Compromisso com o treinamento – Você é coerente com seus objetivos?

Começo o artigo com uma frase de Wolfgang Güllich (um dos maiores escaladores de todos os tempos): “O mais difícil de treinar, é começar”.

Güllich tinha razão.

Uma vez que está decidido treinar, o grande obstáculo a superar são as tentações de abandonar (Weinberg y Gould, 1996).

Sempre existem muitas desculpas.

Foto: http://www.sloclimbing.com/

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Outro dia tive vontade de correr e por sorte fazia uma tarde esplêndida. Dava muita vontade, pois era prazeroso sair à rua. Não como outro dia do mês passado que voltei para casa encharcada pela chuva. Mas este dia não, fazia sol e tempo bom às 18:30 da tarde. E, claro, acredito que foi o dia do ano que encontrei com mais corredores, caminhantes, ciclistas…

Na academia de escalada acontece a mesma coisa: quando começa o tempo bom, é quando mais pessoas começam a se animar. Todo mundo estabelece seu compromisso: “Agora que vou começar a treinar e escalar “a sério”, vou frequentar 2 a 3 dias na academia de escalada, sair nos finais de semana… Agora sim! Porque está fazendo tempo bom”.

E o mesmo ocorre no início da temporada, ou na volta das férias de verão, ou sem janeiro, quando qualquer academia de escalada lota. Mas isso não dura muito…

Voltamos a ficar sozinhos outra vez quando começa a fazer calor demais ou frio em demasia. Ou seja, aqui em Toledo (Cidade no centro da Espanha) na maioria dos dias (vou admitir que eu prefiro treinar com mais qualidade, hehehe).

Mas este tipo de comportamento nos leva à seguinte reflexão: há pessoas que nunca faltam a um treinamento, e estão treinando sistematicamente mesmo que haja festa, chuva, neve, calor, preguiça, problemas pessoais, cansaço, etc. Por outro lado existem outros que somente treinam quando todos os fatores externos estão a favor, ou quando não tem preguiça. Não são constantes.

O que faz com que aos escaladores se comporte de maneira tão diferente?

Seria pela sua personalidade, sua motivação e educação que a fazem enfrentar seus objetivos? As pessoas que persistem na busca de seus objetivos o fazem porque: Possuem confiança em conseguir seus objetivos. São perseverantes em seu comportamento e confiam em seguir batalhando a cada dia para melhorar. Sabem que treinar é a chave de conseguir seus objetivos, pois possuem um alto nível de comprometimento.

Compromisso e rendimento

Foto: http://eva-lopez.blogspot.com

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Há alguma relação entre o foco e o nível de compromisso de um escalador com o aumento do rendimento, a realização dos objetivos esportivos, ou melhor ainda, com o feito de chegar à excelência esportiva?

Evidentemente que sim.

Se algo caracteriza os esportistas de alto nível, é seu desejo de chegar a ser excelentes, os melhores no seu esporte. Sua aceitação do sacrifício e a entrega é manifestado abertamente, e possuem uma ética do esforço e do trabalho que traduz em uma maior motivação e perseverança na realização dos objetivos propostos. Chegar ao topo, e manter-se, é fruto de milhares e milhares de horas de trabalho, de um processo de otimização consciente e de um deliberado desejo de melhorar. É este sentimento de auto-confiança e que permite que os esportistas de alto nível suportem e tolerem as diferentes vicissitudes de seu esporte e a vida diária. (Ruiz Pérez, L.M. e Sánchez Bañuelos, F., 1997).

Como disse Goleman (1996): “… a prática efetiva resultará quando concorram fatores como o entusiasmo mantido e a tenacidade diante de todo o tipo de contratempo”.

Portanto é assim que se resume ser um esportista de alto nível, ou querer chegar a ser um atleta que alcança o primeiro lugar: uma grande motivação e confiança em conseguir. A continuidade de tudo, com um grande compromisso de investir tempo e uma grande quantidade de esforço por horas e horas de treinamento.

Na maioria dos casos, ao menos por agora  supõe que o resto de horas do dia que dedicamos normalmente dedicamos o trabalho e às atividades de primeira necessidade (como comer, dormir, etc…) se tem de dedicar ao treinamento e concentrar-se em levar um modo de vida favorável aos desejos esportistas.

Os especialistas falam da regra dos 10 anos (Simon e Chase, 1973), ou das 1.000 horas de prática deliberada (Ericsson e al., 1993) para conseguir a maestria em uma disciplina. As atividades de prática constantes, segundo Ericsson e al. (1993) são formas de treinamento que não são intrinsecamente motivantes e que requerem altos níveis de esforço e atenção, além de que não rendem recompensas sociais, ou financeiras, imediatas.

A este preço não estão dispostas muitas pessoas…

Mas a maioria das pessoas que treina com certa assiduidade, mesmo sem chegar a um nível de excelência, também conseguem certo hábito e compromisso.

Mas como estas pessoas conseguem? Como podemos conseguir?

Foto: https://robpizem.wordpress.com

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Uma vez que tenhamos claros os objetivos que queremos conseguir (de saúde, lúdicos, sociais, de rendimento…) valorizaremos que investimentos serão necessários enquanto os recursos biológicos (esforço e capacidades físicas e psicológicas), temporais e econômicas.

