Crítica do filme “Haywire”

waywire-poster-1Quanto mais habilidoso um escalador se torna, mais ambicioso tornam-se seus projetos no esporte, e mais conflitantes tornam-se suas prioridades na vida. À medida que vai superando projetos ousados, outros mais desafiadores são criados para que cada vez mais saia de sua zona de conforto e, consequentemente, de sua segurança.

Nesta procura por desafios que levem o limite do esporte a níveis nunca atingidos, expedições a lugares remotos do mundo são realizadas e, consequentemente, acabam por também modificar o psicológico de cada integrante dela. A realidade de estar tão fora da zona de conforto, aliado ao somatório de todas as experiências vividas, há um desconhecido impacto na vida de cada um dos integrantes. Positivamente ou negativamente.

Expedições também são assuntos corriqueiros em filmes outdoor e, por ser um assunto tão interessante e inesgotável, é talvez o mais recorrente dentre o subgênero. Mostrar seres humanos no limite de suas forças em locais remotos, e pouco visitados, rende boa audiência além desperta a curiosidade do público. Por este motivo que constantemente grandes marcas de equipamentos de esportes de natureza constantemente bancam projetos ousados quando aparecem.

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Os escaladores Cheyne Lempe e David Allfrey, ambos figurinhas carimbadas de Yosemite, se propuseram um desafio: abrir uma via nas paredes da Ilha Baffin (maior ilha do Canada e a 5.ª maior do mundo) onde, segundo ele próprio declara, estão a maior quantidade de paredes virgens do mundo. Localizada no norte do Canada, o local está sempre com um clima bastante hostil, com temperaturas na faixa de 0ºF (ou seja -32ºC). Estas paredes virgens traz as mesmas dificuldades que em qualquer lugar do mundo: pedras soltas e dificuldade de acesso.

Lempe e Allfrey não se intimidaram, e foram até o local para consolidar seus nomes na elite da escalada mundial. Procuram filmar tudo nos mínimos detalhes, para ser um documentário épico e que fizessem plateias aplaudirem de pé. A partir desta ideia o filme “Haywire” foi sendo realizado, e tudo transcorria conforme o planejamento da dupla.

Todo documentário (lembrando que todo filme outdoor pertence ao gênero) possui uma característica que muitos ignoram: é sabido como começa, porém poucos tem ideia de como irá terminar. O jornalista Nelson Rodrigues chamava acontecimentos inesperado no esporte de “Sobrenatural de Almeida”, e este elemento está muito presente em filmes outdoor.

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Durante as filmagens de “Haywire” a dupla tem um contratempo, o que faz com que o filme termine com um gosto amargo na boca do expectador. Grande parte das motivações, aspirações e ambições de todo praticante do esporte é colocada em xeque somente com algumas frases de Cheyne Lempes, com sua voz narrando em primeira pessoa e carregada de sofrimento e angústia.

A produção então chega a um nível de dramaticidade pouco visto em filmes outdoor e, assim, neste aspecto diferenciando-se amplamente de outras que apenas enaltecem a qualidade técnica dos integrantes de uma expedição. O filme força o expectador, a cada palavra da descrição da angústia do narrador, a se colocar no lugar dos integrantes.

Mesmo em um ritmo aparentemente lento, mas sempre marcado com uma trilha sonora discreta mas constante, “Haywire” é o que pode-se dizer de evolução natural dos filmes de expedições. Com atenção voltada para a psiquê dos integrantes, descrição real das dificuldades e com questionamentos verdadeiros de cada um dos personagens.

Não há em nenhum momento, pelo menos aparentemente, desejo de imitar personagens de filmes de ação com gritos e grunhidos, que cada vez é mais comuns em filmes do gênero outdoor. Há, de fato, a preocupação de ser o mais fiel possível a uma escalada em um lugar bastante remoto, com muito pouca pirotecnia tecnológica e trilha sonora edificante para construir heróis e ídolos à base de imagens.

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Haywire” termina deixando o público com um silêncio ensurdecedor e que convida qualquer um que o assista a refletir sobre a vida e o que fazemos dela. Não seria exagero prever que espectadores mais sensíveis ficarão de olhos marejados a partir do final da exibição. Cheyne Lempe, que dirigiu e editou todo o filme criou não somente um excelente filme, como também mostrou um amadurecimento do gênero que, assim como Meru de Jimmy Chin, criou uma linha mais realista e menos fantasiosa.

Nota Revista Blog de Escalada:  

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