Crítica do filme “Fittest on Earth: A Decade of Fitness”

Uma das “magias” que acontece com todo praticante de qualquer esporte, não importa a modalidade, é quando em um dado momento ele percebe o quanto evoluiu e que tudo o que consegue fazer neste momento não muito tempo atrás lhe parecia impossível. Este tipo de aprendizado é o que difere o praticante ocasional, que muitas vezes abandona o esporte com o tempo, da pessoa que adota a prática até mesmo como parte de sua vida.

No Crossfit, por ser uma modalidade que trabalha com tantas habilidades físicas e técnicas, é recorrente testemunhar nas timelines, de qualquer rede social, postagens de superações de indivíduos de todo o tipo.

Esta mesma evolução pode ser percebida nos documentários produzidos pela própria administradora do esporte. O lançamento do recente “Fittest on Earth: A Decade of Fitness” é um exemplo de que a cada nova produção há uma nítida evolução, além de uma perceptível capacidade de aprender com os próprios erros. O filme, sob direção de Heber Cannon, Mariah Moore, Marston Sawyers e Ian Wittenber é uma evolução de todas as anteriores (“Fittest on Earth” e “Froning – The Fittest Man in History“) realizadas para documentar o esporte.

O filme documenta os bastidores e declarações de Matt Fraser, Sara Sigmunsdóttir, Tia-Claire Toomey, Katrin Davidsdottir, Josh Bridges, Brent Fikowski, entre outros, os quais são atletas da elite do esporte. Todos participaram dos Crossfit Games 2016, uma espécie de campeonato mundial que acontece todos os anos durante o período do verão nos EUA. Durante os cinco dias dos Crossfit Games, a evolução, superação e dores dos atletas foi documentada à medida que seus resultados apareciam e a agenda de provas progredia.

Alguns erros que acontecerem no antecessor “Fittest on Earth“, como não detalhar a sequência de cada dia de provas, foi corrigido neste “A Decade of Fitness”, permitindo assim que qualquer pessoa leiga entenda o que esteja acontecendo e, portanto, consiga compreender melhor a linha do tempo da competição. Desta maneira o público alcançado pela produção pode ser maior e o filme seja interessante e funcione como uma espécie de propaganda da modalidade.

A produção também ganhou visivelmente mais qualidade técnica com os diretores procurando fazer um paralelo entre os resultados de 2015 e o impacto que estes tiveram na vida de cada atleta. Desta maneria a empatia com cada um deles é mais rápida e permite que o expectador sinta-se parte tanto dos competidores e dos staff da organização. Durante algumas cenas é possível até mesmo sentir a mesma fadiga que os personagens.

Há neste “A Decade of Fitness” a introdução de flashbacks recorrentes do período de preparação para os games, com muitos detalhes da vida pessoal de cada um dos principais atletas. Recurso este que ajudou com que o filme tivesse mais fluidez e não aparecesse nenhuma “barriga”. Tanto a retrospectiva de 2015 quanto os flashbacks da consequência do evento habilmente ajudam a criar a atmosfera de tensão que, o início do evento Crossfit Games propriamente dito necessitava para prender a atenção de quem assiste.

Há de elogiar também o uso comedido de cenas em câmera lenta, que nas produções anteriores soava como cafona pelo uso excessivo e recorrente. Não houve, entretanto, foco demasiado nas dores dos atletas, mas sim na personalidade de cada um e em suas vidas particulares, o que demonstra a preocupação dos diretores em criar personagens e não somente heróis como nas produções anteriores sobre o esporte.

Há alguns vícios recorrentes de todas as produções de Crossfit, o que parece em certa altura uma questão mais cultural do que propriamente técnica. Nitidamente querem insistir até que funcione como, por exemplo,  priorizarem em demasia personagens que não agregam nada à história como Josh Bridges e “esquecendo” outros que mereciam mais destaque, mas aparecem praticamente em tomadas esporádicas, como Brent Fikowski (que foi o estreante destaque do evento) e Ben Smith (que subiu ao pódio e passou despercebido durante o filme).

Diferentemente do anterior, que focou insistentemente no desgaste físico, “A Decade of Fitness” procura mostrar o lado humano mas, em muitos momentos, acabam por perder histórias que seriam interessantes como o desmaio de atletas na edição de 2015 e sua superação em 2016, a estréia nos Crossfit Games após várias eliminações, atletas veteranos com rendimento surpreendente, etc.

Apesar de interessantes, os flashbacks não seguem nenhum padrão de tratamento de imagem sendo ora tom sépia (para dar a impressão de algo passado), ora sem nenhuma diferenciação. Mesmo as declarações de quem está por trás da organização parecem deslocadas com relação à história e, em algumas partes, repetitiva com as mesmas frases de efeito que poderiam ser evitadas.

A partir do momento que os jogos iniciam, na metade do filme, alguns flashbacks quebram a tensão e estendem a expetativa ajudando na fluidez, porém em outros atrapalham o andamento da história e o desenrolar do roteiro, dando forte sensação que são apenas colocados para “esticar” o enredo. Alguns dramas são supervalorizados, mostrado mais de uma vez, e outros, com maior potencial, desprezados.

O filme “Fittest on Earth: A Decade of Fitness” é uma visível evolução na maneira de apresentar o esporte e documentar atletas e os próprios Crossfit games e, diferentemente de muitas outras produções esportivas, merece elogios pela inclusão de mulheres na direção.

A diversidade acrescentou qualidade na maneira de produzir o filme e, visivelmente, aprimorou a qualidade técnica que, assim como o próprio esporte tem como mote, deve ser constante e preocupado com as disciplinas técnicas e não com o gênero das pessoas. Sem dúvida a produção mostra um amadurecimento considerável em qualidade de roteiro e personagens, apesar de ainda derrapar em antigos vícios.

Da mesma maneira que um atleta deseja chegar a fazer parte da elite do esporte, tendo vários desafios e superações pelo caminho, os produtores de documentários de Crossfit também têm. Mas pelo que foi mostrado em “Fittest on Earth: A Decade of Fitness” estão determinados e estão no caminho certo.

Nota Revista Blog de Escalada: 

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