Uma vez tendo claro tudo isso, obviamente, teremos que avaliar se contamos com estes recursos e motivação, para estabelecermos, ou não, o compromisso de dedicar esse tempo, dinheiro e esforço em lutar para conseguir, ou não, o que queremos.

Uma vez realizado todo este processo, “somente” nos resta persistir e persistir… ou ajustar todo o processo.

Mas tudo bem… Como realizar esta valorização?

  • Estabeleça objetivos realistas e, mais importante ainda, se comprometa desde o início o suficiente para consegui-lo
  • Normalmente comece a pensar que está investindo esforço e tempo suficiente para lutar para conseguir seus objetivos
  • Pare e comece a pensar se alguma vez está assumindo objetivos irreais e por sonhos que sabe que nunca vai acontecer
  • Quantas horas e dias dedica a concentrar em tarefas realizadas para chegar a sua meta
  • Pergunte-se se é coerente com os objetivos que possui

Por exemplo

Não é realista aspirar a encadenar uma via que supõe um grau alto para você e seu estilo, sem nunca ter provado esta dificuldade, ou ainda experimentando esporadicamente somente 2 a 3 finais de semana ao ano. Se escala na maioria dos dias em dificuldade muito abaixo de seu máximo sem “treinar” a capacidade para encarar a dificuldade e enfrentar seus medos e limites.

Por isso terá que revisar se realmente está motivado, sendo capaz de confrontar-se para algo tão duro, fisicamente e psicologicamente. Caso contrário saberá que não está suficientemente comprometido e disposto a encarar e é melhor que deixe de enganar-se. Aproveita e treina para o que realmente te motiva.

Foto: Ryler Snyder

Foto: Ryler Snyder

Se quer treinar muito, e com qualidade, e somente dispõe de uma hora durante dois dias da semana, ou que possui muitos filhos, trabalha todos os dias até tarde, ou que gosta de sair com seus amigos dois dias da semana… Será impossível.

Priorize o que é mais importante: sua família, amigos ou o seu treinamento. Após isso determine a cada um o seu tempo após determinar suas aspirações e objetivos.

Se decidir realizar um plano de fortalecimento para recuperar-se de uma lesão grave, porque te disseram que este é o melhor método para se curar e para não lesionar novamente, e não o segue por tempo suficiente…

Terá de ter clara a ideia de que se o deixar não irá se recuperar bem, e talvez irá lesionar-se novamente. Isso acontecerá porque seu compromisso não foi adequado.

Se você quer se dedicar a competições e tem ambição de chegar ao pódio, ou até mesmo encadenar uma via de um grau muito alto para sua capacidade, masa apenas dedica 2 dias para escalar, ou treinar, mas quando aparece um contratempo abandona a rotina diária de treinamento… Será muito difícil que consiga.

Para para pensar no que é que te motiva de verdade e atue nesta base. Lembre-se da regra dos 10 anos.

Causas do abandono

Além de uma estabelecimento de objetivos ruim, baixo nível de compromisso, equilíbrio de recursos que necessitamos (como tempo, esforço e capacidade) e os disponíveis, outra causa de abandono, ou falha, é a baixa auto-confiança.

Existem pessoas que a orientação motivacional é evitar o fracasso, por isso preferem abandonar antes de envolver-se em uma possível falha na busca de suas metas. Paradoxalmente preferem deixar voluntariamente, deixando acontecer o fracasso que tanto temiam (uma profecia auto-cumprida) do que expor-se a não conseguir.

Sem perceber o que conseguem é esforçar uma ou outra vez a autoconfiança em geral para alcançar as metas, portanto uma baixa, ou curta, persistência.

Resumo

Alguns pensamentos importantes que podemos extrair deste artigo são:

1 – Que a persistência e o compromisso são pontos chave para conseguir o que queremos

2 – Que se os objetivos são irreais e o compromisso não é adequado porque a meta não é suficientemente prioritária a nós é igualmente inteligente abandonar.

Se os recursos que dispomos não são suficientes, é inteligente também mudar esse objetivo por outro que se ajuste mais à nossas circunstâncias. Isso porque como diz Carver e Scheier (2007) “na vida é tão importante continuar tentando as coisas uma e outra vez como abandonar e aceitar que não podemos mais o que não somos capazes de conseguir. Porque a capacidade de tomar estas decisões oportunamente também representa um tipo de competência.”

Tenha uma coisa clara: Conseguir as coisas requer muito tempo, esforço e até dinheiro… Seja coerente com seus objetivos, ajuste o seu nível de compromisso e sempre permaneça motivado.

Referências

Carver, C.S, y Scheier, M.F. (2007): Engagement, Disengagement, Coping and Catastrophe. In: Handbook of Competence and Motivation. Edited by Elliot, A.J. y Dweck, C.S. Guilford Press. New York.

Ericsson, K.A., Krampe, R.T. and Tesch-Römer, C. (1993): The role of deliberate practice in the acquisition of expert performance. Psychological Review 100, 363-406.

Goleman, D. (1996): Inteligencia Emocional. Kairós. Barcelona.

Ruiz Pérez, L.M. y Sánchez Bañuelos, F. (1997): Rendimiento Deportivo. Claves para la optimización de los aprendizajes. Gymnos. Madrid.

Simon, H.A. and Chase, W.G. (1973): Skill in chess. American Scientist 61, 394-403.

Tradução autorizada de: http://eva-lopez.blogspot.com.es

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