Uma das composições mais populares de Gilberto Gil, “A Novidade”, conta a história de uma sereia que aparece em uma determinada praia.
Após todos se maravilharem com ela, aconteceu uma triste constatação: uns queriam a sereia para admirar, fazer poesias e estudar, enquanto outras queriam matá-la para comer já que havia fome no lugar.
Esta metáfora que se encaixa perfeitamente em vários problemas que temos em todo o mundo: maravilhas e confortos de civilização que por algum motivo destruiu algo da natureza.
No meio desta busca, que às vezes parece um cachorro correndo atrás do próprio rabo, estão os ecologistas e suas causas que às vezes parecem mais filosóficas do que reais.
O filme “Damnation” toca exatamente neste ponto sensível da ecologia mundial: decisões que governantes e população tomou no passado, e impactaram a natureza duramente em uma época que não existia consciência ecológica, devem ou não ser “arrumadas”?
A produção documenta a temática (e sua consequência problemática) das grandes represas e hidrelétricas nos EUA que por várias situações impedem que a vida ecológica de um rio tenha oi seu curso natural.
Algumas destas represas já não tem utilidade, e são elefantes brancos mantidos pelo governo, muito parecido com o que os brasileiros convivem com os estádios da copa do mundo de 2014.
O filme mostra ainda partes da história do ativismo ecologista em atos de protestos como pintar rachaduras nas paredes das represas, e toda a disputa política e econômica que há para que seja tomada a decisão de “libertar” os rios.
Logo ao início de “DamNation” são despejadas muitas informações jornalísticas e de impacto, muito semelhante ao filme Cidadão Kane, para que o espectador se identifique com a causa.
Nestas primeiras imagens são mostradas as verdadeiras monstruosidades que governos fazem em nome do progresso no início do século 20, como represar o vale de Yosemite e que acabou em acidente.
O próprio Brasil viveu situação semelhante com a transamazônica nos anos 70.
Durante a exibição há uma leve preocupação de mostrar o outro lado da moeda, como as pessoas (entenda por pessoas toda um região de um estado) que vivem da água ali armazenada, das subidas do salmão até o muro da represa para pesca e etc.
São mostradas ainda represas que deixaram de funcionar ou são desnecessárias obras de governo.
O filme, entretanto, apenas aponta para o problema a ser combatido, não propondo soluções nem alternativas.
Um forte equívoco do roteiro, que se preocupou em demasia apenas em denunciar, e em quase nada convida a refletir.
Os produtores também deixaram de lado questões que raramente são levantadas em filmes de ativismo ecológico, que é saber se estamos preparados para viver sem alguns confortos da sociedade que são providos exatamente pela exploração de alguns elementos que querem eliminar, como as hidrelétricas.
Inegavelmente a captação de imagens de “DamNation” reside o ponto forte do filme demonstrando um cuidado de fotografia louvável e que seguramente impressionou quem assistiu em telas de cinema (onde devem ser exibidos filmes outdoor).
A produção, entretanto, peca em um pequeno detalhe: não induz ao expectador a refletir sobre o tema, pois tenta a todo tempo conduzir o raciocínio maniqueísta desde o início do filme.
DamNation é um filme interessante, mas por adotar uma linha de pensamento de que uma represa, ou hidroelétrica, é ruim por completo chega perto dos mesmos radicalismos que o mundo vivenciou na década de 30 e culminou em uma guerra.
A produção deve ser assistida com atenção, mas é recomendavel também fazer o que os roteiristas deixaram de lado: refletir sobre alternativas ao uso da represas.
Nota Blog de Escalada
Formado em Engenharia Civil e Ciências da Computação, começou a escalar em 2001 e escalou no Brasil, Áustria, EUA, Espanha, Argentina e Chile. Já viajou de mochilão pelo Brasil, EUA, Áustria, República Tcheca, República Eslovaca, Hungria, Eslovênia, Itália, Argentina, Chile, Espanha, Uruguai, Paraguai, Holanda, Alemanha, México e Canadá. Realizou o Caminho de Santiago, percorrendo seus 777 km em 28 dias. Em 2018 foi o único latino-americano a cobrir a estreia da escalada nos Jogos Olímpicos da Juventude e tornou-se o primeiro cronista esportivo sobre escalada do Jornal esportivo Lance! e Rádio Poliesportiva.