Crítica do filme “Paratodos”

filme-paratodos-6Clichê é uma ideia que se repete com tanta frequência que, inevitavelmente, torna-se previsível dentro de um determinado contexto e, por isso, acaba caindo no “lugar-comum” tornando-se um “chavão”. Quando o assunto é abordar o dia-a-dia de atletas paraolímpicos a abordagem de “superação”, “inclusão” e outros parecem dominar grande parte das redações de jornais e revistas, aparentemente povoadas por profissionais preguiçosos e sem imaginação.

A mesma letargia imaginativa acontece com diretores de comerciais publicitários que acreditam serem capazes de realizar um filme ou documentário. Estes diretores são excelentes para vender em propagandas de um minuto, mas quando é necessário ser maior a duração, recorrem a recursos redundantes e vazios. Reside nos detalhes de um bom documentário a preocupação de não adotar excessivamente chichês e, se possível, também buscar entrar dentro da psiquê dos personagens e até mesmo dissecar a temática a qual é o assunto do filme.

O filme “Paratodos” é o cristalino exemplo de que a linguagem publicitária não é eficiente para a realização de documentários, especialmente com um assunto que exige maturidade na abordagem e humanização de personagens. A produção, dirigida por Marcelo Mesquita, documenta oito atletas de destaque da equipe paraolímpica e sua preparação para os jogos de 2016 no Rio de Janeiro. Inegavelmente há boa intensão de mostrar atletas de alto nível em modalidades não tão populares para o publico comum.

Porém o desejo de mostrar tudo, e filtrar o que não se encaixava nos clichês, fez com que a produção tomasse o formato de uma peça publicitária de quase duas horas de duração. Marcelo Mesquita mostra cada personagem de maneira rasa, além de abusar de tomadas em estilo publicitário (que muito lembravam as artificiais reportagens de canais de esporte a cabo), fazendo o filme padecer do mal de querer mostrar tudo, mas conseguindo não mostrar nada.

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Dividido em quatro partes, com transição mal editadas (deixando explícito a intenção para espaços publicitários) o filme aborda os principais atletas de atletismo, canoagem, futebol de cinco e natação. Logo no início os atletas do atletismo são mostrados como estrelas temperamentais e que sofreram problemas particulares no espaço de um ano. Porém estes problemas são jogados na história por meio de manchetes jornalísticas e sequer são abordados pelos próprios personagens. Não é abordado em nenhum momento detalhes de como são as regras de equipamentos e diferenças particulares entre o esporte adaptado e a modalidade olímpica. A renúncia de detalhes persiste quando sequer há uma breve explicação sobre a origem da deficiência física de cada um dos personagens.

Quando “Paratodos” segue para a canoagem, o erro de não demonstrar detalhes do esporte persiste mas há a preocupação de abordar a origem da deficiência de cada um. Porém há uma constrangedora preferência a um personagem que já tinha participado de um reality show, o que não se repete em nenhum momento em toda a exibição do filme. Esta preferência também mostrou um maior aprofundamento da personalidade e dos personagens que o cercava e, ironicamente, é quando o filme ganha em profundidade e qualidade. A rivalidade mostrada entre os competidores, somada à personalidade de cada competidor, evidencia que a competitividade de alto nível exige nervos de aço e maturidade de quem faz parte do ambiente.

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Ao abordar o futebol de cinco, modalidade esportiva paraolímpica, não são abordados novamente as regras específicas e quem eram cada competidor. O diretor Marcelo Mesquita parece exigir que houvesse um estudo prévio do expectador para decorar o nome de cada integrante. A completa ausência de legendas explicativas nesta parte do filme deixa o expectador a ver navios além de, inevitavelmente, constatar uma barriga de vários minutos. A esta altura fica nítido a falta de compromisso em mostrar de maneira profunda os esportistas, além de insistir na pesada aposta de apenas centrar-se nos clichês de sempre. Frases feitas, expressões batidas, chuva de chavões começam a aparecer e escurecer a intenção do filme, atribuindo a tudo um indisfarçável ar de superficialidade.

Para finalizar os atletas de natação foram os que tiveram a abordagem mais madura e, felizmente, longe dos clichês abordados ao longo de toda a produção. Mas os vícios de filmes publicitários permanecem nítidos em cada tomada em um indisfarçável desejo de fazer a platéia se emocionar parece forçado. Mas mesmo com este detalhe é indiscutivelmente a que mais procurou construir personagens tridimensionais. Há reflexões de cada um deles sobre a vida, os desafios e como encaram as dificuldades que vão aparecendo e como seus familiares e amigos reagem a isso.

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Com uma chuva de tomadas publicitárias “Paratodos” termina sem conclusão nenhuma e termina da mesma maneira que começou: mostrando tudo e nada ao mesmo tempo. Ao término fica tão nítido que o filme é, substancialmente, uma propaganda do esporte paraolímpico que chega a ser frustante pois a vontade de mostrar os clichês foi muito maior do que documentar o lado humano de cada atleta que, como toda pessoa, tem medos, desejos, frustrações e sonhos. Fosse possível fazer uma metáfora para representar a produção a melhor seria uma linda e límpida lagoa, mas que quando adentramos percebemos que possui, no máximo, 10 cm de profundidade e o seu fundo azulejado.

Nota Revista Blog de Escalada: 

O filme Paratodos está disponível no Netflix

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