíaca?

Afirmação FALSA. Um médico não diagnostica uma miocardiopatia hipertrófica somente com exame físico.

No caso de mortes súbitas, 90% dos que morreram tinham uma condição médica que os considerava sãos e somente 3% foi encontrada alguma enfermidade.

Portanto, um exame médico sem existir análise de imagens, não somente é inócuo, como também é um perigo, pois pode dar como são um atleta com uma anomalia.

É paranoico pensar que um atleta pode morrer da noite para o dia?

As estatísticas sempre são estatísticas quando tem a ver com você ou com sua família e amigos. Mas as mortes súbitas, que são raríssimas, passam a ser 100% se acontece contigo. O problema é que a pesquisa é fácil e rápida com exames.

Desde este ponto de vista é o que qualquer um deve fazer se vai praticar algum esporte, ou entrar em programa de treinamento (intensivo ou nã0). A pessoa deve fazer exames que realmente pode afirmar que está 100% sã.

Como todos já devem ter escutado alguma vez na vida, na medicina nada é 100% efetivo, mas fica próximo de valores de confiança. Especialmente em se tratando de miocardiopatia hipertrófica, que é a grande causa de morte súbita, mas não a única.

Por fim, para ser bem pragmático, o que todos deveriam fazer e desejar tanto para si, como para quem irá treinar é: uma avaliação médica, na qual o médico peça dois exames cardíacos: Eletrocardiograma e Ecocardiografia.

Eletrocardiograma: Este exame irá apontar alguma desordem elétrica cardíaca que possa levar à morte súbita. Por outro lado, na grande maioria dos casos, uma miocardiopatia hipertrófica gera eletrocardiogramas anômalos. Nem sempre se diagnostica por este meio, pois um eletrocardiograma normal se afasta muito do que esta pessoa possa padecer de uma miocardiopatia hipertrófica. Por isso que na Europa usa-se muito o Screening (exame de indivíduos portadores de uma doença ou infecção mas não exibe sintomas para a identificação antecipada de doenças) na população praticante de esportes. Em alguns países europeus, que adotaram esta postura, baixaram a incidência de morte súbita em até 89% (sim, significa 89% menos mortes súbitas).

Ecocardiografia: Este é o exame para descartar miocardiopatia hipertrófica e outras anomalias cardíacas, que não são detectadas no eletrocardiograma. Existe um caso no Chile de um escalador que estava treinando para um 7b francês (8b brasileiro) que teve detectado um aneurisma de aorta (alargamento da aorta, fazendo com que as paredes do vaso sanguíneo fiquem mais finas e frágeis e estourem), que ao primeiro sinal teria resultado em morte (Na hipótese de uma ruptura 98% morrem antes de chegar ao hospital). Depois de dois meses do exame de ecografia, foi operado e sua aorta substituída. Até o dia de hoje, seguia vivo e, claro, escalando.

Lembrando novamente que a morte súbita é quase inexistente em termos estatísticos, mas mesmo assim quando acontece é uma tragédia enorme. Quando acontece naturalmente é lembrada.

Muitos dos casos de morte súbita poderiam ter sido evitados. Portanto, se você leitor não fizer exames do coração, saiba que é sua responsabilidade fazê-lo. Pois garantirá sua vida e de seus alunos e amigos.

Tradução autorizada: http://rocanbolt.com

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