Crítica do filme “Mirror Wall”

Para quem assiste constantemente filmes hollywoodianos deve ter notado que alguns protagonistas, que fazem sucesso com algum título, frequentemente parecem interpretam o mesmo papel ao longo do tempo. Exemplos não faltam: Clint Eastwood como velho rabugento, Tom Cruise com seus heróis de ação, Eddie Murphy com seus múltiplos personagens escatológicos, etc. Este tipo de repetição de padrão, para agradar o público e garantir uma boa audiência, também se repete em filmes outdoor.

Por este tipo de escolha dos produtores alguns títulos parecem repetir e recontar a mesma história, com protagonistas e estilos de filmagens que parecem não amadurecer com o tempo. Os filmes iniciais de Chris Sharma da sequência “Dosage”, junto de seu “Rampage”, produzidos pela já extinta BigUp Productions são um exemplo cristalino desta repetição à exaustão da mesma fórmula sem modificações sensíveis ao longo do tempo. O público, claro, acaba cansado de estar sempre vendo mais do mesmo. As telenovelas, sobretudo as brasileiras, possuem este comportamento com temáticas repetitivas e sem evolução de roteiro.

O escalador britânico Leo Houlding foi protagonista de produções como “The Wildest Dream”, “The Last Great Climb” e “The Asgard Project” na qual ele vai a lugares inóspitos conquistar uma via. Apesar de serem filmes de qualidade, parecem em vários momentos contar a mesma história. A fórmula de apresentar filmes outdoor com protagonistas sem vida pessoal e que não sentem medo, vivendo na estrada uma espécie de “vida simples” e cheia de liberdade já está desgastada. Atualmente quanto mais humanidade e vida particular, em um documentário sobre algum esporte outdoor, mais agrada ao público que seguramente assiste toneladas de material disponibilizado em canais de internet no Youtube e Vimeo.

Ciente deste tipo de necessidade de amadurecimento da fórmula de seus filmes Leo Houlding,  junto da Coldhouse Collective, procurou reinventar-se em sua mais nova produção: “Mirror Wall”. O filme documenta a jornada do escalador britânico, junto de outros dois companheiros, para conquistar uma via de escalada na Groenlândia. Como ele mesmo descreve logo no início não é a mais alta, nem a mais difícil, nem mesmo a mais inóspita, das escaladas mas é muito mais uma vontade pessoal que, diferentemente da mídia tradicional cultua, vêm desde os tempos que se dedicava a campeonatos de escalada.

Com uma pegada muito mais intimista, menos espetacularesca, sem muitas imagens de impacto para arrancar adjetivos superlativos da platéia, “Mirror Wall” mostra um Leo Houlding mais adulto, mais tridimensional em sua personalidade e, surpreendentemente, deixando no ar um tom de despedida das telas. Com várias reflexões a respeito da vida, do lugar e, principalmente, sobre seu papel como pai de família o protagonista aponta para uma tendência dos documentários de aventura que é mostrar as pessoas como humanos, e menos como super-heróis.

Usando intensamente gráficos animados, recurso o qual parece ainda não terem sido descobertos por grande parte das produções do gênero, “Mirror Wall” é bastante instrucional e educativo, sem ser pedante nem repetitivo. Mas há, sem dúvida, ainda uma carga pesada de linguagem de peças publicitárias. Algumas tomadas parecem propagandas descaradas e colocadas ali propositalmente, sem ao menos fazer parte da história, para alongar a produção por alguns minutos. O uso de câmera lenta excessivo começa a dispersar a atenção do expectador por volta da metade da produção e, durante alguns momentos, parece que o diretor ter se inspirado em videoclips da quase extinta MTV.

Mesmo com várias derrapadas no caminho, sobretudo no ritmo da história, “Mirror Wall” é uma produção que merece ser assistida com carinho por quem pretende realizar algo do gênero. No filme está claro que quanto mais pessoal se tornam o diálogo e reflexões, mais o conteúdo do filme tende a ganhar em profundidade.

Fica nítido também que o culto da vida perfeita (o qual não existe, diga-se), escalador sem medo, aventureiro livre, e outras bobagens repetidas por revistas outdoor impressas, faz parte de uma filosofia de vida de um mundo que nem existe mais. O filme, portanto, serve de documento da transição de prioridades e ambições que o esporte, e a população mundial como um todo, passa no momento.

Nota Revista Blog de Escalada: 

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