Nas últimas duas lições investigamos como melhorar nossa escalada ao aplicar um conceito do livro Synectics, de William JJ Gordon. Nós vimos como tornar estranho algo que nos é familiar, para estimular nossa criatividade. Primeiro, tornamos o familiar estranho ao brincar com as palavras “empurrar” e “puxar”, invertendo o que fazíamos com nossos braços e pernas.
Em segundo lugar, tornamos o familiar estranho ao alterar a lei da gravidade; imaginando escalar em um estado sem peso. A ausência de peso criou novos problemas que tivemos que resolver. Devíamos manter o equilíbrio e um contato firme com a rocha para não ‘flutuar’ para longe dela. Jogar com as palavras e alterar a lei da gravidade nos ajudou a experimentar com novas formas de escalada que desafiaram nosso status quo e nos permitiram melhorar.
Uma terceira forma de tornar o familiar estranho é através da analogia. Gordon sugere que identifiquemos o problema e a analogia que queremos usar.
- Problema: Gastamos energia e atenção porque não separamos a parada e a movimentação; nós as misturamos.
- Analogia: Parar como uma montanha ou mover-se como água.
Estimulamos nossa criatividade ao oscilar entre usar a analogia para pensar diferente e nos aspectos do problema em si.
Uma escalada eficiente requer fazer ciclos entre recuperar a energia ou aplica-la. O uso eficiente da nossa atenção requer fazer ciclos entre comprometer nossa atenção com o descanso ou com a movimentação. Usamos a analogia para imaginar como parar como uma montanha ou fluir como a água nos informa sobre nosso uso de energia e atenção durante a escalada.
Primeiro, imaginamos o que as montanhas fazem: elas não se movem; elas ficam completamente paradas. O problema na escalada é que tendemos a não ficarmos parados nos pontos de descanso e, portanto, nunca descansamos totalmente. A solução criativa é, então, parar completamente, não se mover, ficar parada.
A seguir, imaginamos a analogia da montanha de novo para pensar sobre o uso eficiente de nossa atenção. A gravidade puxa as montanhas para baixo. O problema com um descanso eficiente é que não comprometemos nossa atenção totalmente com descansar. A mente fica ansiosa se perguntando se deveríamos começar a nos mover; começamos a apertar as agarras com mais força do que é preciso, ficamos nas pontas dos pés e saindo dos pontos de descanso. A solução criativa, portanto, é comprometer nossa atenção às atividades somáticas do corpo que permitem que ele descanse. Respiramos profunda e continuamente; relaxamos nossos músculos, relaxando nossa pegada nas mãos e abaixando nossos calcanhares; mantemos uma postura adequada para que a gravidade nos puxe para baixo e fazer com que nossas pernas sustentem nosso peso.
Agora, imagine o que a água faz: ela flui; ela se move com fluidez. O problema na escalada é que tende a fazer movimentos individuais, um de cada vez. A solução criativa é, então, escalar de tal forma que crie fluidez. Podemos escalar continuamente para não realizar movimentos individuais. Em vez disso, conectamos os movimentos em uma movimentação fluida.
A seguir, imaginamos a analogia da água novamente para levar em conta o uso eficiente de nossa atenção. A gravidade puxa a água para baixo, fazendo com que ela flua ao redor de obstáculos conforme vai achando o caminho de menor resistência. O problema da movimentação é que não compromete nossa atenção totalmente a ela. A mente fica ansiosa, começa a lutar contra a gravidade, fazendo com que percamos nossa fluidez e paremos. A escalada, porém, vai contra a gravidade. Como podemos aprender com a água, que flui a favor dela? Comprometemos nossa atenção com as atividades somáticas do corpo que permitam que ele possa fluir para cima, pelo caminho de menor resistência. Respiramos continuamente para processar a escalada estressante; nos movemos continuamente para manter o ritmo; relaxamos e mantemos uma postura apropriada para estarmos alinhados com a gravidade nos puxando, para que nos mesclemos a ela, em vez de lutar contra.
A analogia da montanha nos ajuda imaginar como é estar totalmente presente para a ação de parar. Não há ansiedade na montanha; ela está simplesmente imóvel e descansando. Devemos imitar a montanha quando paramos para descansar. Estamos parados e comprometemos nossa atenção com as atividades somáticas do corpo para descansar. A analogia da água nos ajuda a imaginar como é estar totalmente presente para a movimentação. Não há ansiedade na água, ela simplesmente flui. Devemos imitar a água quando nos movemos. O fazemos continuamente, comprometendo nossa atenção com as atividades somáticas para a movimentação.
Tendemos a permanecer com o que nos é familiar, e isso asfixia o aprendizado e a criatividade. Nós pisamos fora do que nos é familiar tornando-o estranho. Fazer isso questiona e desafia nosso status quo e nos permite ser criativos, aprender e melhorar.
Dica prática: O uso eficiente de energia e atenção
O uso eficiente da nossa energia realiza ciclos entre parar para recuperar energia e mover para aplicar a energia. O uso eficiente da nossa atenção faz ciclos entre comprometê-la com descansar ou mover-se. Comprometa sua atenção totalmente a parar para recuperar a energia ou mover-se para aplicá-la. Não misture.
- Parando: Quando parar, pare. Seja imóvel como uma montanha. Foque sua atenção nas atividades somáticas do corpo para relaxar sua pegada, abaixar os calcanhares, esticar um braço e sacudir o outro.
- Movimentando: Quando for escalar, escale. Flua como a água. Foque sua atenção nas atividades somáticas para mover-se continuamente, respirar continuamente e permanecer o mais relaxado possível.
O livro “The Rock Warrior Way – Mental Training for Climbing” está à venda traduzido para a língua portuguesa no Brasil em: http://www.companhiadaescalada.com.br/
Tradução do original em inglês: Gabriel Veloso
Arno Ilgner distinguiu-se como um escalador pioneiro nos anos 1970 e 80, quando as principais ascenções foram as primeiras fortes e perigosas. Essas façanhas pessoais são a base para Ilgner desenvolver o programa de treinamento físico e mental – Rock Warrior Way ®. Em 1995, após uma pesquisa aprofundada da literatura e prática de treinamento mental e as grandes tradições guerreiras, Ilgner formalizado seus métodos, fundou o Instituto Desiderata, e começou a ensinar seu programa de tempo integral. Desde então, ele tem ajudado centenas de estudantes aguçar a sua consciência, o foco de atenção, e entender seus desafios de atletismo (e de vida) dentro de uma filosofia coerente, baseada em aprendizado de tomada de risco inteligente. Ilgner considera a alegria e satisfação no esforço – a “viagem” – intimamente ligada à realização bem sucedida das metas.